topo_M_Jose_prata_Ivanir_Alves_Corgozinho_n

SEÇÕES

Ivanir Corgosinho: Lula e o paradoxo das pesquisas

Share on facebook
Share on twitter
Share on linkedin
Share on whatsapp
Share on telegram
Share on print

As pesquisas de opinião que, nos últimos meses, registraram uma dramática queda na aprovação do governo Lula oferecem um retrato intrigante do cenário político brasileiro a pouco mais de um ano das eleições de 2026. Ocorre que esses levantamentos combinam a avaliação da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva com projeções de intenção de voto, revelando um paradoxo: apesar da crise de popularidade, Lula é favorito na corrida presidencial de 2026. É o que acontece, por exemplo, nas apurações realizadas pelas agências Genial/Quaest, AtlasIntel, CNT/MDA e Paraná Pesquisas.

Neste artigo, usarei como exemplo a pesquisa Genial/Quaest, divulgada em 2 e 3 de abril de 2025. Os dados revelam uma desaprovação recorde de 56%, ante 41% de aprovação — um salto significativo desde julho de 2024, quando a desaprovação estava em 43%. Entre os jovens, na faixa entre 16 e 34 anos, a reprovação subiu 12 pontos entre janeiro e março, chegando a 64%! Esse resultado reflete uma insatisfação crescente, atribuída por analistas a fatores como a alta dos preços dos alimentos e a percepção de estagnação na agenda governamental. 

Todavia, a pesquisa também mostra que, apesar do cenário adverso, Lula lidera contra todos os adversários testados. Ele venceria Jair Bolsonaro (44% a 40%), Tarcísio de Freitas (43% a 36%), Romeu Zema (43% a 31%) e Ronaldo Caiado (44% a 30%). 

Esses números sugerem que a desaprovação do governo não se converte automaticamente em rejeição ao líder petista. O que explica esse paradoxo?

Acredito que, em primeiro lugar, está a resiliência de Lula como figura política. A memória de seus governos anteriores, melhor avaliados que o atual, sustenta sua base, especialmente no Nordeste.

Em segundo lugar, com Bolsonaro inelegível até 2030, a oposição ainda não conseguiu unificar uma alternativa suficientemente atraente. Tanto é que, dentre os que reprovam Lula, 14% a 18%, votariam nele. Nomes como Tarcísio e Zema carecem da capilaridade necessária para desafiar o petista em um segundo turno. 

Outra evidência está nos 62% dos entrevistados que acham que Lula não deveria se candidatar em 2026. Somado à desaprovação de 56%, esse número aponta para um claro desejo de mudança. De fato, 81% afirmam que o governo deveria “fazer tudo diferente” nos dois anos que lhe restam.

Nesse quadro, o favoritismo de Lula sugere que, ou a maioria não conhece alternativas, ou considera as opções piores. Não podemos esquecer que muitos dos que votaram em Lula em 2022 o fizeram para barrar Bolsonaro, num voto pragmático.

Estamos, portanto, num jogo delicado. O cenário segue binário, com Lula e o PT de um lado e a direita (Bolsonaro ou seus herdeiros) do outro, mas com ligeira vantagem para o campo governista — ao que tudo indica, devido ao prestígio de Lula.

Um dado preocupante, porém, sinaliza riscos a esse prestígio. Pela primeira vez, a rejeição ao presidente parece enraizada na desconfiança: segundo a Genial/Quaest, 47% dos entrevistados afirmam que ele não é bem-intencionado, e 71% dizem que ele não cumpre o que promete. Trata-se de um ataque ao núcleo da imagem de Lula como líder popular e genuíno.

Escrevi em “O Brasil olha para Contagem”: “(…) a gestão eficaz de serviços públicos não é a única coisa que importa para as pessoas. Parte significativa da avaliação de um governo é ditada pelo juízo que a população faz da liderança. Importa o grau em que as pessoas veem a si mesmas e seus valores representados naqueles que governam, se existem evidências de corrupção ou não, se os processos de tomada de decisão são democráticos, etc. Trata-se, enfim, do problema da confiança na liderança e seus métodos e no processo de governo.

Assim, embora esse ataque, por ora, não o derrube eleitoralmente, é uma evidência de que a crise não é apenas de desempenho, atingindo a percepção pessoal. Seu prestígio — base de sua resiliência — está sob ameaça.

O governo precisa agir rápido para restaurar a fé em suas intenções e entregas, ou corre o risco de ver esse capital político evaporar se a oposição encontrar um nome forte. Nesse caso, a questão central é convencer aqueles 62% que Lula ainda é necessário.

Ivanir Corgosinho é sociológo

Outras notícias