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José Prata: “Dívida de Minas Gerais ‘explode’ no governo Romeu Zema”

Já mostrei em outros estudos, que Minas Gerais tem “desequilíbrios estruturais”, que impossibilitam uma solução duradoura para as finanças públicas estaduais. Mas, quase sempre, os governos estaduais que se sucedem fazem uma politização “rasteira” desta questão e jogam a culpa pela deterioração fiscal nos governos anteriores; é como se a crise fiscal de Minas se resumisse a uma questão “de gestão”, de “competência administrativa”, e não fosse resultado de desequilíbrios de difícil solução. (…) Veja agora a situação fiscal de Minas Gerais no governo Romeu Zema. A dívida pública estadual, principal indicador fiscal do setor público, passou, em dois anos e quatro meses, de R$ 113,819 bilhões para R$ 143,203 bilhões, um crescimento nominal de quase R$ 30 bilhões, e crescimento percentual num prazo muito curto de 26%. (…) O que isto significa? Quando Minas Gerais voltar a pagar a dívida, seja por decisão judicial ou pela adesão ao plano do governo federal, os encargos da dívida serão tão elevados que irão inviabilizar financeiramente o nosso Estado novamente. Já se passaram cinco governos – Itamar Franco, Aécio Neves, Antônio Anastasia, Fernando Pimentel, e agora Romeu Zema -, e a dívida de Minas Gerais continua próxima a 200% da receita corrente, limite da Lei de Responsabilidade Fiscal, o que a torna inadministrável. (…) Veja a seguir informações sobre as finanças de Minas.

ROMEU ZEMA: AMPLIAÇÃO DA RECEITA E CONTENÇÃO DAS DESPESAS LEVAM À MELHORIA MOMENTÂNEA DAS FINANCAS DO ESTADO. A receita corrente líquida do Estado teve uma importante recuperação no governo Romeu Zema, com o crescimento da economia e com as transferências extraordinárias feitas pelo governo federal no ano de 2020, parte do chamado Orçamento de Guerra. Em 2018, a receita corrente do Estado foi de R$ 56,345 bilhões e fechou em abril de 2021 (últimos 12 meses) em R$ 73,960 bilhões, um crescimento de R$ 17,615 bilhões, ou 31,26%; este percentual é bem acima da inflação do período de 11,60%, um crescimento real de 17,62%. É possível que o valor da receita no ano de 2021 seja um pouco menor porque não se terá mais as transferências extras de 2020 do governo federal, mas ainda assim o resultado será amplamente positivo. Já nas despesas, a política de Romeu Zema é de forte contenção dos gastos, como se pode ver a seguir.

A principal medida de contenção das despesas do Estado é a continuidade da liminar do STF que suspendeu o pagamento da dívida do Estado ao governo federal em todo os anos do governo Romeu Zema até o momento. Informa o jornal O Tempo: “Atualmente, Minas Gerais não paga a dívida estadual que foi refinanciada pela União e nem a dívida oriunda de empréstimos que a União teve que honrar depois que o Estado não conseguiu pagar as parcelas. São 22 contratos de empréstimo nos quais a União é garantidora. Dezenove deles são alvos de liminares”. Se voltar a pagar a dívida, Minas Gerais teria que honrar parcelas de R$ 710 milhões por mês, mais de R$ 8,5 bilhões por ano, além de pagar parcelas da dívida que não foram pagas em função da liminar do STF. (…) Na despesa com a dívida, como se vê, não se trata de um corte de gastos mais duradouro, o adiamento é uma “bomba relógio” que cairá no colo dos futuros governantes de nosso Estado. É a moratória da dívida que explica a disparada da dívida de Minas (as parcelas não pagas mais encargos se acumulam no valor total da dívida); ou seja, o crescimento da dívida “esterilizou” o crescimento das receitas, o que manteve a dívida num patamar muito elevado. Entre dezembro de 2018 e abril de 2021, a dívida passou de R$ 113,819 bilhões para R$ 143,203 bilhões, um crescimento nominal de 26% num prazo muito curto de dois anos e quatro meses. Com isto a dívida pública estadual se manteve num patamar muito elevado nos indicadores da Lei de Responsabilidade Fiscal. No mesmo período analisado acima, a dívida consolidada teve um pequeno recuo, enquanto proporção da receita corrente, de 202% para 193,74%; e a dívida consolidada líquida passou de 189,03% para 176,39%. Ou seja, a situação fiscal de Minas Gerais no governo Romeu Zema é similar aquela do governo Fernando Pimentel e, se a dívida era impagável antes, continua impagável agora. Isto foi reconhecido pelo ex-secretário de governo, em declaração ao jornal O Tempo no início de 2020: “Em audiência na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o secretário de Governo, Bilac Pinto, disse que o Ministério da Economia sinalizou que pode questionar as liminares no Supremo. “Se as liminares caírem acaba o governo dele (Romeu Zema), o nosso governo, e desestruturaria as políticas públicas. Acaba a governabilidade”.

Outra contenção forte de despesas foi nos gastos de pessoal. Nos últimos dois anos, os gastos de pessoal do Estado se mantiveram praticamente congelados. A despesa bruta de pessoal passou de R$ 50,733 bilhões, em 2018, para 53,896 bilhões, em 2020, um aumento de 6,2%. Já a despesa líquida com pessoal (despesa bruta menos indenizações, despesas de exercícios anteriores, aposentados e pensionistas pagos com recursos vinculados), critério adotado pela Lei de Responsabilidade Fiscal, passou de R$ 43,095 bilhões para R$ 44,272 bilhões, um aumento de apenas 2,73%. Já a receita corrente líquida, no mesmo período, passou de R$ 56,345 bilhões para R$ 70,585 bilhões, um aumento de 25,27%; com isso, em dois anos, o governo Romeu Zema fez um enorme ajuste no gasto líquido de pessoal, que passou de 76,48%, em 2018, para 62,73%, em 2020, muito próximo ao limite de gastos da Lei Fiscal de 60% da receita corrente líquida.(…) Este ajuste nos gastos de pessoal foi conseguido com base em três medidas: não aumento dos gastos porque eles ultrapassavam o limite da Lei Fiscal; congelamento dos salários nos anos de 2020 e todo o ano de 2021, resultado da imposição da lei federal que transferiu recursos extras para Estados e Municípios na pandemia; reforma previdenciária, que aumentou alíquotas de contribuição e limitou o acesso aos benefícios.

Também nas despesas com investimentos praticamente quase nada foi feito com recursos do Tesouro Estadual. Mas investimentos expressivos poderão ser feitos nos próximos anos com o acordo da Vale, no valor total de R$ 37,689 bilhões. Deste total, cerca de 30% serão para beneficiar o município e a população de Brumadinho; os R$ 27 bilhões restantes formarão uma carteira de investimentos e obras importante nos próximos anos, em obras na Bacia do Paraopeba, reparação socioambiental, segurança hídrica na Grande BH, construção do Rodoanel, investimentos em hospitais e outros.
Portanto, a combinação do aumento das receitas e contenção das despesas, sobretudo de pessoal, de fato, deram algum fôlego ao governo Romeu Zema, que está colocando o pagamento dos servidores estaduais em dia, provavelmente também o 13º salário deste ano; repassando recursos aos municípios referentes aos impostos retidos nos anos anteriores; fechamento de acordo com o Tribunal de Justiça para reposição de recursos de precatórios; negociação com os municípios do pagamento das repasses atrasados na saúde; pagamentos de fornecedores em atraso; e mais os investimentos com os recursos da Vale. São medidas de impacto social e político inegável. Mas o grande desequilíbrio do Estado permanece sem solução: a enorme dívida que o Estado tem, sobretudo, com a União.

PLANO DE RECUPERAÇÃO FISCAL FRACASSOU NO RIO E, SE ADOTADO, VAI FRACASSAR EM MINAS GERAIS. Em primeiro lugar, é preciso dizer que situação grave de endividamento não é comum nos Estados; são 20 estados com dívida fundada inferior a 62% da receita; são três estados com dívida de até 80% da receita corrente. São apenas quatro estados que tem um endividamento praticamente fora do controle; a situação é de difícil solução porque são quatro dos maiores estados brasileiros. A situação mais grave é do Rio de Janeiro, com dívida de 319% da receita corrente líquida (dado de 2020); Rio Grande do Sul e São Paulo tem dívidas, respectivamente, de 224,38% e 170,99% da receita corrente líquida (dados de 2019); e Minas Gerais com dívida de 193,74% da receita (dado do primeiro quadrimestre de 2021).(…) O Plano de Recuperação Fiscal do governo Federal que dá uma moratória de três a seis anos para os estados mais endividados, muito concentrado apenas no corte de despesas, não soluciona a situação fiscal de nenhum deles. A suspensão temporária do pagamento da dívida não é solução porque aumenta o endividamento em termos absolutos. Matéria do Valor Econômico, de 06/04/2019, informa: “O Regime de Recuperação Fiscal, ao qual o Rio de Janeiro aderiu em 2017, tem duração prevista de três anos, podendo ser prorrogado por mais três. Durante o período, ficam suspensos os pagamentos da dívida com a União. Se, por um lado, a interrupção dos pagamentos contribui para aliviar o aperto sobre o caixa estadual, por outro, aumenta o endividamento em termos absolutos, uma vez que os juros e os encargos continuam a incidir sobre o valor principal. O problema foi empurrado para 2024”. Relatório do Governo do Rio de Janeiro mostra o fracasso do Plano de “recuperação” Fiscal: em 2016, a dívida pública estadual era de 234% da receita; três anos depois, em 2020, a dívida disparou para 319% da receita corrente. Ou seja, ao final do Plano, em vez de “recuperação”, o Rio de Janeiro estará quebrado de vez.

Não tenho dúvidas de que se o governador não adotar um mix mais amplo de políticas econômicas e fiscais, se insistir em adotar o austericídio fiscal (arrocho dos servidores e privatizações selvagens) vai fracassar e vai apenas prolongar a crise financeira de Minas Gerais e o sofrimento de nosso povo pela ausência de políticas públicas consistentes. Romeu Zema é o governador dos mineiros ou é apenas um leiloeiro das estatais e dos serviços públicos?.(…) Claro que mix de ajuste fiscal o fundamental é um novo plano de desenvolvimento para o Brasil e Minas Gerais. Veja, de forma impressionante, as repercussões dos ciclos econômicos sobre as finanças de Minas Gerais. De 2002 a 2010, com um grande crescimento econômico, a receita do estado cresceu 165% e, considerando a inflação acumulada no período de 56,68%, o aumento real da receita estadual foi de 69%. Nos anos de 2010 a 2014, com a economia em desaceleração, a receita estadual cresceu 44% e, sendo que a inflação no período foi de 27%, o que significou um aumento real da receita de apenas 13,40%. A melhoria da situação fiscal de Minas, entre 2002 e 2014, pode ser expressa nos seguintes indicadores: a) a dívida consolidada enquanto proporção da receita corrente líquida caiu de 276,67% para 196,73%; b) já a dívida consolidada líquida enquanto percentual da receita corrente líquida caiu de 262,65% para 178,97%, e ao cair abaixo de 200%, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal, possibilitou que o Estado buscasse no mercado financeiro, novos empréstimos para obras. (…) Finalmente, de 2014 a 2018, com a forte recessão da economia, a receita estadual apresentou crescimento nominal inexpressivo de 18,26%, o que não cobriu sequer a inflação do período de 25,63%; ou seja, Fernando Pimentel enfrentou uma “tempestade perfeita”, com receitas com crescimento real negativo e atraso de pagamentos de servidores, fornecedores, e municípios; já as dívidas estadual consolidada e consolidada líquida se mantiveram estáveis e passaram de 196,73% e 178,97% para, respectivamente, 202% e 189,03%.

Foi um mix de política econômica mais amplo, que vamos abordar em outro artigo, que a prefeita Marília Campos utilizou para tirar Contagem da falência. Veja só: a) Contagem tinha, em 2004, uma dívida municipal equivalente a 127% da receita (acima dos 120% previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal); em 2012, final do segundo mandato da petista, o percentual recuou para 47% e, atualmente, é ainda menor, sendo a dívida de 33% da receita corrente líquida; b) Contagem que ocupava, em 2004, a 10ª posição nacional no ranking dos municípios em termos de pagamento de amortizações e juros da dívida, passou, agora em 2020, para a 67ª posição no ranking dos municípios; c) hoje Contagem tem uma situação invejável: o município tem uma dívida baixa de 33% da receita corrente líquida e uma grande capacidade de investimento, que deverá alcançar aproximadamente R$ 1 bilhão nos próximos quatro anos, e deverá cumprir com folga o teto de endividamento fixado em programa de governo da petista de 50% da receita.

OS DESEQUILÍBRIOS FINANCEIROS DE MINAS SE DEVEM A DIVERSOS FATORES. Na questão financeira do Estado é preciso reconhecer que não é possível explicar a crise de Minas por apenas um único motivo. A crise é resultado, dentre outros, dos seguintes aspectos: a) a recessão econômica e o baixo crescimento dilaceraram as receitas do Estado; b) a perda de peso do ICMS, principal imposto estadual, com a redução do peso da indústria no PIB e o fortalecimento do setor de serviços c) Minas Gerais perdeu demais com a Lei Kandir, que desonerou as exportações, prejudicando as receitas de estados mais exportadores como o nosso; d) a dívida do Estado entrou em uma trajetória explosiva porque teve uma correção monetária pelo IGP-DI, muito acima da inflação oficial do IPCA, mais juros reais estratosféricos de 7,5% ao ano; e) Minas Gerais, como todos os estados, perdeu muito com a centralização tributária de FHC na década de 1990, que cresceu a carga tributária nas contribuições sociais, que não são repartidas com estados e municípios; f) Minas Gerais é a terceira economia do Brasil, mas tem apenas o 11º PIB per capita, o que indica uma arrecadação tributária per capita inferior aos diversos estados, ou seja, Minas é o “primo pobre” do Sudeste, Sul e Centro-Oeste, mas tem carências sociais enormes para serem atendidas; f) nosso Estado é o campeão brasileiro em número de municípios, são 853 no total com população média de 24.606 pessoas, o que dispersa e encarece muito os serviços públicos estaduais; g) Minas Gerais faz poucos concursos públicos, tem déficit enorme de servidores efetivos, que são os contribuintes da previdência estadual, e tem grande contingente de servidores “temporários” e comissionados, que são contribuintes do INSS, além da despesa do Estado com a contribuição patronal; h) existiram de fato, no passado, graves distorções no serviço que nada tem a ver com os direitos dos servidores: a aposentadoria era integral sem nenhuma carência no serviço público, o que garantia a integralidade da remuneração para pessoas com pouquíssimo tempo de serviço público, ainda mais durante longo período que não se exigia concurso para ingresso no serviço público, o que era de fato insustentável; na Constituição mineira foi inserido um artigo, que acabou sendo revogado, que garantiu a contagem de tempo privado para fins de aposentadoria, o que é correto, mas garantiu também o tempo privado também para fins de quinquênios, o que era também insustentável; durante muito tempo, a legislação mineira garantiu o “apostilamento”, que garantia ao servidor ocupante de cargo político a continuidade da remuneração de chefia e assessoramento depois do retorno do servidor ao cargo de origem; i) no Estado estão as duas categorias mais numerosas que se aposentam especial, e merecem continuar com a aposentadoria mais cedo, mas é preciso garantir um esforço fiscal para fazer frente a esta despesa previdenciária com a aposentadoria especial.

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