topo_M_Jose_prata_Ivanir_Alves_Corgozinho_n

SEÇÕES

Helena Chagas: Reocupação democrática passa por conquista das redes, diz Helena Chagas

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on print

Os Divergentes, 11/01/2023

Os atos golpistas de domingo jogaram a popularidade digital de Jair Bolsonaro no pior nível dos últimos quatro anos — tem 21 pontos numa escala de 100, na qual chegou a 88 em outubro passado, segundo a Quaest. Num contexto de forte reação do poder público contra terroristas, financiadores e mandantes — como parece que vai ocorrer — e de inédita união das maioria esmagadora das forças políticas em torno da democracia, encarnada na figura do presidente Lula, o mau momento de Bolsonaro deve ser explorado. Se antes, porém, dar a volta por cima num cenário digital desfavorável, que o presidente não conseguira reverter, era uma questão de disputa política, agora passa a ser de sobrevivência. A ocupação do território no qual se articulam os movimentos golpistas passa a ser requisito para preservação da própria democracia.

Ao menos nas redes, Lula não desfrutou da tradicional lua-de-mel dos governantes recém-eleitos. Enquanto as bolhas democráticas comemoravam e trocavam vídeos sobre a festa da posse, o bolsonarismo articulava, nas mesmas redes, os atos terroristas de domingo. As convocações para a “festa da Selma” (uma alusão ao grito militar de Selva!), e hashtags importadas da direita americana como #brazilianspring, não passaram despercebidas, mas parecem ter sido subestimadas nos monitoramentos governistas.

Bolsonaro se desgastou e o golpe deu errado. Mas a máquina de fazer mentiras do bolsonarismo está de pé, aparentemente intacta e atacando. Nas horas subsequentes à prisão dos manés golpistas que depredaram os Três Poderes, propagaram narrativas mentirosas como a de que havia morrido uma manifestante idosa presa — usaram a identidade de uma senhora falecida há anos, mas a lorota se propagou, assim como, na semana passada, muita gente acreditou que Lula não havia subido a rampa e que o país estava sendo governado pelo general Heleno. Mentiras de que os golpistas detidos estavam sendo tratados em condições desumanas também tomaram as redes e serviram de pretexto para manifestações indignadas de políticos da extrema direita, como o general-senador Hamilton Mourão.

E é desse jeito que as coisas andam, apesar das duras medidas tomadas pelos três poderes vilipendiados: a máquina bolsonarista opera a todo o vapor e ainda controla um número significativo de corações e mentes. Basta olhar uma outra pesquisa divulgada nesse pós-terror: levantamento Atlas divulgado nesta terça-feira mostra que 75,8% discordam da ação dos golpistas e 53% consideram injustificada a invasão dos prédios dos poderes da República. Isso quer dizer, porém, que temos 18,4% das pessoas que dizem concordar com os golpistas e, pior, 27,5% que vêem a invasão como “justificada parcialmente” e 10,5% como “completamente justificada”.

Diante da barbárie ocorrida, da ampla cobertura da mídia e da forte reação das instituições, é preocupante constatar que o golpismo tem lá seu núcleo duro de cerca de 20% da população. E que, mais espantoso ainda, Bolsonaro não é considerado responsável pelos ataques por 42% das pessoas.
A batalha foi vencida, mas a guerra está longe de ser ganha. No território digital, além de aprimorar os serviços de monitoramento, é urgente traçar uma estratégia de mobilização total, que deve funcionar de forma transversal em todo o governo, e não apenas na área da comunicação.

Do lado certo da história, o presidente Lula tem uma narrativa legítima e consistente a ser trabalhada para dialogar com boa parte daqueles 49% que votaram em Bolsonaro mas prezam a democracia — e o caminho das redes, sempre usado pelo bolsonarismo, pode ser o mais efetivo para se chegar até eles. Depois do Capitólio tupiniquim, passou a ser possível isolar os golpistas da extrema-direita em seu próprio território.

Helena Chagas é jornalista.

Outras notícias