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Reforma trabalhista. A concepção desta reforma é a de que o trabalho pela CLT e os empregos públicos são “privilégios” que precisam ser extintos

Todas as medidas previstas na reforma trabalhista tem uma única finalidade: universalizar, generalizar o trabalho precário em contraposição ao trabalho celetista e no serviço público tidos como “privilégios”. A reforma trabalhista do presidente não eleito, Michel Temer, é o massacre da classe trabalhadora. Falam em ‘modernizar’, ‘atualizar’, dar ‘segurança jurídica’ para as empresas. Mas, na verdade, o que querem é rebaixar os salários e as condições de trabalho dos trabalhadores brasileiros.

A reforma de Temer propõe: acabar com a CLT, onde o ‘negociado’, numa falsa e desigual negociação coletiva, se sobrepõe ao ‘legislado’; a terceirização deixa de ser possível apenas nas atividades meio e poderá ser feita também nas atividades fins das empresas; a terceirização irrestrita no setor público acaba com os concursos públicos; é adotada uma ‘cesta’ de contratos precários, a exemplo do trabalho intermitente e do trabalho autônomo; a reforma, em vez de garantir os direitos, dificulta o acesso dos trabalhadores à Justiça do Trabalho; os sindicatos são enfraquecidos e sufocados financeiramente. Estas propostas, além de prejudicarem muito os trabalhadores, levam à falência definitiva da previdência, cuja receita é totalmente vinculada ao emprego e ao salário; e arrebentam também o nosso mercado interno de massas, porque 65% do Produto Interno Bruto – PIB do Brasil é resultado do consumo das famílias”. Veja a seguir explicações sobre os principais pontos da reforma trabalhista.

Negociado tem prevalência sobre a lei, ou seja, o que estiver fora da lei vale mais que a lei. O lobby empresarial considerou que não bastava a previsão original da reforma trabalhista de que “a convenção e o acordo coletivos terão força de lei”, e a redação final previu que “a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei”. Ou seja, o que estiver fora da CLT valerá mais que a CLT. Se o “negociado” prevalece sobre o “legislado” no sentido de se retirar direitos, o que temos é o fim da CLT. O modelo trabalhista brasileiro é misto baseado numa ampla legislação constitucional e infraconstitucional e contratação coletiva do trabalho. Neste sistema, o “negociado” só pode ampliar o que é “legislado”, e não reduzir direitos dos trabalhadores. Portanto, a CLT é uma espécie de piso mínimo para os direitos trabalhistas no Brasil. A elite dominante (grandes empresários e grandes grupos de mídia) tergiversa sobre este modelo trabalhista, não assume abertamente a revogação da CLT, mas propõe a sua “flexibilização”, “modernização”, “atualização”, e outras desculpas da mesma natureza. Ora, se o “negociado” prevalece sobre o “legislado”, o que vai acontecer é, na prática, a supressão da CLT, que permaneceria em vigor, mas sem qualquer utilização prática. A elite brasileira tem historicamente um “jeitinho” de tornar obsoletas leis que lhes desagradem, como aconteceu, também na área trabalhista, com a estabilidade no emprego, que foi substituída pelo FGTS optativo, mas quem não “optar” não é admitido no emprego.

Reforma trabalhista não mudou a estrutura sindical e enfraqueceu ainda mais os sindicatos. A estrutura sindical brasileira é caracterizada pela unicidade nas entidades de base e pelo pluralismo nas entidades de cúpula (federações, confederações e centrais sindicais). Segundo o modelo vigente, os sindicatos são únicos em cada base de representação, mas são divididos em diferentes categoriais profissionais, o que acarreta sua dispersão em 11.345 entidades classistas registradas junto ao Ministério do Trabalho em maio de 2017. Ao contrário do que comumente se imagina, a unicidade sindical não impede a divisão dos sindicatos, uma vez que permite que sejam desmembrados por categoria profissional ou base territorial. Essa divisão organizativa reduz a capacidade de ação coletiva e dificulta a construção da unidade política em torno da defesa e ampliação dos direitos trabalhistas. (…) A discussão sobre a estrutura sindical brasileira é polêmica e não será detalhada. Para nossos propósitos, basta indicar que organizações sindicais e patronais, pesquisadores e integrantes dos diferentes governos que se sucederam no comando do país desde a Constituição de 1988 têm defendido posições distintas quanto à manutenção ou o fim do monopólio da representação sindical, a preservação ou a extinção das contribuições compulsórias, a organização no local de trabalho, dentre outros aspectos fundamentais para a vida sindical. A reforma trabalhista não se propõe a alterar a estrutura sindical brasileira. Os verdadeiros problemas sindicais brasileiros não são enfrentados, tais como as restrições à liberdade sindical, a baixa representatividade e a dispersão. Ou seja,  a reforma trabalhista não contempla questões fundamentais que contribuam para o fortalecimento e para a constituição de entidades sindicais representativas e com capacidade de efetivamente organizar os trabalhadores na defesa dos interesses da categoria e da classe trabalhadora.(…) Ao invés disso, a reforma proposta afeta significativamente o sindicalismo e sua capacidade de ação coletiva, introduzindo medidas que enfraquecem e esvaziam os sindicatos. Entre as alterações promovidas, destacamos as seguintes: 1) o aprofundamento da fragmentação das bases de representação sindical; 2) a prevalência do negociado sobre o legislado e a inversão da hierarquia dos instrumentos normativos; 3) a possibilidade da negociação individual de aspectos importantes da relação de trabalho; 4) a eliminação da ultratividade dos acordos e da cláusula mais favorável; 5) a representação dos trabalhadores no local de trabalho independentemente dos sindicatos; 6)a redução dos recursos financeiros aos sindicatos. Em síntese, apesar não colocar em discussão a reforma sindical, a reforma trabalhista produz impactos negativos sobre os sindicatos, o que pode trazer consequências nefastas para o futuro da democracia e das condições de constituir uma sociedade civilizada (CESIT Universidade de Campinas).

Reforma trabalhista liberou a terceirização das atividades meio e fins. A reforma trabalhista foi aprovada através das Leis 13.429/2017 (que tratou do contrato temporário e da terceirização) e da Lei 13.467/2017 (que mudou muitos artigos da CLT e mudou novamente as regras da terceirização). Na primeira Lei aprovada ficou assim definida a terceirização: “Empresa prestadora de serviços a terceiros é a pessoa jurídica de direito privado destinada a prestar à contratante serviços determinados e específicos”. Na segunda lei, o governo Temer mudou o texto sobre terceirização, que ficou assim: “Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução”. Portanto, a reforma trabalhista liberou geral a terceirização das atividades meio, que já existia, e também das atividades fins, que era vedada por uma Súmula do Tribunal Superior do Trabalho – TST.(…) A precarização das relações de trabalho, com redução de direitos e prejuízos à saúde e à segurança dos trabalhadores, é inerente à intermediação de mão de obra e terceirização, como demonstram inúmeros estudos já realizados, cabendo destacar que os trabalhadores terceirizados: 1) sofrem 80% dos acidentes de trabalho fatais; 2) sofrem com piores condições de saúde e segurança no trabalho; 3) recebem salários menores do que os empregados diretos; 4) cumprem jornadas maiores do que os empregados diretos; 5) recebem menos benefícios indiretos, como planos de saúde, auxílio alimentação, etc; 6) permanecem menos tempo na empresa (maior rotatividade de mão de obra, com contratos mais curtos); 7) sofrem com a fragmentação da representação sindical; g) quando “pejotizados” perdem todos os direitos previstos na CLT. Acresce que a terceirização das atividades-fim gerará também prejuízos ao conjunto dos trabalhadores e da sociedade, pois implica redução da base de cálculo da cota para contratação de pessoas com deficiência, de aprendiz e do número de integrantes do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT), órgão essencial na prevenção de acidentes. (Ministério Público do Trabalho – MPT)

Terceirização irrestrita no setor público acaba com os concursos públicos. Se a terceirização irrestrita no setor público não for barrada, o Brasil estará colocando à disposição dos prefeitos, governadores e presidentes todos os 7,2 milhões de cargos de servidores concursados que temos atualmente (são 3,9 milhões de estatutários nos municípios, 2,7 milhões nos estados e 645 mil na União), que serão indicados politicamente a medida que os atuais servidores concursados forem se aposentando. Ou seja, prefeitos, governadores e presidentes irão montar empresas terceirizadas, diretamente ou através de aliados, e poderão indicar os seus parentes, amigos e demais apadrinhados políticos para ocupar todos os cargos das atividades fins, sejam professores, médicos, advogados, assistentes sociais, engenheiros, servidores administrativos. Isto sem falar das empresas estatais, onde poderá também ser implementada a terceirização irrestrita e cancelados os concursos públicos. Vamos virar uma República do “QI”, o famoso “Quem Indica”. Defendemos a política e os partidos políticos, que são fundamentais em uma democracia. Mas em uma democracia consolidada, como nos países europeus, os nomeados politicamente são poucos e não passam de algumas poucas centenas em cada país. Assim, também deveria ser no Brasil, com poucos indicados politicamente e a esmagadora maioria sendo admitida através de concursos públicos para cargos permanentes e, através de processos seletivos públicos, nos casos que a Constituição permite a contratação temporária. Defendemos menos indicações políticas e mais concursos públicos.

Formas de contratação mais precárias e atípicas: trabalho temporário, terceirizado, jornada parcial, trabalho autônomo, trabalho intermitente, teletrabalho e “pejotização”. A reforma trabalhista amplia a cesta de contratos precários. Ao se justificar como provedora da “segurança jurídica” e como veículo para a “modernização” das relações de trabalho, a reforma trabalhista promove os meios para que as empresas ajustem a demanda do trabalho à lógica empresarial, reduzindo aqueles custos que garantem estabilidade e segurança ao trabalhador. Ao mesmo tempo em que legaliza a desresponsabilização das empresas sobre os trabalhadores que contrata, a reforma estimula e legaliza a transformação do trabalhador em um empreendedor de si próprio, responsável por garantir e gerenciar sua sobrevivência em um mundo do trabalho que, lhe retirará a já frágil rede de proteção social existente. É isto que fica evidente se analisarmos as regulamentações propostas em relação ao trabalho temporário, terceirizado, jornada parcial, trabalho autônomo, assim como a criação de uma nova forma de contrato, qual seja, a do trabalho intermitente. (…) Os contratos intermitentes, em tempo parcial, a terceirização, os autônomos e os contratos temporários se instituem em oposição aos contratos por tempo indeterminado. No Brasil, as tentativas de fixar novas modalidades de contratação na década de 1990 não surtiram os efeitos esperados. A rigor, a única forma que se ampliou foi a prática da terceirização, embora restrita às atividades previstas em lei ou atividades meio, conforme determina a Sumula nº 331 do TST. Entretanto, essa prática se disseminou ensejando, com isso, inúmeras ações na Justiça do Trabalho reivindicando vínculos com o tomador de serviços. Não há, nessas modalidades de contratação, qualquer estimulo à geração de emprego, ao contrário, são adotadas com o propósito de racionalizar o uso do tempo pelos empregadores, gerando mais desemprego, insegurança e precariedade.(…) A reforma cria uma nova figura do trabalho – fruto bem-acabado da flexibilização e da precarização – a do trabalhador just in time. A regulamentação e liberalização do contrato de trabalho temporário e a terceirização, já implementadas na Lei nº 13.429/2017, assim como a legalização irrestrita do trabalho autônomo na Lei 13.467/2017, são instrumentos fundamentais nesta transformação. A Lei nº 13.429/17 amplia a utilização dos contratos temporários, possibilitando, por essa via, o uso indiscriminado da terceirização, seja no âmbito público ou privado, permitindo, ainda, a substituição de trabalhadores efetivos por prestadores de serviços para a realização de quaisquer atividades. Entretanto, a nova figura do contrato de trabalho intermitente introduzida no texto da reforma garante a disponibilidade total deste trabalhador ao capital, mas somente utilizado na exata medida de sua necessidade. (CESIT Universidade de Campinas)

Ao invés de reduzir o descumprimento das leis, reforma dificulta o acesso à Justiça do Trabalho. A Constituição Federal, em seu art. 5º, XXXV, prevê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito” e, no inciso LXXVIII, “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.(…) A despeito disso, nenhum desses dispositivos constitucionais foram observados em diversas inovações da reforma trabalhista, o que os inquina de inconstitucionalidade. Em verdade, nota-se, claramente, que um dos objetivos contidos em diversas normas da reforma é dificultar o acesso dos trabalhadores à Justiça do Trabalho, trilhando caminho oposto ao indicado pela Constituição Federal. (…) Inicialmente, deve-se pontuar que o processo do trabalho possui autonomia científica e tem como objetivo precípuo permitir que o trabalhador, o qual não recebeu os valores devidos em virtude do contrato de trabalho, tenha meios de receber o que lhe é de direito.(…) Ao invés de criar instrumentos para reduzir o nível de descumprimento das normas trabalhistas e as lesões que geram aos direitos dos trabalhadores, como medida para reduzir a inflação de processos trabalhistas, alegada no Relatório da Câmara dos Deputados, a reforma dificulta o acesso à Justiça do Trabalho para postular a reparação das violações – basilares diga-se, posto que referentes, em sua grande parte, ao pagamento de verbas rescisórias – consagrando uma clara inversão de valores, pois não se preocupa em impedir a própria ocorrência do dano, mas, tão-só, a sua reparação (Ministério Público do Trabalho – MPT). (…) Nessa linha, as modificações que se pretende introduzir no §§ 3º e 4º do art. 790 da CLT objetivam dificultar a obtenção da justiça gratuita, pois, atualmente, a concessão pode ser de ofício para o trabalhador que ganha até dois salários mínimos e, para os demais, basta que a parte faça uma declaração de que não possui condições de suportar os custos do processo. Com a nova redação proposta, a concessão de ofício é para os que recebem salário inferior a 40% do teto da previdência, sendo que dos demais passa a ser exigida comprovação da insuficiência de recursos.(…) Isto destoa, até mesmo, das normas do Código de Processo Civil, que visa a regular as relações processuais entre pessoas que estejam no mesmo grau de suficiência. Imagine-se, então, criar maiores restrições processuais para o regramento de relações de conflito entre capital e trabalho, naturalmente desiguais entre si.(…) Com efeito, é, no mínimo, inconcebível que a sistemática que se pretende introduzir na Justiça do Trabalho crie maiores obstáculos do que aquela prevista no CPC para as causas da Justiça Comum, onde “Presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural.” (art. 99, § 3º) (Ministério Público do Trabalho-MPT).

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