Em 2022, após quase dois anos de escolas fechadas, devido à pandemia, em decorrência da Covid-19, os desafios que já eram enormes, diante dos professores e professoras preocupados(as) com o ensino emergencial remoto, dos pais inseguros com futuro de seus filhos, e claro, dos estudantes que estavam retornando ao ambiente escolar, ainda, num clima de insegurança, com relação à epidemia.
No segmento do Ensino Médio, acrescentou-se, ainda, àquele cenário de insegurança, a implementação do Novo Ensino Médio-NEM, que impôs uma série de alterações, que foram aprovadas pela Lei nº 13.415, em 2017, que determinou que as escolas se adequassem às mudanças ocorridas, e as executassem, a partir de fevereiro de 2022.
Vale ressaltar que o NEM consiste em uma reforma na grade curricular, e que essa medida foi sancionada no contexto da presidência de Michel Temer, cuja legitimidade é questionada, em virtude do Golpe ocorrido em 2016.
Os pontos mais sensíveis da reforma imposta determinaram a ampliação da carga horária de 800 horas para 1.200 horas, e a criação dos chamados itinerários formativos. Nesse sentido, o Governo Federal, à época, definiu que estes fossem compostos pela disciplina obrigatória “Projeto de Vida”; pelas “Eletivas”; e a pela “Trilha Formativa”, que em si é constituída por disciplinas que ainda precisariam ser criadas pela equipe pedagógica.
Ademais, a proposta acarretou a diminuição da carga horária das disciplinas que compõem a Formação Geral Básica (FGB), que são, por exemplo, disciplinas como Biologia, Geografia, Sociologia, Filosofia, Química, História etc. Foi posto que, dessa forma, os estudantes teriam a possibilidade de escolher, através dos itinerários formativos, um caminho pelo qual tivessem mais afinidade para percorrer, durante os três anos de Ensino Médio. Sobre isso, vale dizer que é de entendimento, unânime, dos estudiosos em Educação, que as disciplinas de FGB não deviam perder em carga horária.
Desde então, o que os estudantes, professores, pais e gestores vivenciam é a dificuldade em lidar com as novas “disciplinas”, a falta de formação e de instrução adequada para tal implantação.
Nesse cenário, temos conhecimento de escolas que fizeram o que era esperado do Governo Temer, seus proprietários organizaram seus itinerários, de maneira econômica e, majoritariamente, sem discussão com os docentes, promovendo de fato o sucateamento da educação. E sendo assim, aqueles que não estavam nos planos das “novas disciplinas” foram sumariamente, demitidos.
Houve também, aquelas escolas que organizaram “de cima para baixo”, autorizando e obrigando que professores, sem formação pertinente ao tema do itinerário, lecionassem-no. Além disso, vários profissionais perderam suas lotações em suas escolas, uma vez que não foram contemplados com as “novas disciplinas”.
Na cidade de Contagem, por meio da Fundação de Ensino de Contagem-Funec, o NEM foi tratado de outra forma, com ares democráticos e de respeito à comunidade escolar, como é uma conduta própria de nosso Governo Municipal.
Em 2021, primeiro ano de mandato de nossa Prefeita, e de nossos gestores educacionais, nós escolhemos sistematizar o processo de implementação dessa nova organização curricular com princípios pedagógicos, cuja premissa fosse a manutenção da democracia e do respeito a nossa comunidade educativa.
O contexto educacional ainda era de escolas fechadas pela pandemia, e que, posteriormente, receberam a comunidade educativa, em regime híbrido. E baseados em discussões e debates, nossas equipes pedagógicas, das unidades escolares e da administração da Funec, construíram orientações para a criação de seus itinerários, partindo do princípio da valorização e reconhecimento do que a escola já produzia em sentido exitoso.
Nosso cuidado se baseou em uma organização em que nenhum docente ficasse excedente, ou fosse obrigado a lecionar uma ‘disciplina” distinta da sua formação. Para tanto, os itinerários foram construídos a partir da “experiência didático-cultural de cada escola, e de sua comunidade educativa. Sendo assim, foi possível, por exemplo, a partir da expertise já existente na unidade Cruzeiro do Sul, desenvolver um itinerário em “Educação Audiovisual, Tecnologia e Mídias Sociais”.
Os itinerários profissionalizantes foram fortalecidos nas unidades Centec e Riacho, e, as unidades Xangri-lá e Inconfidentes partiram para itinerários relacionados à Iniciação Científica, dentre outros exemplos de sucesso existentes nas dez unidades da Funec.
Com essa perspectiva, demos início à implementação, em 2022, num contexto já discutido no início desse artigo, e também, com muitas preocupações e na expectativa de uma possível revogação do NEM, pelo Governo Federal.
Ao longo de 2022, nossos (as) estudantes do primeiro ano do Ensino Médio foram se adaptando ao NEM, tendo que separar as informações e notícias que transitavam na mídia, e aquelas do “mundo real”.
Temos certeza de que, através do nosso quadro de professores(as), que possui muita competência e responsabilidade, bem como dos investimentos, por exemplo, na construção de laboratórios de Ciências da Natureza, e na compra de equipamentos para os mesmos, os impactos foram diminuídos, e fizemos, sim, “do limão, uma limonada”.
Atualmente, na prática, nossas escolas ainda não vivenciam, diariamente, o melhor dos cenários, ainda reside uma organização pedagógica que precisa lidar com duas arquiteturas curriculares, simultaneamente. Os primeiros e segundos anos já vivenciam o NEM, enquanto os terceiros anos, ainda vivenciam o modelo anterior, e isso, também dificulta a organização funcional de uma escola.
O ano de 2023 nos trouxe uma enorme esperança, que só é possível com a governança daqueles que preconizam um Brasil em união e reconstrução. No âmbito da Educação, isso foi salientado com o posicionamento do Ministério da Educação, que, atendendo aos pedidos de entidades estudantis e de professores, realizou uma consulta pública acerca do NEM.
No último dia 22 de setembro, o Governo Federal enviou à Casa Civil a minuta do Projeto de Lei (PL) que altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB nº 9.394/96), e a Lei nº 13.415/2017, recompondo a carga horária da FGB para 2.400 horas, e vedando o ensino híbrido ou remoto dessas disciplinas. O que não é novidade, para nós, mas alimenta nossa concepção de que estávamos agindo, corretamente, quando a Funec teve como diretriz, não ofertar, de forma híbrida ou remota, nenhuma disciplina da FGB.
O MEC, a partir do cenário devastado que recebeu, e também, de preocupações pertinentes e contextualizadas pelo período pós-pandemia, onde a grande preocupação deveria ser a discussão dos impactos do ensino remoto para nossas crianças e adolescentes, hoje, tenta trazer luz para um NEM.
Para nós, educadores, educadoras, familiares e estudantes, fica a responsabilidade de avaliar, criticar e sugerir, dentro das possibilidades, o que será do ensino médio nos próximos anos.
A Funec segue focada em manter e elevar a qualidade que sempre a destacou no contexto educacional brasileiro, através de seu ensino e da sua presença na vida de tantas juventudes, que por ela já passaram e que ainda irão por ela passar. E que sim, colherá não somente aprendizagem cognitiva, mas também, valores para a vida em sociedade, entendendo-se como protagonista, não pelo exercício da imposição, mas sim, pelo respeito à democracia e, sobretudo, pela valorização da educação de qualidade, para todos (as).
Paulo Figueiredo é Vice-presidente eleito da Funec. Biólogo, professor efetivo de Análises Clínicas da Funec.