A ligação das áreas do conhecimento cultura e educação vem se apurando há mais de 35 anos em nossa cidade. Desde o início dos anos 1990 até 2012, na estrutura administrativa do município, estiveram na mesma pasta, o que reforçou sua reciprocidade e interação ao longo dos anos.
Com uma espiada na história, identificamos o primeiro equipamento oficial de gestão e fruição cultural na cidade, a Casa da Cultura ‘Nair Mendes Moreira’, que nasceu em 1991 com nome de educadora e a ligação histórica com a Casa do Registro da Coroa Portuguesa, datada de 1716. A criação do Parque Gentil Diniz, com a reforma do casarão e a preservação de traços coloniais, também aconteceu nesse mesmo ano.
As primeiras equipes técnicas de cultura foram formadas por educadores. Professores da Funec e Rede Municipal de Educação, como Júlia Carolina, Lilian Leila Tárcia e Thomaz dos Mares Guia desbravaram a pesquisa histórica, formando os primeiros acervos documentais da Casa e do Parque. Ancorados em estudos contidos nas publicações “Contagem: Origens” (Adalgisa Arantes e Carla Anastasia) e “Contagem Perante a História” (Geraldo Fonseca), na pesquisa da oralidade e na própria experiência prática e pedagógica, deixaram uma marca positiva na história do município. Também deram início ao programa de Educação Patrimonial na cidade, uma das nossas forças na política de cultura e educação, recebendo grupos de estudantes nestes locais preservados, fomentando o seu sentido de pertencimento à Contagem.
Em 1994, outros professores, num processo seletivo interno inédito na Seduc, formaram a equipe de planejamento e gestão cultural que formatou o primeiro Plano de Ação Cultural 1995/1996. Com representantes de vários segmentos da cultura: artes plásticas (Fernando Perdigão), música (Júlio Tavares), teatro e dança (Fátima Silveira), literatura (Ivan Ferreira) e história (Célia Guirado), todos vindos de escolas municipais. Sob a coordenação de Rômulo Avelar e consultoria de Nestor Sant’Anna, o planejamento apontou caminhos em propostas culturais voltadas para a formação, sensibilização e fruição cultural, que em anos subsequentes orientaram parte dos projetos implementados pela prefeitura.
Entre os anos de 2004 e 2012 (mandatos 1 e 2 de Marília), um poderoso programa se destacou, a começar pelo singular título de ‘Educação pelo Tambor’. Nele estava contida a questão pedagógica, cultural e todo o potencial traço afrodescendente ecoado nos ritmos e batuques que orientavam formações e eventos, com participação ativa de estudantes. Curiosamente, não esteve ligado diretamente à Cultura, administrativamente, mas à Funec. Os Educartes, equipamentos públicos voltados à formação cultural, oferecendo oficinas e atividades para estudantes no contraturno, num programa criado em também tiveram grande importância na linha do tempo da educação cultural em Contagem. Muitos outros projetos relacionados às escolas e à “pedagogia cultural” merecem destaque na linha do tempo da cultura em Contagem, como exposições escolares nas galerias do Centro Cultural, Casa da Cultura e Prefeitura, ou em outros espaços como Big Shopping e CICI.
A criação e consolidação da política de editais com o FMIC e mais recentemente, Leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo, aumentou significativamente o número de projetos culturais relacionados à Educação, seja no seu conceito ou na sua realização nos espaços das escolas, potencializando sua conexão. Ressalto que nunca se investiu tanto em cultura como na última e atual gestão da prefeita Marília, que compreende e aposta no seu poder transformador e gerador de bem-estar social.
Segundo a educadora e pesquisadora Ana Mae Barbosa, “a Educação pode ser o mais eficiente caminho para estimular a consciência cultural do indivíduo, começando pelo reconhecimento e apreciação da cultura local”.
Nesse sentido, a Educação Patrimonial e o estudo da história de Contagem, passando pelo conhecimento dos “testemunhos históricos” e visitação e vivências nos pontos referenciais da cultura e do meio ambiente da cidade, como a Casa da Cultura, Parque Gentil Diniz, a recém-criada Estação das Artes (Estação Bernardo Monteiro, restaurada e entregue à comunidade e prefeitura pela VLI, ano passado), os CEU das Artes da Ressaca e Nova Contagem (equipamentos criados em todo Brasil para promoção de atividades culturais e sociais em gestão compartilhada dos municípios com a comunidade, concluídos recentemente pela administração Marília, depois de anos de abandono), Parques Fernão Dias, Eldorado, Tropical, Amendoeiras (todos revitalizados pela atual gestão), entre outros, torna-se essencial na formação dos estudantes para a que se formem cidadãos plenos.
Sou professor concursado de artes da rede Municipal de Educação de Contagem, 1992. Acompanhei e participei de inúmeros projetos de arte-educação, em mais de trinta anos em que estive cedido e ligado aos órgãos de cultura de Contagem. Acredito na força desta conexão por experiência. Em todos esses anos de “cultura”, embora não estivesse na docência direta nas escolas, me relacionei com muitos professores de artes e outras áreas, sempre acompanhando e, quando possível, apoiando projetos escolares.
Em janeiro de 2025, fui convidado, junto com Olister Barbosa, a compor a equipe de comunicação e cultura da Seduc, pelo secretário de educação, Lindomar Diamantino. A Seduc é um universo de gestão muito amplo, abrangente, diverso e desafiador! Quase 200 servidores se distribuem em muitos departamentos setoriais, num espaço amplo e bem distribuído, dividido também com a administração da Funec. Numa cidade de quase 700 mil habitantes, 130 unidades educacionais, quase 60 mil estudantes, os trabalhos na educação são intensos. Depois de 90 dias por aqui, vamos nos familiarizando e conhecendo melhor os trabalhos setoriais, as pessoas, os projetos e inteligências, e já podemos contribuir com mais consistência na gestão.
Comunicar é sempre um desafio. Temos uma boa estrutura e profissionais na equipe. Nosso objetivo é melhorar, gradativamente, o fluxo de informações, tanto internamente, quanto externamente nas escolas e toda a comunidade escolar. Mas nossa maior missão é potencializar a relação da cultura com a educação.
Entre as atividades setoriais importantes na Seduc, temos o Programa de Educação em Tempo Integral, que também tem entre suas ações a realização de oficinas com Agentes Culturais de diversas áreas, como arte, cultura, tecnologia e comunicação, esporte e meio ambiente. No seu “Cardápio Cultural” estão elencados: Animação de Eventos e Apresentações, Artesanato; Canto Coral; Cineclube; Dança; Desenho e Pintura; Fanfarra; Flauta Doce; Grafite; Hip-Hop; Horta Escolar; Instrumentos de Corda; Jogos e Brincadeiras; Teatro; Percussão e Construção de Instrumentos Percussivos; Práticas Circenses, Capoeira, Cultura Digital e Tecnologias, Fotografia e Vídeo, entre outras. Nesse mesmo programa, os estudantes participam de ações mediadas por professores tutores, que orientam o processo de recomposição de aprendizagens e estudos orientados.
Noutro campo de pesquisa e atuação cultural, desde 2021, o Centro de Memória da Educação tem feito um trabalho incrível de registros, captação de depoimentos de educadores que fizeram história na Rede municipal de educação, promoção de exposições escolares e institucionais, oficinas culturais e projetos editoriais, como o selo “Bunitezas”, junto com Programa de Biblioteca e Leitura Contagem das Letras, que tem promovido a edição de obras literárias criadas pelos estudantes com a organização de professores da rede.
Com as equipes competentes e dedicadas do Centro de Memória e do Programa de Biblioteca e Leitura nos alinhamos nos objetivos e implementamos ações para ocupação regular do amplo e estratégico hall da Seduc. Nesses primeiros meses de 2025, já realizamos a exposição Fragmentos da Memória – retratos de Contagem, com fotos antigas da cidade, parte do acervo da Casa da Cultura Nair Mendes Moreira – Museu Histórico de Contagem, a mostra e oficina “Tesouros de Papel”, com a artista e educadora aposentada da Rede, Bernadete Fiorini e a exposição Pardo é Papel, com trabalhos produzidos por crianças da educação Infantil dos Cemeis Décio Camargos e Confisco, ação inicialmente idealizada em 2024 pela equipe de Direitos Humanos da SECADI – Superintendência de Educação Continuada, Alfabetização de Adultos, Diversidade e Inclusão.
Neste mesmo espaço foi instalado o painel mural “Memória de Contagem”, de Yara Tupynambá, uma das maiores artistas de Minas Gerais, produzido em 2015, a partir convite da Prefeitura de Contagem para instalação na UPA JK e recentemente transferido para a Seduc, após obras no local de origem. A obra, com todo seu conteúdo histórico, cultural e pedagógico, merece um artigo à parte. Destaco aqui que o evento promovido pela Seduc em parceria com a Secult para abrir oficialmente a exposição do painel e a mostra Pardo é Papel, no dia 14 de maio, parte da programação da 23ª Semana Nacional de Museus do IBRAM, com a participação de crianças da Educação Infantil da E. M. Francisco Borges (nossos vizinhos) e a apresentação musical ao piano, do estudante do 2o ano da Funec Ressaca e ESMU, Davi Lobo, foi um momento mágico, em que essa conexão Educação, Arte e Cultura mostrou todo seu potencial.
Nesses primeiros meses de 2025, procuramos manter contato com a Secult, buscando potencializar projetos culturais programados para as escolas municipais, como o mural do coletivo Negráfrica, Herança Viva, pintado na E. M. Heitor Villa-Lobos com a participação dos estudantes de 8o e 9o anos, numa relação pedagógica direta com as aulas de Arte, para citar um exemplo.
Outro projeto que se relaciona diretamente à cultura e arte nas escolas está em gestação no Núcleo de Comunicação e Cultura da Seduc. São intervenções artísticas com pintura nos muros e pátio escolares, partindo da nossa experiência em atividades de arte urbana (muros) e também da pesquisa de jogos tradicionais (arte interativa de brincar), além de elementos locais que possam embasar conceitualmente o trabalho. Esse projeto se relaciona também com a proposta de comunicação visual da gestão, em fase de estudo. O trabalho vai se iniciar agora, com a pintura do Cemei Mundo Maior (em reforma) e gradativamente vai se estender as outras unidades escolares, seguindo programação interna da Seduc e calendário de reformas.
Diante de todas as informações e conceitos expostos neste artigo, entendo que, dentro do objetivo de melhoria dos índices de aprendizagem e alfabetização, um dos grandes desafios e objetivos da Educação em Contagem, esse ambiente positivo e alegre, estimulado pela atividade cultural, que gera pertencimento e bem-estar, pode de fato contribuir, poderosamente!
Para fechar, cito Paulo Freire que afirma: “A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria”
(Paulo Freire Pedagogia da autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996).
Fernando Perdigão é artista visual, produtor e gestor de cultura. Assessor no Núcleo de Comunicação e Cultura da Seduc