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José Prata: A sensacional virada política do governo Lula; a vitória em 2026, antes “possível”, se tornou “provável”

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Em conversa, há alguns meses, que tive com Juarez Guimarães, cientista político e militante do PT, ele afirmou: “A reeleição de Lula é possível, mas ainda não é provável”. Fiz um artigo falando que já era um “enorme alento” considerar que a vitória de Lula era “possível”. Na maioria dos países, as vitórias dos governos de plantão são praticamente “impossíveis”. Vivemos uma crise histórica da globalização neoliberal semelhante aquela do início do século XX, onde quase nenhum governo “para em pé”; em mais de 80% das eleições nos últimos anos, os presidentes e primeiros ministros perderam as eleições; vitórias de governos são raras em grandes países, a exemplo do México e do Canadá. E quem vence as eleições, em prazos extremamente curtos, perdem popularidade, a exemplo da Inglaterra, Argentina e do Estados Unidos. Tem países importantes com governos de baixíssima popularidade, de 15% a 30% apenas, e um dos recordes negativos é da presidenta do Peru, Dina Boluarte, com aprovação de apenas 3%. Lula, com a aprovação popular acima com piso de 40% agora na faixa de 50% é um dos presidentes mais populares do mundo. Com a recuperação da popularidade dos últimos meses, a vitória em 2026, antes “possível” se tornou “provável”; vitória, se confirmada no ano que vem, será um fato histórico no Brasil e se transformará numa enorme referência mundial de como enfrentar e derrotar a extrema direita. Considero que um enorme desafio da esquerda é unificar diagnósticos que explicam a recuperação política do governo Lula, para que possamos consolidá-la nos próximos meses. É este o objetivo deste longo texto.

1-É preciso compreender o “tempo histórico” que vivemos; muitos debitam a força das extrema direita às “redes sociais” e à “maldade das pessoas”; mas parafraseando o marqueteiro: “É a crise da globalização neoliberal, estúpido”. Nosso diagnóstico de Contagem é o feito pelo sociólogo José Luís Fiori. Ele afirma que a melhor explicação para o extremismo de direita é que o final dos ciclos de globalização multiplicam as revoltas sociais e as reações nacionalistas: “A história contemporânea sugere que Karl Polanyi tenha razão: os grandes avanços da internacionalização capitalista promovem grandes saltos econômicos e tecnológicos, mas, ao mesmo tempo, aumentam geometricamente as desigualdades na repartição da riqueza entre as nações e as classes sociais. E como consequência, no final dos grandes ‘ciclos de globalização’, aumenta e generaliza-se a insatisfação das grandes massas, e multiplicam-se as revoltas sociais e reações nacionalistas, ao redor do mundo”. O que acontece no Brasil não é um fato isolado, é o mesmo que ocorre no mundo.(…) Nenhuma corrente de opinião (socialistas, socialdemocratas, centro, direita, extrema direita) tem apontado saídas para a crise. O jornal Valor Econômico, de 17/12/2024, afirma que a impopularidade crescente de líderes de países ricos projeta turbulências: “Raramente os líderes políticos do mundo rico foram tão amplamente desprezados. Nenhum líder de nação industrializada, exceto a pequena Suíça, tem uma avaliação positiva, de acordo com uma pesquisa de 25 democracias realizada pelo instituto Morning Consult. Os partidos governantes que foram às urnas este ano, em grande parte, sofreram derrotas, incluindo os EUA e o Reino Unido”.

Como resultado da profunda crise da globalização neoliberal, o sociólogo e ex-vice-presidente da Bolívia, Álvaro Linera, prevê hegemonias curtas. A análise foi feita por Linera para a América Latina, vale para o mundo: “Minha hipótese é que, nesses tempos liminares, teremos um progressismo de curta duração e um direitismo de curta duração. Hegemonias curtas, tanto à esquerda quanto à direita. Até que, em algum momento, o destino se realinhe para um lado ou para o outro e se inicie um longo ciclo de 20 ou 30 anos”. As previsões de Linera vem se confirmando, como recentemente nos Estados Unidos, e poucos governos tem conseguido a reeleição. Assim, os riscos que corremos no Brasil da volta da extrema direita não podem ser subestimados. Portanto, reeleger Lula será o Brasil se colocar na contramão do mundo, faremos história ao parar a extrema direita em nosso país. Lutamos, na expressão de Linera, que no Brasil “o destino se realinhe para a esquerda”, dando continuidade ao processo histórico progressista que inauguramos com a vitória de Lula em 2022. A reeleição de Lula é “provável” porque o presidente é uma grande liderança brasileira e mundial e tem avaliação na casa de 50% e para se tornar mais certa temos que lutar muito para recuperar a aprovação compatível com as realizações do governo, de 55% a 60%. Mas precisamos ser realistas e não voltaremos mais ao Lula 2, que tinha aprovação de 80%.

2-Pesquisa Quaest, assim como a Datafolha, Ipespe, e outras, indicam uma grande recuperação da popularidade de Lula nos últimos meses. Lula, na Quaest, cresceu mais entre as mulheres, Nordeste, Sudeste, eleitores independentes (nem lulistas nem bolsonaristas). Agora, mais recentemente, o governo Lula vem recuperando o apoio popular, como mostram as pesquisas divulgadas nos últimos dias pelo Datafolha, Atlas/Bloomberg, Ipespe e Quaest. No Datafolha, Lula aparece com 48% de aprovação e 48% de desaprovação; no Atlas/Bloomberg, a aprovação de Lula de 50,8% supera a desaprovação de 48,3%; no Instituto Ipespe, Lula é aprovado por 50% dos eleitores e reprovado por 48% e, agora, é a Quaest que mostra a melhoria expressiva na popularidade de Lula. Como resultado da melhoria na aprovação popular, Lula assumiu a liderança nas pesquisas de intenção de votos para 2026 no primeiro e no segundo turnos, em percentuais acima da margem de erro das pesquisas.

Veja os “fios” da pesquisa Quaest publicados no “X” pelo Felipe Nunes no dia 08 de outubro: a) Pesquisa Genial/Quaest mostra que a aprovação do governo Lula chega ao maior nível desde janeiro deste ano. Aprovação e desaprovação aparecem empatadas: 48% а 49% (uma mudança expressiva em relação a maio quando a desaprovação superava a aprovação em 17%); b) chama especial atenção a recuperação do governo entre o eleitorado feminino (10% a mais desde maio), público que foi fundamental para a vitória de Lula em 2022; agora 52% aprovam o governo Lula e 45% reprovam, percentuais muito melhores que dos homens, que tem aprovação de 44% e desaprovação de 53%; c) chama a atenção também a recuperação, de julho pra cá, no Nordeste (53 -> 62) e no Sul (35 -> 41). No Sudeste, a popularidade do governo oscilou positivamente desde o anúncio do tarifaço (40 -> 44); d) o retrato político deste momento reforça a calcificação. Lulistas e a esquerda aprovam o governo quase que de forma unânime (> 80%); enquanto bolsonaristas e a direita desaprovam com a mesma força (> 80%). Entre o eleitorado independente, um empate técnico: 48% a 46% (mais vale lembrar que é neste segmento da população que Lula mais avançou a aprovação desde maio, passando de 33% para os atuais 46%); e) a pesquisa revela um quadro consistente de recuperação de popularidade desde julho/25. Neste mesmo período, o governo conseguiu começar um processo de recuperação de sua credibilidade, já que aumentou o % de brasileiros que dizem que o governo supera suas expectativas; f) mas o que pode ajudar a explicar esse empate na aprovação do governo? O acumulo de vitórias políticas, transformadas em mais notícias positivas, é um bom sinalizador do que está acontecendo; g) Lula é bem avaliado também pelo encontro com Trump e saiu mais forte politicamente (49% a 27%); o discurso de Lula na ONU foi bem avaliado (52% contra 34%); h) outra notícia positiva para o governo foi a aprovação da isenção do imposto de renda para quem ganha até 5 mil reais. Quase 80% são favoráveis à medida. A expectativa sobre a medida é bem alta, chega a ser exagerada: 41% dos brasileiros acreditam que a reforma da renda vai trazer uma melhora importante para suas finanças. O mais impressionante neste caso é constatar que a expectativa positiva aumentou em todos os segmentos políticos, mas cresceu especialmente entre bolsonaristas e na direita não bolsonarista – fora da base tradicional do Lula; f) outros pontos da pesquisa Quaest favoráveis ao governo Lula: cresceu para 47% os que são contra a anistia; o PL da desometria é rejeitado por 52% a 37%; a PEC da Blindagem tem ampla desaprovação: 63% contra 22%.

3-A recuperação da popularidade de Lula não se deve a uma única razão; foram muitas as iniciativas positivas do governo e dos movimentos sociais, além de erros comprometedores que desgastaram a direita e a extrema direita. O governo Lula, na série de 8 pesquisas da Quaest, em 2023 e 2024, tinha aprovação em média de 53% da população e desaprovação, também média, de 44%. Nos dois primeiros anos tivemos dados bastantes positivos: crescimento da economia superior a 3%; grande geração de empregos; aumento expressivo da renda dos trabalhadores; retorno, mais continuado, ampliado e sustentado, de programas sociais, como o aumento real do salário mínimo, Bolsa Família, Minas Casa Minha Vida. Mas as fragilidades do governo Lula também eram grandes: muitas divergências, muitas vezes públicas, em torno do arcabouço fiscal, fundamental para evitar a explosão da dívida; direção do Banco Central liderada por Roberto Campos Neto, notoriamente contrário ao governo Lula; o presidente Lula envolvido, em demasia, em minha opinião, com agendas internacionais, ficou muito distante da população, sendo que muitos estados não foram visitados uma vez sequer; uma “agenda social requentada e sem novidades” com programas sociais de governos do PT e sem novos programas; a inflação ficou muito pressionada, em especial a inflação de alimentos; uma enorme fragilidade na articulação do Congresso Nacional, com o pouco envolvimento do presidente Lula.(…) No primeiro semestre deste ano, a situação se inverteu com a desaprovação superando a aprovação, a partir da derrota do IOF, fundamental para a manutenção do Arcabouço Fiscal, a crise do PIX, os problemas no INSS, quando publicação do deputado do PL atingiu a inacreditável 330 milhões de visualizações. Na série de seis pesquisas da Quaest, de janeiro a setembro, Lula tinha, na média, uma desaprovação de 52,8% e aprovação de 44,3%. A direita e alguns partidos do Centrão vislumbraram impor uma derrota sem retorno para o presidente Lula, criando um ambiente de ingovernabilidade como vimos no governo Dilma. Mas Lula está dando a “volta por cima” e desde julho vem reduzindo a desaprovação e ampliando a aprovação do seu governo, pelas razões que apresento a seguir.

a)Lula reorganizou o governo e assumiu um protagonismo político decisivo nos últimos meses. Não dá para avaliar a virada no governo Lula por outras razões, mesmo as mais importantes como a mobilização social. Foi a reação de Lula ao cerco político da oposição que encorajou as mobilizações de rua em defesa do seu governo. (…) Lula reorganizou, através de uma reforma ministerial, o seu governo, com destaque para a articulação política com a combativa Gleisi Hoffman, uma liderança com experiência nos momentos de enfrentamento; Alexandre Padilha foi deslocado para a saúde, dando mais dinamismo à pasta e com politização das ações na assistência à saúde; o ministro Fernando Haddad, depois de costurar e reformar o polêmico e necessário Arcabouço Fiscal, se dedicou, com muita competência, aos projetos mais populares do governo, como a isenção do Imposto de Renda; de “Taxad” ele se transformou em “Robin Hood” da justiça tributária; e, principalmente, a entrada do publicitário Sidônio Palmeira para a Secretaria da Comunicação, nome experiente que liderou a comunicação na campanha vitoriosa de Lula em 2022.(…) Lula apostou nas mudanças do PT, sobretudo com Edinho Silva na presidência, e Éden Valadares, na secretaria de comunicação, que vem garantindo o protagonismo do nosso Partido, mas em estreita vinculação com as iniciativas do governo. E o líder do PT na Câmara Federal, Lindberg Farias, cresceu politicamente com as mudanças no governo e tem atuado de forma brilhante, politizada e sem baixarias na defesa do governo no Parlamento e nas redes sociais.(…) Lula reduziu fortemente a agenda internacional e passou a ser uma “figura carimbada”, quase toda semana, nos estados e nas principais cidades brasileiras, no corpo a corpo junto a população. Lula foi para o enfrentamento com a extrema direita e parte da direita, ao recorrer ao STF para validar o decreto do IOF, vetou o aumento do número de deputados federais na Câmara dos Deputados, vetou parte das mudanças na Lei Ficha Limpa, e se colocou contra a PEC da Blindagem.(…) O governo Lula manteve uma posição bastante discreta no julgamento condenação de Bolsonaro, e a democracia vem se saindo fortalecida, com o posicionamento majoritário da população contra a anistia dos golpistas de janeiro de 08 de janeiro e dos chefes da tentativa de golpe militar, em especial de Jair Bolsonaro.(…) Lula, de forma histórica, retomou a defesa da soberania nacional, a partir do tarifaço de Trump e a traição da família Bolsonaro, que nos Estados Unidos, se articula contra o Brasil; com slogans “O Brasil é soberano” e o “Brasil é dos brasileiros”, enfrentou de forma firme e sem bravatas o presidente Trump e agora conseguiu retomar as negociações para superação do tarifaço, que, mesmo sendo muito prejudicial ao Brasil, não vai desestabilizar a nossa economia como pretende a extrema direita.(…) E o mais importante: Lula, com três projetos de grande alcance social, encontrou a “causa”, a “marca” que tanto sonhava para o seu terceiro governo: a ampliação da tarifa social de energia elétrica e o Gás do Povo, para a população mais pobre, sobretudo do Nordeste e do Norte e periferias das cidade do Sudeste e Sul, combinadas com a redução da inflação de alimentos; e a isenção do IR até R$ 5.000,00 e redução do IR até R$ 7.350,00 para a classe média brasileira, sobretudo das regiões Sudeste e Sul de nosso país. E agora, o governo Lula defende mais uma agenda de enorme apoio popular, o fim da escala de trabalho 6X1.

b)A redução da inflação, especialmente da inflação de alimentos, contribuiu muito para a recuperação da popularidade de Lula, porque inflação em alta anula um dos trunfos de Lula: os ganhos reais da renda. Tratei desta questão em artigo de julho, com base em análises do início do ano. Veja a seguir minhas análises.(…)
O economista Christopher Garman considera que é melhor para Lula um crescimento menor nos dois anos final de seu governo (2025 e 2026) com inflação mais controlada do que o inverso: “De todo modo, está muito claro que a inflação é o calcanhar de Aquiles do governo. Uma análise da Eurasia Group identificou que governantes perderam eleições em 2024 não por conta de uma onda ideológica da direita, mas porque os eleitores estavam insatisfeitos com o aumento do custo de vida. Foi isso que levou Trump de volta à Casa Branca e a direita ao poder na Alemanha. Logo, o maior risco para Lula é “entrar em pânico” com a queda de sua aprovação, gastar mais do que deve e acabar com um PIB maior e com inflação mais alta nas mãos. Em termos eleitorais, é melhor deixar a economia esfriar e trazer a inflação para baixo que tentar aumentar o PIB e gerar mais aumento no custo de vida- o grande algoz de todos os governantes em 2024”. (Valor Econômico, 25/02/2025). Este será provavelmente o cenário: uma desaceleração da economia de mais 3% ao ano para percentual ainda representativo acima de 2% podendo chegar a 2,5% e inflação em redução, sobretudo nos alimentos; redução gradual dos juros, o que deverá fazer de Lula ou Fernando Haddad candidatos competitivos e até mesmo favoritos nas eleições de 2026.

c)Sidônio Palmeira, não reorganizou somente a comunicação do governo Lula; sua principal função foi reorganizar a agenda política do governo; afinal “a política de comunicação é a comunicação da política”. Sidônio Palmeira deu uma enorme contribuição para a reorganização do governo Lula; uma pessoa experiente e que liderou a campanha vitoriosa de Lula em 2022. Ele deu uma enorme contribuição para reduzir bastante a polarização, que acaba dando grande destaque a agenda da oposição, e firmou uma política de comunicação com a agenda do governo Lula para o Brasil: democracia, defesa do Estado Social (direitos sociais e tributação progressiva) e soberania nacional. Na democracia, o governo Lula manteve-se numa posição discreta em relação ao julgamento e condenação de Bolsonaro, sem comemoração para não politizar a decisão do Judiciário e para não vitimizar Bolsonaro. Passado o julgamento, Lula apoiou a decisão do Judiciário, mas sem ironias e deboches; posição que julgo fundamental para que a população, em sua ampla maioria, se mantivesse contra a anistia dos golpistas. A principal “marca” do governo Lula, a isenção do imposto de renda, vem sendo tratada de forma correta: a defesa da taxação dos super-ricos, mas sem a polarização de “ricos versus pobres”, mas da justiça tributária, até porque os principais beneficiários desta política são as pessoas de classe média do Sudeste e do Sul, os mais pobres já tinham isenção até os dois salários mínimos. E, com Sidônio, Lula diminuiu muito as solenidades em Brasília, para ministros e funcionários do governo, e transferiu solenidades para as cidades, como aconteceu em Contagem; e, em todas as andanças, Lula visita e conversa, “olho no olho”, com as pessoas das comunidades mais pobres, que serão beneficiadas pelos programas sociais. Lula vem adotando um estilo mais “dialogal” e “sedutor” nas conversas com a população; para não alongar muito seus pronunciamentos e não se empolgar demais vem fazendo muitos discursos lidos. O governo, em vez do nome estranho para o povão “Governo Federal” passou a ser denominado de “Governo do Brasil” e o slogan, correto, mas ultrapassado, de “União e reconstrução” passou a “Ao lado do povo brasileiro”. E Sidônio vem revolucionando a comunicação do governo, especialmente e com grande prioridade para as mídias sociais, que passaram a ser prioridade em relação às outras mídias. E a comunicação formal e burocrática foi substituída por uma comunicação ágil, interativa e interessante. O perfil oficial da Presidência da República também teve avanços extraordinários. O colunista Lauro Jardim, de O Globo, relatou as mudanças em artigo intitulado “Do flop ao viral”: “Depois de um longo período de maré baixa, a comunicação do governo Lula se reinventou nos últimos meses, após a chegada de Sidônio Palmeira e sua equipe ao Planalto. A Secom resolveu apostar na seguinte fórmula para ganhar popularidade nas redes sociais: misturar memes, pets fofinhos e pautas populares. O resultado: apenas no Instagram, 135 milhões de brasileiros foram “impactados” pelas publicações do perfil oficial da Presidência da República nos últimos seis meses. De quebra, a página ganhou 1,2 milhão de seguidores, com um salto de 3.000% nas interações e 2.300% nas visualizações, segundo dados do próprio governo. A principal tática tem sido martelar as pautas sociais. Só em setembro, foram 29 posts sobre a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil — praticamente um por dia”.(…) Também os avanços no perfil de Lula são notáveis; os vídeos do perfil de Lula, ao invés de 200 a 300 mil visualizações, passaram a registrar 2, 3, 5, 10 milhões de visualizações.

d)As gigantescas manifestações da esquerda e do progressismo de um modo geral foram fundamentais para o avanço da agenda do governo Lula e para a melhoria na aprovação do presidente. Neste segundo semestre, as manifestações da esquerda, de forma crescente, tiveram papel decisivo no enfrentamento com a direita e a extrema direita. Mais recentemente tivemos manifestações no dia 7 de setembro; e a maior manifestação da esquerda e do progressismo desde a campanha de Lula, em 2022, foi no dia 21 de setembro em dezenas de grandes cidades brasileiras, com presença estimada de mais de 200 mil pessoas, e somente em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte foram 120 mil pessoas. E o movimento foi plenamente vitorioso, com a derrota da PEC da Blindagem, apelidada pela militância de PEC da Bandidagem e contra a anistia aos golpistas, além da defesa da soberania nacional, com marcas simbólicas, como foi o caso do bandeirão do Brasil em alternativa a bandeira dos Estados Unidos na nas manifestações da extrema direita. E foram manifestações que contribuíram para a espetacular vitória do governo Lula da aprovação da isenção do Imposto de Renda. Vale ressaltar também que as manifestações mais recentes tiveram convocação ampliada, não somente dos movimentações sociais e lideranças como antes, mas agora também com a participação ativa do PT e dos partidos progressistas.

Pablo Ortelado afirma que existe um sentimento distorcido de que direita é mais mobilizada que esquerda. Diz ele: “Embora as manifestações de direita sejam usualmente maiores do que as manifestações de esquerda, isso não significa que as pessoas de direita sejam mais mobilizadas do que as de esquerda, diz. Essa foi uma das conclusões de uma pesquisa inédita feita pelo professor no início do ano, com 10 mil pessoas, mas ainda não publicada. Segundo a pesquisa, os ativistas de esquerda se mobilizam quase três vezes mais do que os de direita. “O motivo provável para a esquerda se mobilizar mais e as suas manifestações serem menores, é que a mobilização progressista provavelmente está dispersa em várias causas – sindicais, estudantis, ambientais, etc – ao passo que a conservadora está concentrada nos grandes atos bolsonaristas”. (Valor Econômico, 25/09/2025).

Esta mobilização da esquerda para grandes atos menor que a extrema direita tem razões concretas: a) muitas pessoas se frustram porque não temos grandes mobilizações das comunidades mais pobres como temos em outros países da América Latina; acontece que diferentemente da maioria dos países que não tem os direitos básicos do Estado Social temos no Brasil um Estado Social robusto, com SUS, CLT, INSS, educação pública e muitos direitos na assistência social, como o Bolsa Família, BPC e outros; este colchão social é um “amortecedor” das populações mais pobres, que são a principal base social da esquerda brasileira; b) Rodrigo Perez, historiador da Universidade Federal da Bahia, afirma: “Lula jamais foi um radical, nem mesmo nos tempos de sindicalista. Sempre foi um mediador, um negociador, um conciliador, o que já lhe rendeu muitas críticas dentro da própria esquerda. Com o passar dos anos, o “estilo Lula” de fazer política disciplinou sua base. O eleitor lulista típico não espera o conflito, não está interessado na agitação, não é um militante mobilizado. O presidente Lula não é reconhecido por liderar grandes mobilizações populares, algo visto pelo bolsonarismo como um sinal de que sua liderança seria frágil”. (Revista Fórum, setembro de 2025); c) uma terceira razão que explica as dificuldades de mobilização da esquerda é que o PT é hoje um partido com um projeto político-organizativo superado; no passado, o PT era um partido mais institucional e os movimentos sociais era seu braço de massas; com o enfraquecimento sobretudo do sindicalismo, o PT ficou meio sem berço, e não definiu o “território” como sua nova base de construção e o exemplo disso é a fragilidade do petismo nos municípios, sobretudo nas grandes cidades.

4-Que lições tirar da situação política atual marcada por uma “polarização total” que se transformou numa “total despolarização”, como no caso do projeto de isenção do imposto de renda (493 votos a zero) na Câmara dos Deputados. O projeto de isenção do Imposto de Renda até R$ 5.000,00 e redução da tributação até R$ 7.350,00 conseguiu um apoio popular de lulistas, bolsonaristas e eleitores independentes difícil de explicar. Como veremos a seguir, tem explicações sociológicas, econômicas, políticas e regimentais da Câmara dos Deputados que explica o consenso, quase impossível, dos “493 votos a zero”.

a)Há alguns meses atrás publiquei passagens de um artigo do ex-ministro Nélson Barbosa, que ajuda muito na compreensão sociológica do apoio maciço da classe média ao projeto, uma novidade em relação à crítica muito comum neste segmento da sociedade, que se opõe muito fortemente ao aumento de impostos. Há alguns meses publiquei um artigo neste Blog com os argumentos a seguir.(…) A classe média só vai aceitar uma tributação mais progressiva se isto começar pelos super-ricos; e importante no projeto de Lula: é a classe média que será a mais favorecida com “redistribuição” tributária do Imposto de Renda. Lula e Fernando Haddad estão lançando as bases para uma aliança entre os mais pobres e a classe média. No debate do IOF é a disputa de “ricos versus pobres”, ou seja, é preciso cobrar IOF dos ricos para minimizar os cortes nos direitos sociais dos mais pobres. E com o projeto do Imposto de Renda será, na prática, “ricos versus classe média” porque a “redistribuição” tributária é dos ricos para as pessoas de classe média, ou como diz Fernando Haddad as pessoas favorecidas serão “os professores, os policiais, os bombeiros”, etc. Mas é muito importante, como vem acontecendo, que os temas – IOF e Imposto de Renda sejam tratados de forma conjunta para dialogar com os pobres e com a classe média”.(…) Fernando Haddad sempre diz que o Brasil foi o último país do mundo a acabar com a escravidão; ele cita também a desigualdade gerada pelos impostos como também uma questão secular. E por que somente agora, estamos conseguindo “pautar” a desigualdade da carga tributária? (…) Nelson Barbosa, ex-ministro da Fazenda, em um interessante artigo sobre a desigualdade no Brasil, explicou sociologicamente a classe média aqui e no mundo. Disse ele: “Em um texto de 2016, Gabriel Palma, da Universidade de Cambridge, apontou que a desigualdade é uma escolha política, não um resultado de forças externas à sociedade. Palma analisou a distribuição pessoal de renda em 129 países, dividindo cada sociedade em três grupos: mais pobres (40% na base da pirâmide), classe média (os 50% seguintes) e os ricos (os 10% no topo). Segundo Palma, há uma regularidade na maioria dos casos: a classe média detém aproximadamente 52% da renda pessoal, independentemente do grau de desigualdade do país em questão. Onde a desigualdade é alta, os ricos têm uma parcela elevada do total da renda, enquanto os pobres têm uma parcela reduzida. Onde a desigualdade é baixa, os ricos têm uma parcela menor, e os pobres, uma parcela maior do bolo. Nos dois casos, a classe média tem cerca de 52% da renda pessoal.(…) Minha interpretação dos resultados de Palma é que, onde a desigualdade é alta, a classe média aceita que os ricos sejam muito ricos desde que os pobres sejam muito pobres. Já onde a desigualdade é baixa, a classe média aceita que os pobres sejam menos pobres, desde que os ricos não sejam tão ricos. A “tolerância à desigualdade” de cada país reflete, portanto, sua preferência de renda relativa. Onde a desigualdade é alta, caso do Brasil, a classe média tolera a riqueza excessiva desde que sua renda também seja excessiva em relação aos mais pobres”. (Folha S.Paulo, 29/09/2019). Bingo! Considero esta formulação de Nelson Barbosa uma chave para explicar porque tamanha adesão da classe média a redistribuição através do imposto de renda. Ou seja, um projeto de esquerda para ter uma maioria social precisa fortalecer o Estado Social para preservar os mais pobres e precisa também redistribuir renda através do imposto de renda; ou seja, para ganhar a classe média para uma política tributária é preciso começar pela maior oneração dos milionários e bilionários.

b)Mas a isenção do Imposto de Renda se transformou em uma unanimidade porque foi uma proposta muito bem construída tecnicamente. Um aspecto decisivo que pouca gente sabe é que se isenção do imposto de renda fosse aplicada de forma indistinta a todas as faixas de renda, da menor à maior renda, o custo da isenção seria proibitivo, de R$ 95 bilhões a R$ 130 bilhões, e seu custo com a construção técnica ficou entre R$ 25 a R$ 30 bilhões. Isto porque a isenção do projeto do governo Lula não transbordou para as faixas salariais acima de R$ 7.350,00. Veja a explicação de José Paulo Kupffer, colunista do UOL: “Pode-se dizer, exagerando um pouco na comparação, que a nova legislação introduziu uma espécie de cashback instantâneo. Embora o contribuinte beneficiado não desembolse nada, é como se o governo “devolvesse” o que ele deveria pagar de imposto, como exemplifica o economista Manoel Pires, coordenador do CPFO (Centro de Política Fiscal e Orçamento Público), da FGV (Fundação Getúlio Vargas), um dos mais experientes e respeitados especialistas brasileiros em política fiscal. Com a manobra, que evitou o transbordamento da isenção, com base na correção da tabela progressiva do IR, para as demais faixas de renda, o governo conteve a renúncia fiscal decorrente da isenção no intervalo entre R$ 25 bilhões e R$ 30 bilhões anuais. Os contribuintes com renda acima de R$ 7.350 continuam nas escalas de isenção anteriores, que alcançavam rendas até dois salários mínimos (R$ 3.036), já considerando o desconto simplificado normalmente usado pelos contribuintes das faixas mais baixas da tabela do IR. Se fosse aplicada a tabela progressiva, isentando cada parcela de R$ 5 mil nas rendas superiores, e assim progressivamente em cada faixa de renda, com suas respectivas alíquotas e parcelas a deduzir, segundo cálculos do economista Sérgio Gobetti, referência brasileira em estudos tributários e política fiscal, a renúncia total alcançaria um valor anual entre R$ 95 bilhões e R$ 130 bilhões”. (UOL, 04/10/2025).(…) Ou seja, a isenção e redução do IR será apenas para a faixa salarial até R$ 7.350,00, acima deste valor continua a isenção somente até dois salários mínimos, de R$ 3.036,00, e na faixa dos mais ricos quem tiver pagando menos de 10% de IR passará a pagar os 10%. Ou seja, a classe média baixa terá isenção e redução do IR, quem estiver acima mantém a tributação sem aumento e os mais ricos terão alíquota mínima de 10%.

c)Para a aprovação da nova legislação do IR tivemos também outras contribuições no plano econômico e político. Fernando Haddad foi, junto com sua equipe, peça chave na aprovação do início da reforma tributária da renda. Ele teve papel fundamental no convencimento de economistas e técnicos de variadas orientações políticas e ideológicas; seus vídeos e entrevistas sobre o tema foram perfeitos e constrangeram os ricos e super- ricos; Fernando Haddad também neutralizou segmentos do mercado, com a defesa do equilíbrio fiscal, com “neutralidade” da proposta, ou seja, não se propôs aumentar a carga tributária, mas uma redistribuição da mesma entre os muito ricos e a classe média.(…) E no Congresso Nacional precisamos entender o seguinte: os parlamentares do Centrão são vinculados aos ricos, mas suas bases sociais, neste país ainda tão desigual, são entre os pobres. São deputados, em sua grande maioria do Nordeste, do Norte e das pequenas e médias cidades do Sudeste, Sul e Centro Oeste. Sim, o PT tem a maioria dos governadores do Nordeste, mas é pouco expressivo na Câmara Federal, com apenas 20 deputados em um total de 152 deputados; no Norte o PT tem apenas 2 deputados em um total de 78 deputados. Até mesmo os mais barulhentos deputados do Centrão, representantes do agronegócio, por exemplo, não se elegem apenas com os votos dos patrões, dependem do voto dos trabalhadores rurais e moradores das pequenas e médias cidades. Estes mesmos deputados(as) que estão hoje contra Lula foram os mesmos que aprovaram historicamente todos os direitos sociais de nossos governos, que mais recentemente votaram maciçamente pela supressão da principal âncora econômica dos governos anteriores: o teto de gastos. Eles votaram maciçamente no aumento da isenção e redução do imposto de renda, para não contrariarem os seus eleitores. A pressão social, nas ruas e nas redes, fez com que os deputados mediarem os seus interesses de classe com os interesses de seus eleitores. Já o PL, para não se desmascarar de vez como o anti-sistema, teve que votar, a contragosto, contra o sistema.(…) E peça chave na aprovação da isenção do imposto de renda foi o deputado Arthur Lira, ex-presidente da Câmara dos Deputados, candidato ao Senado por Alagoas, que não acatou quase nenhuma emenda da oposição, não aceitou demagogias como o aumento para R$ 10 mil o limite de isenção, e seu parecer previu a votação conjunta da isenção e da tributação dos mais ricos, inviabilizando a demagogia do PL de votar pela isenção e contra o aumento dos impostos. Estas são minhas avaliações para explicar o enorme apoio popular e os “493 votos a zero” na Câmara dos Deputados.

5-O petismo de Contagem tem se colocado contra a polarização política, posição que explica a vitória em primeiro turno da prefeita Marília Campos e porque ela é um nome competitivo para o Senado em Minas Gerais; não somos “neutros”: para nós a disputa não é em torno da agenda da oposição, mas em defesa de um projeto de Brasil: democracia, defesa do Estado Social (direitos sociais e tributação progressiva) e soberania nacional. A adoção da política baseada nos “dois pês”, “Propósito e Pertencimento”, sugerida por Alon Feuerwerker se tornou para mim “um mantra”. Disse ele: “Sem subestimar a economia, tampouco é demais olhar para aspectos mais subjetivos dos mecanismos de produção de opiniões políticas. O capital político dos governos sempre se beneficia de dois pês: propósito e pertencimento. Quando está claro a que veio o governo, e quando ele passa a sensação de querer o bem de todo mundo, e não só de sua turma. Acirrar as contradições e estimular a guerra de todos contra todos pode ser útil para reforçar o poder momentâneo, mas um efeito colateral é produzir sensação de exclusão em áreas que o andamento da economia pode até, eventualmente, estar beneficiando. Por isso se diz que a política tem de andar de mãos dadas com a economia, para que a safra eleitoral não decepcione”. (Poder 360, 17/3/2024). São palavras de enorme sabedoria, que se tornam ainda mais fantásticas nestes tempos de enorme polarização política. Veja a seguir algumas considerações sobre a polarização e despolarização.

a)Com a polarização, com o “chicote na mão”, mesmo pessoas que concordam com nossas posições, como a isenção do imposto de renda, não serão conquistadas para o nosso lado. Nestes tempos de polarização não é fácil aliar “propósito” e “pertencimento”. Está certo Alon Feuerwerker quando diz que “a política tem de andar de mãos dadas com a economia, para que a safra eleitoral não decepcione”. Mas a esquerda, no geral, não realiza este trabalho de “pertencimento” das pessoas que pensam diferente de nós, que são eleitoras de Bolsonaro, mas que, ao estabeleceram pontos de contato conosco em torno de questões convergentes, como a isenção do imposto de renda, cogitam se aproximar do governo Lula. A polarização na forma mais grotesca, o nós contra eles, trata os eleitores de Bolsonaro como um “bloco único”, como “gado”, como se diz, o que impede de abrir diálogo com segmentos mais moderados que votaram em Bolsonaro mas que podem ser ganhos para o voto em uma Frente Democrática; ou seja, a polarização empurra eleitores de centro e da direita moderada para a extrema direita. O governo Lula, corretamente, adota uma postura discreta nos processos contra Bolsonaro e Família, mas grande parte da representação parlamentar, ao invés de realizar uma defesa politizada da democracia, adota uma postura a pior possível, com sentimento de vingança, deboche e ironia. Assim não vai dar certo: atropelar quem pensa diferente da gente na política e querer ganhá-las pela economia. Com “chicote na mão” ninguém será convencido a vir para nosso lado, porque gera “sensação de exclusão em áreas que o andamento da economia pode até, eventualmente, estar beneficiando”. Esse economicismo dificilmente dará certo. Politização significa que o objetivo de todo militante nas redes sociais e nas ruas é ganhar eleitores de Bolsonaro para Lula e nossas candidaturas ao governo do Estado, Senado e para deputados federais e estaduais; senão conseguimos isso nossa prática política é inútil e é apenas uma marcação de posição, uma “zoação” para agradar quem já é “convertido”.

b)Precisamos trazer o Brasil para a agenda política e programática, centrada na defesa da democracia, do Estado Social e da soberania nacional. Recebemos muitas críticas às nossas posições da despolarização, por supostamente pregarmos a “neutralidade política”. Não é isso. O que defendemos é uma disputa forte e contundente contra a direita em torno de nossa agenda política de um projeto para o Brasil. Portanto, o que defendemos é isso: o PT precisa adotar a defesa do “Brasil da diversidade”, deve defender a “cultura, esportes e lazer” de graça e esvaziar a guerra política e cultural que alimenta o bolsonarismo. Precisamos trazer o Brasil para a agenda política e programática, centrada na defesa da democracia, do Estado Social (direitos sociais e justiça tributária) e da soberania nacional.(…) A democracia, a maior conquista da humanidade, como define meu amigo Ivanir Corgosinho, deve ser defendida de forma estadista e grandiosa, deve ser defendida com indignação contra o autoritarismo, e com emoção por vivermos em um regime de liberdades. A democracia não se confunde com atitudes rebaixadas e individualistas, que se explicitam no “sentimento de vingança”; e na base do “deboche” e da “gozação”. A democracia não pode ser transformada em um “caso de polícia” como temos feito atualmente (o “Toc, Toc, Toc, aqui é a Polícia Federal”), esta peça foi criada por uma dissidente do bolsonarismo, como vingança, e não serve à esquerda.(…) Precisamos defender o nosso Estado Social, o mais amplo e robusto dos países em desenvolvimento; só nós, brasileiros, temos SUS, INSS e previdência dos servidores; CLT; educação pública desde a creche até o doutorado; assistência social como política pública; cultura lazer e esportes de graça e outras políticas públicas. E mais: Estado Social distribui renda não somente a partir dos direitos sociais, mas também através de uma tributação progressiva. (…) Devemos lutar também pela soberania nacional, de forma correta como reconhecimento da autodeterminação dos povos, e sem o isolacionismo, queremos uma integração justa e mais igualitária do Brasil no mundo.

c)Precisamos nos diferenciar da extrema direita no conteúdo (projeto de Brasil) e na forma (politização e sem baixarias); quando imitamos a extrema direita nas redes sociais perdemos a essência de ser de esquerda. Penso como André Singer, sociólogo e grande estudioso do petismo, quando a esquerda imita a extrema direita nas redes sociais, falando coisas absurdas, fazendo escracho, lacrando, ela deixa de ser esquerda. Confrontado com a afirmação de que “a direita radical se comunica muito bem”, ele respondeu: “Acho que há uma confusão nessa formulação. Não é que o Bolsonaro se comunica bem. É que a internet é muito favorável, como o rádio foi na época do fascismo histórico, para um tipo de comunicação muito direta e muito altissonante. Porque isso chama muito a atenção. Vou dar o exemplo de novo do Trump, que por ser distante é mais fácil. Ele fala coisas absurdas. E uma parte das coisas que ele fala tem só a função de chamar atenção. Porque chamar atenção é o próprio objetivo. Acontece que a esquerda não pode fazer isso. É contra, digamos, a missão da esquerda. A esquerda quer um passo além do capitalismo e da civilização capitalista. Se você começa a comunicar coisas absurdas, você está jogando tudo para trás, o que a extrema direita faz. É regressivo. Se a esquerda adotar esse tipo de conduta, ela se nega enquanto esquerda. Ela não pode fazer isso. É uma questão de para quê ela existe. Aí o problema não é de comunicação. A extrema direita encontrou um espaço neste mundo porque o capitalismo fez as condições regredirem a um tal ponto que propostas absurdas têm um lugar. Porque, de certa forma, o capitalismo contemporâneo transformou a realidade em uma situação absurda. Então, propostas absurdas têm lugar, mas se a esquerda cede a isso, ela deixa de existir enquanto esquerda”. (BBC Brasil, 18/01/2025).Tem formas de fazer sucesso na comunicação sem ódio, vingança e lacração; as redes sociais do presidente Lula e da prefeita Marília Campos são exemplos disso.

6-Presidente Lula demonstra confiança em seu governo e na sua liderança e afirma que vai ser difícil “derrotar a gente nas eleições”; presidente, agora bem avaliado, tem todas as condições de organizar seu “palanque eleitoral” nos Estados; vitória, em 2026, antes “possível”, se tornou “provável”. O presidente Lula, depois de fazer uma sensacional virada política em seu governo, está alegre, confiante e mais otimista do que nunca. Veja alguns de seus depoimentos recentes: “Estou me preparando para entregar outra vez o melhor governo que esse país já teve. Estou preparando todos os meus adversários […] se preparem para lutar porque nós vamos derrotar vocês outra vez”.(…) “Se eu estiver como estou, serei candidato para ganhar as eleições, porque tenho certeza que nossos possíveis adversários devem estar muito mais preocupados do que eu, porque eles sabem que vai ser difícil derrotar a gente nas eleições”.(…) “Se a gente brincar em serviço, a gente termina dando para os adversários a chance de ganhar que eles não têm hoje. É muito difícil alguém ganhar as eleições de nós em 2026”, avaliou Lula. “O governo vai terminar muito bem. O Brasil está vivendo um momento excepcional”.(…) “Eu não vou implorar para nenhum partido estar comigo, vai estar comigo quem quiser estar comigo. Não sou daqueles que ficam tentando comprar deputado. Vai ficar comigo quem quiser, quem quiser ir para o outro lado que vá, e que tenha sorte porque nós temos certeza de uma coisa: a extrema direita não voltará a governar esse país”. Veja a seguir algumas análises e informações.

a)Pesquisa Quaest mostra Lula muito à frente de seus adversários na intenção de votos para 2026; nossa estratégia deve ser a vitória no primeiro turno. Felipe Nunes, da Quaest, comenta os dados da pesquisa divulgada no dia 09/10/2025: a) A um ano da eleição, Lula mantém liderança em todos os cenários de 1º turno, variando entre 35% e 43%. Bolsonaro (inelegível) aparece como o melhor nome da oposição (26%). Sem ele, Michelle (21%) e Tarcísio (19% ou 18%) aparecem como as alternativas mais bem posicionadas; b) Nas simulações de 2 turno, o cenário é bem parecido com o de set/25. Lula tem entre 41% e 47%; o nome mais competitivo da oposição – Ciro – apareceria com 32% e o menos competitivo – Eduardo Leite – tem 22%. Bolsonaro teria 36% e Tarcísio 33%”. Veja as duas tabelas a seguir, com intenção de votos no primeiro turno (tabela 1) e no segundo turno (tabela 2).

b)A estratégia para 2026 deve ser a vitória de Lula no primeiro turno; isto porque caso se confirme uma única candidatura do campo progressista de Lula e diversas candidaturas de direita e de extrema direita, os adversários irão se unificar no segundo turno e terão chances de nos derrotar. Tudo indica que o quadro de candidaturas em 2026 será muito diferente de 2022. Na eleição de 2022, Lula foi o candidato da esquerda e centro esquerda, ele quase ganhou as eleições no primeiro turno com 48,43% dos votos; mas tivemos diversas candidaturas democráticas e da esquerda mais radical: Simone Tebet (4,16%), Ciro Gomes (3,04%), Soraya Thronicke (0,51%) e outras micro-candidaturas de esquerda com pouquíssimos votos: Léo Péricles, Sofia Manzano, Vera do PSTU, que somaram 0,11% dos votos. Já a extrema direita esteve mais unificada em torno de Bolsonaro, que obteve 43,20% dos votos e Felipe Ávila teve apenas 0,47% dos votos. Veja como mesmo assim os resultados foram muito apertados: Lula cresceu no segundo turno 2,47% e venceu com 50,90% dos votos; Bolsonaro cresceu 5,9% e fechou com 49,10% dos votos.(…) Veja o quadro de candidaturas de 2026: Lula deverá ser o único candidato expressivo do campo progressista; a direita, se sair unificada, a eleição vira plebiscito logo no primeiro turno; se o caminho da direita for de múltiplas candidaturas no primeiro turno, um dos nomes vai liderar a preferência do voto de direita e a tendência de uma grande unificação no segundo turno. As candidaturas de oposição a Lula, se fragmentadas, serão da família Bolsonaro e de governadores do Sudeste, Sul e Centro Oeste, que são vinculados ao “centro bolsonarista”. Ou seja, se em 2022 Lula ampliou muito pouco no segundo turno, mesmo tendo apoios formais ou informais de candidaturas derrotadas de centro e de esquerda; em 2026, a ampliação da votação no segundo turno será ainda mais difícil dado o perfil de direita das candidaturas que não forem ao segundo turno.(…) Por isso mesmo, é preciso potencializar ao máximo a votação de Lula já no primeiro turno, com os votos progressistas, mas já com o apoio de muitos eleitores de centro e da direita democrática, garantindo-lhe a vitória sem a necessidade do segundo turno. Pesquisa recente da Quaest em cinco dos oito cenários pesquisados dão a vitória a Lula no primeiro turno. Veja só: não se trata de arrogância nem superestimação de nossas possibilidades eleitorais; o quadro eleitoral de 2026 exige que nossa estratégia seja a vitória em primeiro turno. A situação só será mais difícil, com indica a pesquisa, se Ciro Gomes repetir novamente a candidatura presidencial, o que ele tem negado. Mesmo com Ciro haverá uma enorme pressão social pelo voto em Lula, para encerrar a eleição no primeiro turno.

c)Mais do que nunca é a Frente Ampla para a eleição da presidência da República e para os governos estaduais que vai derrotar a extrema direita. Existe um consenso bastante amplo na esquerda da necessidade de constituição de uma Frente Ampla para derrotar a extrema direita nas eleições de 2026. O Brasil teve desde a redemocratização apenas dois partidos com projetos nacionais: PT e PSDB até 2014 e PT e o movimento político que liderou o PL posteriormente. Foram estes partidos que encabeçaram as chapas presidenciais em todo o período. Os outros grandes partidos de centro – PSD, PP, União Brasil, MDB, Republicanos – não tem homogeneidade política e ideológica nacional, são mais federações estaduais. Antes do processo de polarização que vivemos atualmente, não havia a clivagem regional tão marcante como atualmente, PT e PSDB eram fortes em todas as regiões, faziam amplas coligações para a presidência da República e para governos de coalizão, o PT principalmente com o MDB, e o PSDB com o PFL. Com a polarização, a partir de 2015, a política no Brasil ganhou uma clivagem regional muito grande, o PT mais forte no Nordeste e Norte e a extrema direita mais forte no Sudeste, no Sul e no Centro Oeste. Mesmo assim, PT e PL continuaram como partidos nacionais, mas os partidos de centro racharam nacionalmente, são mais próximos ao PT e PL nas regiões onde estes dois partidos são mais fortes.(…) Veja só: não é uma tarefa fácil para os partidos de centro lançarem candidaturas à presidência da República ou participarem de coligações formais com PT e PL; a tendência é que em cada Estado o candidato a ser apoiado é o que lidera a clivagem política local. Desta forma não se deve ter ilusão: defendemos a Frente Ampla, mas Lula provavelmente não vai conseguir trazer para a coligação formal nenhum grande partido de centro, o vice será Geraldo Alckmin e a ampliação política será de setores dos partidos e diversos Estados, em particular naqueles onde Lula é mais forte.(…) A esquerda ganha a eleição presidencial se tiver um grande desempenho no Nordeste e também no Norte; com um bom desempenho no Sudeste, em particular em Minas Gerais e no Rio de Janeiro; com redução da frente da direita em São Paulo, especialmente na região metropolitana; e com um bom desempenho também no Rio Grande do Sul. Neste sentido, o apoio de segmentos dos partidos de centro será fundamental no Nordeste e Norte, e serão fundamentais o PSD no Rio de Janeiro, com Eduardo Paes, e em Minas Gerais, com Rodrigo Pacheco (senão virar ministro do STF).

d)Mônica Bergamo: Lula vê candidatura de Tarcísio como fato consumado e única saída para Bolsonaro; isto explicaria o engajamento do Tarcísio contra a MP dos Impostos. Informa a Folha S.Paulo: “Com o naufrágio das propostas de anistia e redução ampla de penas, restaria ao ex-presidente lançar um candidato com chance de vencer; Governador de SP já disse que, se eleito, dá indulto a Bolsonaro em seu primeiro dia na Presidência; o presidente Lula engrossa a numerosa legião de políticos que não acreditam que Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) desistiu de vez de concorrer à Presidência da República em 2026”. A colunista publicou uma coluna, com uma série de “notinhas” onde explica a posição do governo Lula.(…) VICE FAMILIAR: O petista vê a candidatura dele como um fato consumado, e acredita que Michelle Bolsonaro será a vice na chapa. A atuação de Tarcísio para derrubar a MP dos impostos, na quarta (8), reforçou a certeza do presidente e de seus ministros, que agora devem entrar em confronto aberto contra ele.(…) PACOTE: Na análise que faz em conversas com ministros e auxiliares, Lula diz que nada mais resta a Jair Bolsonaro a não ser lançar Tarcísio: a anistia está inviabilizada, o projeto de redução das penas a que foi condenado está perto de naufragar e Donald Trump já dialoga com o governo brasileiro sem mais exigir que o processo contra o ex-presidente seja interrompido.(…) ÚNICA CHANCE: Tarcísio seria, portanto, a única chance de Bolsonaro de se livrar da prisão: o governador já disse que, se eleito, lhe daria o indulto no dia seguinte à posse como presidente.(…) ASSINATURA: Além de ter maior visibilidade e apoio de setores empresariais, Tarcísio seria o único candidato que teria a obrigação de assinar o perdão a Bolsonaro, por dever a ele a candidatura.(…) RAIA PRÓPRIA: Outros nomes, como Ratinho Jr. e Ronaldo Caiado, correm em raia própria e não precisam do aval do ex-presidente para concorrer. Por isso, não se comprometeram até agora com a missão de tirá-lo da prisão. Ministros do governo concordam plenamente com Lula, e enxergam as declarações de Tarcísio negando a candidatura como mera tentativa de sair da linha de tiro e se poupar até a corrida eleitoral.(…) RISCO ALTO: Lula e seus interlocutores acreditam, no entanto, que Tarcísio será derrotado. De acordo com a pesquisa mais recente, divulgada pela Quaest, o presidente venceria o governador de SP no segundo turno caso as eleições fossem hoje. Ele teria 45% dos votos, contra 33% de Tarcísio. Ainda assim, a crença do governo é a de que, por todas as circunstâncias analisadas, Bolsonaro vai correr o risco de lançar a candidatura do governador.(Folha S.Paulo, 08/10/2025).

e)Será um enorme desafio para o presidente Lula montar palanques competitivos nos Estados brasileiros. A Folha S.Paulo fez um balanço detalhado, por Partido, das articulações para os governos estaduais. O jornal afirma: “Enquanto PT e PL concentram suas forças na disputa presidencial e para o Senado, partidos do centrão ganham musculatura nos estados e se movimentam para obter terreno na disputa pelos governos estaduais. Faltando um ano para as eleições, marcadas para 4 de outubro de 2026, partidos como PP, União Brasil e Republicanos caminham para ter um número recorde de candidatos a governador. O cenário é resultado do fortalecimento dessas legendas, que aumentaram suas bancadas no Congresso Nacional, com consequente ampliação das verbas milionárias dos fundos partidário e eleitoral. O União Progressista, federação que uniu o PP e União Brasil, caminha para ter candidaturas aos governos de até 16 estados. Juntos, os dois partidos devem ter um tempo de propaganda robusto e cerca de R$ 1 bilhão do fundo eleitoral. Agora, articulam candidaturas nos estados enquanto tentam emplacar um projeto nacional que unifique a direita”.

A Folha S.Paulo faz um breve diagnóstico das articulações dos partidos aos governos estaduais.(…) O PP, que em 2022 disputou os governos de cinco estados e venceu no Acre e em Roraima, agora tem pré-candidatos em dez unidades da Federação. Entre as novas apostas estão o ex-tucano Eduardo Riedel, governador de Mato Grosso do Sul, além de três vice-governadores que vão assumir em definitivo em abril de 2026 com a renúncia dos titulares para concorrer ao Senado: Celina Leão (DF), Lucas Ribeiro (PB) e Mailza Assis (AC).(…) O União Brasil tem pré-candidaturas em oito estados, incluindo grandes colégios eleitorais como Bahia e Rio de Janeiro. Mas enfrenta embates internos com o PP no Acre, na Paraíba e no Paraná —neste último, o senador Sergio Moro tenta viabilizar sua candidatura ao governo, mas enfrenta resistências.(…) O Republicanos é outra sigla que deve ter um salto no número de candidatos a governador. Originalmente ligada à Igreja Universal, a legenda tem buscado ampliar suas bases nos estados. Em 2022, o partido disputou apenas três estados e venceu em São Paulo, com Tarcísio de Freitas, e no Tocantins, com Wanderlei Barbosa. Agora pode ter candidatura em até nove estados. Dentre eles estão o senador Cleitinho (Minas Gerais), o vice-governador Otaviano Pivetta (Mato Grosso) e o prefeito de Vitória, Lorenzo Pazolini (Espírito Santo). A legenda também negocia a filiação de potenciais candidatos como Alan Rick, no Acre, e Fernando Máximo, em Rondônia.(…) O PL de Jair Bolsonaro enfrenta um cenário mais nebuloso nos estados. O partido disputa a reeleição em Santa Catarina, com Jorginho Mello, e caminha para lançar o deputado Luciano Zucco, no Rio Grande do Sul, e a empresária Maria do Carmo Seffair, no Amazonas. Há pré-candidaturas em outras três localidades: Mato Grosso, Goiás e Rio Grande do Norte. Em Minas Gerais, o deputado federal Nikolas Ferreira avalia concorrer. Enquanto o centrão tenta ganhar terreno, partidos tradicionais de centro como PSD e MDB atuam para manter o protagonismo.(…)

O MDB, que possui três governadores, vai lançar candidaturas em oito estados. “Vamos com uma estratégia pé no chão, de mostrar que o MDB tem um diferencial por ser um partido de entrega, que tem gestão”, afirma o deputado federal Baleia Rossi (SP), presidente nacional do partido. O partido vai apostar em nomes experientes, incluindo o ministro dos Transportes, Renan Filho (Alagoas), e quatro vice-governadores que devem assumir o cargo no próximo ano: Gabriel Souza (Rio Grande do Sul), Hana Grassan (Pará), Daniel Vilela (Goiás) e Ricardo Ferraço (Espírito Santo).(…) O PSD, que chegou a cinco governadores com as filiações de Raquel Lyra (Pernambuco), Eduardo Leite (Rio Grande do Sul) e Laurez Moreira (Tocantins), tem pré-candidaturas em ao menos dez estados. Outra aposta da legenda é o prefeito Eduardo Paes, no Rio de Janeiro.(…) No campo da esquerda, o PT vai disputar a reeleição na Bahia, no Ceará e no Piauí e lançou o secretário da Fazenda, Cadu Xavier, como pré-candidato à sucessão de Fátima Bezerra no Rio Grande do Norte. A legenda também mira uma candidatura competitiva no Rio Grande do Sul, com Edegar Pretto, e avalia lançar nomes em outros seis estados.(…) O PSB terá como prioridade a candidatura de João Campos, em Pernambuco, mas avalia entrar na disputa em São Paulo, com o ministro Márcio França, e no Distrito federal, com Ricardo Capelli.(…) PSDB e PDT seguem em rota de declínio. Os tucanos, que perderam os três governadores eleitos em 2022, terão como principal trunfo uma possível candidatura de Ciro Gomes, cotado para se filiar ao partido no Ceará. A legenda também deve concorrer em Goiás e Rondônia.(…) O PDT, que chegou a lançar dez candidatos em 2022 na esteira da campanha presidencial de Ciro Gomes, deve ter candidatos em três estados. A principal aposta é Juliana Brizola, no Rio Grande do Sul”.(Folha S.Paulo, 05/10/2025)

f)A eleição para o Senado será fundamental, o “progressismo” precisa se unificar em torno de um ou dois candidatos; não existe espaço para a marcação de posição e para a autoconstrução partidária ou de segmentos. Em primeiro lugar é preciso dizer que não é uma tarefa fácil a extrema direita ter a maioria do Senado em 2026. O colunista César Felício, do Valor Econômico, publicou um longo artigo em que afirma que a nacionalização da eleição para o Senado como quer o bolsonarismo é improvável, porque esta eleição é muito vinculada aos governos estaduais. Ele disse que o avanço do bolsonarismo puro-sangue tende a ser temperado pela força dos governadores: “O Senado deve caminhar para a direita em 2026, mas não necessariamente para o bolsonarismo, em que pese o empenho do ex-presidente Jair Bolsonaro em eleger seus três filhos e sua mulher para a Câmara Alta. O foco do bolsonarismo no Senado está bem explicado. Uma maioria bolsonarista no Senado coloca na mesa a arma do impeachment de ministros do Supremo. Essa ameaça poderia levar a uma negociação que reabilite Bolsonaro. As incógnitas ainda são muitas, com 54 cadeiras a se renovar (duas por Estado), mas três fatores freiam a potência da nacionalização da disputa pelo Senado. Dois deles estão profundamente interligados: o interesse de governadores em fim de mandato em disputar uma cadeira e a prioridade que lideranças regionais e o próprio eleitor dão à disputa para os governos estaduais. Estes dois são os fatores mais importantes. Há 15 governadores que não descartam de maneira cabal disputar o Senado e que, entrando em cena, no mínimo, são competitivos. Apenas um, o coronel Marcos Rocha, do União Brasil de Rondônia, pode ser considerado um bolsonarista raiz. Dez estão no campo da direita. Provavelmente apoiarão uma agenda liberal na economia e conservadora nos costumes, mas o compromisso com pautas como impeachment de ministros do Supremo Tribunal Federal é mais duvidoso. Na eleição dupla para o Senado, não há sublegenda. O eleitor vota duas vezes e se elegem os dois mais votados, independentemente do partido. Isso aumenta o risco no momento de se estabelecer a aliança com dois nomes fortes, sobretudo se existir um só adversário forte na outra chapa. O terceiro fator é o peso das emendas parlamentares na disputa, que torna o ar mais rarefeito para nomes novos, sobretudo nos menores colégios eleitorais. Ganham vantagem deputados federais que almejam a cadeira de senador ou senadores que tentam um novo mandato”.(Valor Econômico, 26/06/2023).

Esta avaliação menos aterrorizante não deixa de ser um alívio para a esquerda e o progressismo. Mas os desafios são muitos: a) será preciso uma sólida aliança com o centro não bolsonarista, em todo o País, mas sobretudo nos pequenos estados do Norte e Centro Oeste, onde o PT é fragilíssimo; b) uma boa notícia é que, além de candidaturas fortes no Nordeste e Norte, o PT, nas primeiras pesquisas, aparece de forma competitiva em estados do Sudeste, como em São Paulo, com Fernando Haddad; Benedita da Silva, no Rio de Janeiro; e Marília Campos, em Minas Gerais; c) a eleição no Senado não tem segundo turno e não tem espaço para marcação de posição e autoconstrução partidária por parte da esquerda, em especial do PSOL; será preciso a unificação do progressismo em torno de um ou dois nomes mais competitivos. Nossa estratégia deve ser a mesma utilizada no segundo turno na França para barrar a extrema direita: vamos lançar apenas um ou dois candidatos ao Senado e quem não tiver viabilidade eleitoral não deve se candidatar; d) nos estados, sobretudo do Nordeste, onde temos condições de eleger dois senadores será natural o lançamento de dois candidatos; e) mas a situação é mais complexa naqueles estados, como é o caso de Minas Gerais, onde o mais provável é a eleição de um(a) senador(a); se lançamos somente um candidato deixamos o eleitorado sem alternativa progressista no segundo voto, o que não é bom; mas se lançarmos dois candidatos qual será a prioridade da coligação e, especialmente, do presidente Lula?

g)Câmara Federal: Esquerda – PT, PCdoB, PV, PDT, PSB, PSOL, REDE – só elegeu 125 deputados federais em 2022; para sustentar um governo de esquerda são necessários de 170 a 200 deputados federais. Este é um desafio enorme. A eleição para a Câmara dos Deputados continuará sendo um grande desafio para a esquerda, sobretudo num sistema eleitoral de lista aberta e com as emendas impositivas. Toda vez que a Câmara Federal adota posições que discordamos profundamente, como no caso recente da PEC da Blindagem e da urgência para a anistia para os golpistas, a militância social de esquerda lança como meta a esquerda eleger a maioria dos deputados federais. Não é simples isso; na verdade é quase impossível. O PT, por exemplo, atingiu 86 deputados federais em 2010, mesmo com coligação proporcional; em 2022, mesmo sem coligação e apenas com Federação, foram eleitos apenas 68 deputados federais. Veja só: nos países que elegem os seus parlamentares através das listas partidárias, do voto distrital, ou mesmo do voto distrital misto (voto distrital e lista partidária), como são eleições mais politizadas, o número de votos para o Parlamento fica muito próximo dos votos para o presidente e para o líder que almeja ser primeiro ministro. No sistema proporcional de lista aberta que temos no Brasil, a representação no Parlamento é mais fragmentada e nenhum partido isoladamente alcança nem 20% dos eleitos. Isso também explica a sub-representação das mulheres; na lista fechada, as mulheres são bem posicionadas nas listas, seja em função da legislação ou pela pressão que elas exercem sobre os partidos, e o número de mulheres eleitas é muito grande, acima de 30% a 50%. Na lista aberta, é cada uma para si mesmo. As emendas impositivas milionárias também dificultam a renovação e a mudança mais profunda na correlação de forças entre os partidos, porque como alguém diz: “perder a eleição beira a incompetência” ou então é fruto das dificuldades de se compor chapas competitivas.(…) O PT tem limites para um grande crescimento da bancada federal na Câmara dos Deputados: é um partido muito frágil nos municípios e prefeitos e vereadores são peças fundamentais na eleição de deputados; o PT é fortíssimo no Nordeste, sempre elegeu muitos governadores na região, mas a representação na Câmara dos Deputados não está à altura da força do Partido na região; dos 152 deputados federais da região, o PT tem apenas 20 deputados. No Norte, a situação é ainda pior: o PT sé tem dois deputados federais em um total de 78 deputados.(…) Com todas as dificuldades não acho crível avaliações que podemos, junto com outros partidos de esquerda, ter maioria no Congresso Nacional, saindo dos atuais 125 para 258 deputados federais pelo PT, PCdoB, PV, PDT, PSB, PSOL, REDE. No caso do PT considero que será um avanço sair dos 68 para 80 deputados federais. Claro que um resultado dos sonhos seria eleger 90 deputados federais, sobretudo com a superação de dificuldades que temos, sobretudo no Nordeste e no Norte, e com o lançamento de nomes fortes da velha guarda, a exemplo de José Dirceu e Edinho Silva, em São Paulo; e de lideranças mais jovens de todo o País. A ver.

h)Fernando Abrucio prevê que “reinvenção da Câmara dos Deputados” vai virar tema eleitoral. O cientista político Fernando Abrucio avalia que que haverá, em 2026, um grande movimento de “reinvenção da Câmara dos Deputados”; “o que era antes um sentimento de descrédito e impotência se tornou um vendaval de revolta. A pressão institucional e social vai continuar nesta toada”. Veja passagens de um artigo de autoria de Fernando Abrucio: “A Câmara Federal passou por um processo de dez anos de grande fortalecimento e entra, agora, numa crise sem paralelo recente. Não é possível antecipar se haverá uma verdadeira mudança no padrão vigente de atuação da maioria dos deputados, norteados pela autoproteção e ampliação dos seus próprios direitos. Mas o casamento do bolsonarismo com a maior parte do Centrão, e por tabela da agenda da PEC da Blindagem com a proposta de anistia dos golpistas, causou uma rachadura enorme no modelo criado por Eduardo Cunha e aperfeiçoado especialmente por Arthur Lira. A pressão pela reinvenção da Casa vai crescer e tende a se tornar ainda mais forte nas eleições de 2026.(…) O modo oligárquico não vai simplesmente acabar, contudo, seu modo Eduardo Cunha, descolado em demasia do controle social, vai ser colocado em xeque. A pressão institucional e social cresceu e vai continuar nesta toada. O Senado, o STF e o Executivo Federal vão procurar se diferenciar da Câmara, realçando seus defeitos. Isso enfraquecerá o seu grupo dominante e colocará em questão a aliança entre parcela do Centrão e o bolsonarismo, vistos agora como farinhas do mesmo saco.

(…) Mais importante, a reinvenção da Câmara, para que ela se torne efetivamente a Casa do Povo, pode se tornar um dos grandes temas das eleições de 2026. Nem todos os parlamentares serão afetados, mas uma parte considerável poderá não voltar em 2027 porque o excesso de poder está os afastando dos eleitores, como estão mostrando as redes sociais e as ruas, que não esquecerão a infame PEC da Blindagem. O discurso antissistema vai crescer, mas o bolsonarismo perderá muito de seu apoio nesse grupo. Neste cenário, a questão que as lideranças sociais deveriam pensar é como renovar a representação parlamentar fortalecendo a democracia. Esse foi o tema que inspirou os que construíram a redemocratização e deveria urgentemente ser retomado”.(Valor Econômico, 26/09/2025)

José Prata Araujo é economista.

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