Três em cada quatro moradores de Contagem aprovam a atual gestão da prefeita Marília Campos aqui, em Contagem. É o que mostra a pesquisa DataTempo divulgada no último dia 02 de outubro, primeira deste instituto a sondar os possíveis cenários da eleição municipal prevista para ano que vem. Conforme o levantamento, 73,8% dos entrevistados aprovam o governo da petista, ao passo que 23,5% desaprovam e apenas 2,8% não sabem ou não responderam(1). Acesse aqui a integra da pesquisa.
Este resultado não é para qualquer um. Numa lista de 10 capitais pesquisadas pelo Instituto Paraná entre março e junho deste ano, o prefeito de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), aparece como o melhor avaliado do país, com 68% de aprovação(2). Na mesma lista, nosso vizinho, Fuad Noman (PSD), prefeito de Belo Horizonte, é o sexto na fila dos bem avaliados, com 57,1% de opiniões favoráveis — taxa que cai para 56,8%, 17 pontos percentuais abaixo da aprovação de Marília, em sondagem divulgada há algumas semanas, também pelo DataTempo (3).
Em Contagem, a prefeita supera, inclusive, o presidente Lula e o governador Romeu Zema (Novo) que registram, respectivamente, 52,8% e 63,4% de aprovação.
Outro aspecto importante evidenciado por esta pesquisa é que a aprovação de nossa prefeita não tem desequilíbrios importantes entre os diferentes segmentos da população analisados pelo instituto. Como exemplos, temos que a aprovação da prefeita chega a 73,2% entre as mulheres e a 74,4% entre os homens. No recorte por faixa etária, entre as pessoas com 60 anos ou mais, a aprovação de Marília é de 78% – índice praticamente igual ao observado entre os mais jovens (de 16 a 24 anos): 77,4%. No critério de faixa de renda, a avaliação positiva também é muito semelhante entre os grupos: fica em 73,8% entre os mais pobres (até 2 Salários Mínimos) e em 73,6% entre os mais abonados (renda acima de 5 SM).
No caso da aferição conforme a escolaridade, a aprovação de Marília entre os menos escolarizados (até o ensino fundamental) é de 76,1%, caindo um pouco (vai para 73,4%) entre os que declaram possuir curso superior, completo ou incompleto. Finalmente, no recorte por religião, a avaliação positiva do governo Marília chega a 77,6% entre os católicos e a 70,6% entre os evangélicos, grupamento mais receptivo à narrativa conservadora de direita em torno das chamadas “questões morais”.
A aprovação de Marília nas regionais pode ser vista na tabela abaixo:
Como se vê, os percentuais são muito homogêneos e, na atualidade, não há um segmento que desequilibre a balança seja por amar demais a prefeita, seja por rejeitá-la vigorosamente. Os números demonstram a consolidação de uma opinião favorável muito disseminada entre os moradores na cidade. Os que a desaprovam são, cada vez mais, uma minoria ideológica que se move por razões de consciência e convicção, e que não mudarão de opinião, não importa o que governo faça.
As lições de estatística recomendam que não se dê aos resultados por segmentos a mesma credibilidade que se dá aos valores relativos ao conjunto da amostra. Isso porque nos cruzamentos por recortes da população, a apuração se dá sobre uma amostragem menor, correspondente ao segmento a ser observado e essa redução impacta negativamente a margem de erro, aumentando-a. Em alguns casos, esse acréscimo pode ser de vários pontos percentuais, como ocorre no recorte por territórios, onde chega a mais de 10 pontos.
Ainda assim, essa estratificação pode nos dar algumas pistas importantes. Uma delas, que salta aos olhos, é que na maioria dos casos observados, a aprovação de Marília está bem alinhada com a média geral de 73,8%. Isso ocorre inclusive entre os evangélicos, onde a aprovação é de 70,6%, apenas três pontos abaixo da média e ligeiramente fora da margem de erro.
Entre as discrepâncias, destaco a regional Ressaca, onde a aprovação é positiva, mas sensivelmente abaixo da média (66,7%). A Ressaca, entretanto, é um reduto eleitoral onde historicamente somos minoritários e onde, por razões, compreensíveis, os moradores olham para nossa administração com um olhar mais severo. Nessa realidade, ter alcançado uma avaliação positiva num percentual acima de 65% naquela região, é uma vitória que deve ser efusivamente comemorada.
Por outro lado, na regional Nacional, outro reduto onde fomos minoritários em eleições passadas, a aprovação da prefeita chega a 79,3% – seis pontos percentuais acima da media e bem acima da margem de erro.
Estas constatações são importantes para ajudar a afastar certos temores – resilientes, apesar das reiteradas demonstrações de que são infundados.
Um deles é o de que uma eventual candidatura de Marília à reeleição esteja ameaçada por um eleitorado “ideologicamente de direita” representado, especialmente, pelos evangélicos.
Este argumento encontrou reforço na bateria de perguntas da pesquisa DataTempo em questão, sobre o perfil ideológico dos entrevistados(4). De acordo com o instituto, 33,8% dos respondentes em Contagem se definem como politicamente mais alinhados com a direita: seriam 4,4% de centro-direita, 24,2% de direita e 5,2% de extrema direita. Em contrapartida, apenas 19,7% se classificam como de esquerda: 3,4% seriam de centro-esquerda, 14,8% de esquerda e 1,5% de extrema esquerda. Teríamos ainda 10,7% de eleitores do centro político, e 35,8% não responderam ou não souberam como se posicionar sobre este quesito.
Em primeiro lugar, é necessário dizer que considero aferições deste tipo uma inutilidade e até um desserviço pois não ajudam a compreender a consciência política das pessoas comuns. Quando me refiro às pessoas comuns, penso naquelas que, diferente de mim, não possuem convicções partidárias e ideológicas assentadas e que são a maioria da população. Essas pessoas, no seu dia a dia, não consideram a si próprias a partir desse parâmetro; com frequência apoiam, simultaneamente, tanto proposições de esquerda quanto de direta, ou de centro e, ademais, avaliam o Poder Público com base em critérios pragmáticos relativos à existência, facilidade de acesso e qualidade dos serviços.
Nesse sentido, repetidos levantamentos têm demonstrado que o povo brasileiro se inclina para um perfil mais conservador, em especial, nas chamadas pautas de costumes ou morais. Nos casos, por exemplo, da legalização do aborto (5) e da descriminalização do uso das drogas (6), a maioria tende a votar contra. Ainda assim, esses mesmos levantamentos registram que a maioria é a favor das políticas de cotas para negros nas universidades(7), do casamento entre pessoas do mesmo sexo (8), são contra a privatização das estatais (8) e, principalmente, apoiam decididamente a ação no Estado no combate à pobreza e na redução das desigualdades sociais (10) – bandeiras mais caracteristicamente de esquerda.
Outro elemento importante a ser considerado é que a adesão das pessoas a um determinado espectro temático acompanha as flutuações da vida real. A autodeclaração “de direita” viveu um boom durante o governo Bolsonaro e ainda se mantém elevada tanto porque se trata de um fenômeno recente, quanto em razão do esforço deliberado e visível na mídia tradicional e nas redes sociais, para mater o bolsonarismo como uma força competitiva nas próximas eleições.
Para se ter ideia, em 2018, só 9% dos brasileiros se declaravam totalmente de direita, de acordo com a pesquisa de opinião pública “A Cara da Democracia”, realizada pelo Instituto da Democracia (IDDC-INCT). Esse número dobrou no ano seguinte e, em setembro do ano passado, alcançou 24%, no maior patamar em cinco anos. Mas, na edição mais recente da pesquisa, que foi a campo em agosto último, com Bolsonaro já inelegível e o governo Lula apresentando bons resultados, este índice recuou para 22% – uma queda de dois pontos percentuais e ainda dentro da margem de erro, mas, que pode vir a sinalizar para um refluxo da maré. Tudo vai depender dos resultados eleitorais que este campo vier a alcançar(11).
Assim, na atualidade, a definição do que é ser de direita ou de esquerda tornou-se um exercício muito complexo e o simplismo de aferições como esta, do DataTempo, não ajuda a esclarecer.
Finalmente, uma questão: se apenas 19,7% dos entrevistados se classificam como de esquerda em Contagem, como se explica que 32,2% declarem preferência pelo PT no município?
Ou seja, qualquer debate baseado nesses números é mera perda de tempo. Eles não justificam o temor de uma revanche do campo conservador que viria “com tudo” ano que vem para superar a pequena margem de votos que Marília obteve na eleição passada.
Que eles “virão com tudo”, disso não temos a menor dúvida. Entretanto, o que a realidade mostra e a pesquisa do DataTempo corrobora, é que este campo tende a permanecer minoritário e que as chances de virarem a mesa são pequenas.
Que diz a pesquisa?(12)
1) Numa lista de possíveis candidatos na qual entram 3 ex-prefeitos da cidade, Marília tem 51,9% das preferências, percentual que equivale a 62,5% dos votos válidos (13);
2) Quando a lista é reduzida ao confronto com apenas dois dos candidatos mais viáveis da extrema direita, Felipe Saliba e Junio Amaral, as declarações de voto em Marília saltam desses 51,9% para 64,1%, ou 79,62% dos votos válidos – percentual superior aos 73% que aprovam sua gestão!
3) 52% dos entrevistados afirmam que, com certeza, votarão em Marília se ela for candidata. Já 20% dizem que podem votar e 24,9% juram que não votam nela de jeito nenhum. O segundo candidato mais competitivo, Ademir Lucas, tem um eleitorado cativo de 15,6%, uns 20% de “quem sabe, pode ser” e uma rejeição de 49,2%. Dois outros ex-prefeitos, Carlim Moura e Alexis de Freitas, também aparecem com rejeições desencorajadoras (respectivamente, 59% e 63%).
Rezam as boas cartilhas de ciência política e sociologia eleitoral que gestores precisam ser bem avaliados pela população para serem eleitoralmente competitivos. O balanço dos resultados das eleições no Brasil, nos estados e nos municípios demonstra que se trata de uma tese pertinente. Como regra, governos bem avaliados conseguem se eleger e/ou elegerem um sucessor.
Assim sendo, sem correr no erro de subestimar a oposição. o que a pesquisa DataTempo nos diz é que a atual prefeita, a petista Marília Campos, é uma forte candidata à reeleição ainda no primeiro turno da eleição do ano que vem – especialmente se seus principais adversários forem representantes da suposta “maioria” contagense de direita. É sem dúvida que a alta aprovação popular do governo Marília torna a Marília, eventual candidata à reeleição, uma líder “natural” da corrida eleitoral.
Esta conclusão, entretanto, é demasiado simplista e obvia para nos contentarmos com ela.
A disputa – que já está em andamento na cidade – não diz respeito à alternância de poder, natural e até desejável nas democracias. Longe disso, trata-se de um embate entre concepções de mundo e de cidade irreconciliáveis já que opõe, de um lado, um programa desenvolvimentista, inclusivo e fundamentado na ideia de um futuro comum e bom para todos e, de outro, um projeto de cidade para quem pode pagar.
É mais que sintomático, neste sentido, que uma das principais campanhas movidas pela extrema direita desde o início do atual governo tenha sido contra os eventos em praça pública que promovemos. Shows como os de Alceu Valença, Elba Ramalho, Zé Ramalho, Frejat, Aline Barros, Hungria e Djonga, para ficarmos numa lista curta, foram frontalmente atacados a pretexto de estarmos desperdiçando dinheiro com cachês milhardários em atividades supérfluas, em vez de investirmos em serviços essenciais, como Saúde e Educação.
Naturalmente, apenas um tolo acreditaria nessa balela. A experiência mostra que, quando chegam ao governo, o que esses críticos menos fazem é investir em Saúde ou Educação. Basta checar a folha de investimentos do governador Romeu Zema.
Esta contraposição entre gastos supostamente prioritários e gastos supostamente supérfluos em Contagem, nada mais é que uma tentativa demagógica de mobilizar a opinião pública a partir do senso comum e de preconceitos. Na vida real, como todos sabem, qualquer governo deve investir tanto em Saúde quanto em Educação, bem como em Esporte, Cultura e Lazer. São áreas que se complementam e se reforçam e são obrigações constitucionais.
O problema é que nossas elites privilegiadas, que nem por intervenção divina conseguem superar a mentalidade dos tempos de “Casa Grande e Senzala”, consideram insuportável a ideia de que um governo possa oferecer diversão gratuita para o povo – a menos, é claro, que se trate de uma jogada eleitoral. “Pão e circo”, como desdenharam nas redes sociais.
Nasce dai toda a visceral antipatia de determinados setores ao governo Marília. Sem beija mão, sem salamaleques, sem reconhecer privilégios ou conceder deferências, o governo Marília gasta sim, e gasta muito, com os pobres e com os que, em outras circunstâncias, estariam condenados ao azar. Busca, na destinação deste gasto, oferecer do bom e do melhor, desde o fundamental e indispensável, até o supérfluo, com a convicção de que “a gente não quer só comida”.
Este projeto vem cativando mais e mais cidadãos e cidadãs e adentra, poderosamente, nos redutos da direita como vimos nos casos dos evengélicos e das regionais Ressaca e Nacional. Seu maior risco não é o de, eventualmente, perder a eleição. É o de se tornar uma unanimidade.
Ivanir Corgosinho é sociólogo.
NOTA
(1) O TEMPO, 02/10/2013. DATATEMPO: Gestão Marília Campos é aprovada por 73,8% dos eleitores de Contagem. https://www.otempo.com.br/politica/datatempo-gestao-marilia-campos-e-aprovada-por-73-8-dos-eleitores-de-contagem-1.3244418
(2) CARTALCAPITAL, 07/06/2023. Os índices de aprovação dos prefeitos das 10 maiores capitais, segundo pesquisa – https://www.cartacapital.com.br/cartaexpressa/os-indices-de-aprovacao-dos-prefeitos-das-10-maiores-capitais-segundo-pesquisa
(3) O TEMPO, 11/09/2023. DATATEMPO: maioria da população de BH aprova gestão de Fuad Noman – https://www.otempo.com.br/politica/datatempo-maioria-da-populacao-de-bh-aprova-gestao-de-fuad-noman-1.3230129
(4) JORNAL O TEMPO, 05/20/2023. DATATEMPO: Maior parte em Contagem diz ser eleitor do campo da direita – https://www.otempo.com.br/politica/datatempo-maior-parte-em-contagem-diz-ser-eleitor-do-campo-da-direita-1.3247234
(5) O GLOBO, 13/09/2022. Ipec: 70% dos brasileiros dizem ser contra a legalização do aborto. https://g1.globo.com/politica/noticia/2022/09/13/ipec-70percent-dos-brasileiros-dizem-ser-contra-a-legalizacao-do-aborto.ghtml
(6) PODER 360, 23/09/2023. 72% são contra o uso recreativo da maconha, diz Datafolha. https://www.poder360.com.br/pesquisas/72-sao-contra-o-uso-recreativo-da-maconha-diz-datafolha
(7) FOLHA DE SÃO PAULO, 12/06/2022. Metade é a favor de cotas raciais em universidades; 34% são contra, diz Datafolha. https://www1.folha.uol.com.br/educacao/2022/06/maioria-e-a-favor-de-cotas-raciais-em-universidades-34-sao-contra-diz-datafolha.shtml
(8) PODER 360, 12/06/2023. Maioria é a favor do casamento homoafetivo no Brasil, diz pesquisa. https://www.poder360.com.br/pesquisas/maioria-e-a-favor-do-casamento-homoafetivo-no-brasil-diz-pesquisa/
(9) PODER 360, 09/04/023. 45% dos brasileiros são contra privatizações, diz Datafolha. https://www.poder360.com.br/pesquisas/38-dos-brasileiros-sao-a-favor-de-privatizacoes-diz-datafolha
(10) CAVALCANTI, Pedro. A questão da desigualdade no Brasil:como estamos, como a população pensa e o que precamos fazer. IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, Texto para discussãom 2593.Brasília, setembro de 2020, Disponível em https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/10263/1/td_2593.pdf
(11) O GLOBO, 12/09/2023. Duas vezes mais brasileiros se dizem de direita do que de esquerda, indica pesquisa; confira os números. https://oglobo.globo.com/blogs/pulso/post/2023/09/duas-vezes-mais-brasileiros-se-dizem-de-direita-do-que-de-esquerda-indica-pesquisa-confira-os-numeros.ghtml
(12) JORNAL O TEMPO, 02/10/2023. DATATEMPO: Marília Campos lidera com folga disputa pela Prefeitura de Contagem – https://www.otempo.com.br/politica/datatempo-marilia-campos-lidera-com-folga-disputa-pela-prefeitura-de-contagem-1.3244370
(13) Desconsiderando os entrevistados que afirmam não ter preferência ou não responderam e que equivaleriam ao que votam nulo ou em branco.