Tivemos a presença em nossa Cidade da musa das políticas urbanas, Ermínia Maricato, que se emocionou muito na posse do “conselho de vilas, favelas e periferias”, e disse que o petismo de Contagem é um exemplo para o Brasil. Ela nos pediu que esta experiência fosse transmitida a toda a esquerda brasileira e ao governo Lula. Aproveitamos a presença do Edinho Silva em nossa Cidade, no lançamento de sua candidatura a presidente do PT, e atendemos aos apelos da Ermínia. Segue o abecedário de nossas experiências para as análises do PT Nacional e de todas as correntes progressistas do Brasil.
a)Nosso diagnóstico é o feito pelo sociólogo José Luís Fiori. Ele afirma que a melhor explicação para o extremismo de direita é que o final dos ciclos de globalização multiplicam as revoltas sociais e as reações nacionalistas: “A história contemporânea sugere que Karl Polanyi tenha razão: os grandes avanços da internacionalização capitalista promovem grandes saltos econômicos e tecnológicos, mas, ao mesmo tempo, aumentam geometricamente as desigualdades na repartição da riqueza entre as nações e as classes sociais. E como consequência, no final dos grandes ‘ciclos de globalização’, aumenta e generaliza-se a insatisfação das grandes massas, e multiplicam-se as revoltas sociais e reações nacionalistas, ao redor do mundo”. O que acontece no Brasil não é um fato isolado, é o mesmo que ocorre no mundo.
b)Nenhuma corrente de opinião (socialistas, socialdemocratas, centro, direita, extrema direita) tem apontado saídas para a crise. Vivemos, portanto, uma época histórica marcada pela avaliação negativa da maioria dos governantes pelo mundo (presidentes e primeiro ministros); governos bem avaliados, dentre as grandes nações, tem-se somente no México e India; na maioria dos países, os governos estão muito mal avaliados, com a desaprovação superando a aprovação: Estados Unidos, Itália, Espanha, Canadá, Japão, Alemanha, França, Coreia do Sul; e, na América Latina, a maioria dos governos de esquerda e de direita estão mal avaliados. A reeleição de Lula é “possível” porque o presidente é uma grande liderança e tem avaliação superior a 40% e para se tornar “provável” temos que lutar muito para recuperar a aprovação acima de 50%, de preferência de 55% a 60%. Mas precisamos ser realistas e não voltaremos mais ao Lula 2, que tinha aprovação de 80%.
c) Como resultado da profunda crise da globalização neoliberal, o sociólogo e ex-vice-presidente da Bolívia, Álvaro Linera, prevê hegemonias curtas. A análise foi feita por Linera para a América Latina, vale para o mundo: “Minha hipótese é que, nesses tempos liminares, teremos um progressismo de curta duração e um direitismo de curta duração. Hegemonias curtas, tanto à esquerda quanto à direita. Até que, em algum momento, o destino se realinhe para um lado ou para o outro e se inicie um longo ciclo de 20 ou 30 anos”. As previsões de Linera vem se confirmando, como recentemente nos Estados Unidos, e poucos governos tem conseguido a reeleição. Portanto, os riscos que corremos no Brasil da volta da extrema direita não podem ser subestimados. Portanto, reeleger Lula será o Brasil se colocar na contramão do mundo, faremos história ao parar a extrema direita em nosso país.
d) José Luís Fiori: É a “esperança de futuro” que abrirá portas e janelas de novos tempos. José Luís Fiori iluminou a nossa militância política em Contagem e é uma das nossas principais referências teóricas do petismo local, quando fez um diagnóstico do “tempo histórico” da extrema direita, que é o fim das épocas da globalização neoliberal, que deixam um rastro de desigualdade, desesperança, guerras, conflitos políticos e religiosos, ódio e ressentimentos. No artigo “Revolta e esperança”, José Luís Fiori diz: “Vivemos uma verdadeira guerra entre duas visões da humanidade, absolutamente antagônicas e, ao mesmo tempo, no caso brasileiro, entre duas concepções opostas – de estado, de sociedade, de economia, de sustentabilidade, de cultura, de civilização e de futuro. Neste momento é fundamental que os progressistas apresentem à sociedade brasileira um projeto de futuro que seja inovador e que seja diferenciado, combinando uma verdadeira estratégia de guerra contra a desigualdade, com um projeto simultâneo de construção de uma nação, popular e democrática, e de uma grande potência pacificadora capaz de influenciar as gigantescas transformações mundiais que estão em pleno curso. É fundamental neste momento conscientizar e conquistar o apoio de todos os brasileiros para um novo projeto de futuro solidário e compartilhado por todos, capaz de vencer a distopia teológica e ultraliberal da salvação de cada um por si, mesmo que seja contra todos os demais, com a benção de Deus e a mão invisível do mercado. Nesta hora, mais do que nunca, é preciso inovar e apresentar com coragem e absoluta clareza, ideias e projetos, mas sobretudo, um “sonho de futuro” capaz de sintonizar com a imaginação e a esperança de todos os brasileiros”.(Outras Palavras, 13/10/2022).
Marília representa um pouco do conteúdo destas belas palavras; ela é “uma guerreira da esperança”. Temos orgulho de dizer que em Contagem estamos à altura dos sonhos do nosso mestre José Luís Fiori, que não conheço pessoalmente. Temos “um sonho de futuro” sintonizado com a imaginação e a esperança de quase todos os contagenses. Numa das pesquisas que circulou em nossa cidade, nos últimos meses, podemos ver os números impressionantes da aprovação popular de Marília, segundo os diversos critérios da amostra. Veja só: a) Marília tem 81% de aprovação, sendo 81% entre mulheres e 81% entre os homens; b) por idade, varia de 79% a 83%; c) por escolaridade, varia de 78% a 84%; d) por renda, varia de 79% a 86%; e) por religião, Marília tem 78% de aprovação entre os evangélicos e 83% entre os católicos; por ideologia, Marília tem 79% de aprovação de pessoas que se definem como de “direita”, 82% nas pessoas de “centro”, e 89% nas pessoas de “esquerda”.
e)Trabalhar pela esperança, como propõe Pepe Mujica. Pepe Mujica, na campanha eleitoral do Uruguai, agora em novembro de 2024, quando o grande estadista, em discurso quase de despedida, defendeu uma visão muito parecida com a nossa de Contagem. Disse Mujica: “Porque é preciso um governo que abra o coração e a cabeça com todo o país. Não é poético o que eu digo. Alguém tem que dizer. Um velho. Não ao ódio! Não à confrontação! É preciso trabalhar pela esperança! Até sempre…lhes dou meu coração. Tenho que agradecer à vida! Porque quando esses braços se forem haverá milhares de braços. Obrigado por existir. Até sempre!”. Viva Pepe Mujica!
f)Cinco argumentos contra a polarização: a) a polarização, o nós contra eles, trata os eleitores de Bolsonaro como um “bloco único”, como “gado”, como se diz, o que impede de abrir diálogo com segmentos mais moderados que votaram em Bolsonaro mas que podem ser ganhos para o voto em uma Frente Democrática; ou seja a polarização empurra eleitores de centro para a extrema direita; b) a polarização praticamente congela a correlação de forças; veja o caso do governo Lula, o presidente foi eleito com 51% dos votos e manteve, por quase dois anos, a avaliação estagnada no mesmo percentual de votos que teve na eleição. E pior: não ganhou eleitores de Bolsonaro para o nosso lado e, mais recentemente, perdeu parte dos eleitores que votaram em Lula, com a aprovação sendo reduzida para menos de 45%; c) a polarização somente interessa a oposição, que, não sendo governo, não tendo nada a mostrar, age como uma “metralhadora giratória”; governo é avaliado, majoritariamente, pela gestão, pelas entregas que faz em termos de políticas públicas e investimentos em obras; d) a polarização não é uma disputa política, é uma marcação de posição. Disputa política significa que você tem como meta tirar apoiadores do outro lado; quem polariza não dialogo porque o objetivo não é convencer gente do outro lado, mas crescer entre os apoiadores da bolha progressista. A polarização interessa à representação parlamentar individualizada que temos no Brasil, é autofágica, porque visa disputar apoio e votos com os companheiros do próprio partido, que os ameaça na eleição; a polarização não interessa às lideranças majoritárias, que precisam ser mais consensuais para vencerem as disputas majoritárias; e) a polarização é perigosa mesmo que o governo volte à situação anterior de 51% de aprovação; a situação de empate é muito perigosa para quem é governo, que, sendo responsável pela gestão do país, fica exposto às variações conjunturais (repiques de inflação, câmbio, emprego, preços dos alimentos) que podem levar à derrota.
g) Adoção da política baseada nos “dois pês”, “Propósito e Pertencimento”, sugerida por Alon Feuerwerker: “Sem subestimar a economia, tampouco é demais olhar para aspectos mais subjetivos dos mecanismos de produção de opiniões políticas. O capital político dos governos sempre se beneficia de dois pês: propósito e pertencimento. Quando está claro a que veio o governo, e quando ele passa a sensação de querer o bem de todo mundo, e não só de sua turma. Acirrar as contradições e estimular a guerra de todos contra todos pode ser útil para reforçar o poder momentâneo, mas um efeito colateral é produzir sensação de exclusão em áreas que o andamento da economia pode até, eventualmente, estar beneficiando. Por isso se diz que a política tem de andar de mãos dadas com a economia, para que a safra eleitoral não decepcione”. (Poder 360, 17/3/2024).
h)Não imitar a extrema direita nas mídias sociais, como fala André Singer. Penso como André Singer, sociólogo e grande estudioso do petismo, quando a esquerda imita a extrema direita nas redes sociais, falando coisas absurdas, fazendo escracho, lacrando, ela deixa de ser esquerda. Confrontado com a afirmação de que “a direita radical se comunica muito bem”, ele respondeu: “Acho que há uma confusão nessa formulação. Não é que o Bolsonaro se comunica bem. É que a internet é muito favorável, como o rádio foi na época do fascismo histórico, para um tipo de comunicação muito direta e muito altissonante. Porque isso chama muito a atenção. Vou dar o exemplo de novo do Trump, que por ser distante é mais fácil. Ele fala coisas absurdas. E uma parte das coisas que ele fala tem só a função de chamar atenção. Porque chamar atenção é o próprio objetivo. Acontece que a esquerda não pode fazer isso. É contra, digamos, a missão da esquerda. A esquerda quer um passo além do capitalismo e da civilização capitalista. Se você começa a comunicar coisas absurdas, você está jogando tudo para trás, o que a extrema direita faz. É regressivo. Se a esquerda adotar esse tipo de conduta, ela se nega enquanto esquerda. Ela não pode fazer isso. É uma questão de para quê ela existe. Aí o problema não é de comunicação. A extrema direita encontrou um espaço neste mundo porque o capitalismo fez as condições regredirem a um tal ponto que propostas absurdas têm um lugar. Porque, de certa forma, o capitalismo contemporâneo transformou a realidade em uma situação absurda. Então, propostas absurdas têm lugar, mas se a esquerda cede a isso, ela deixa de existir enquanto esquerda”. (BBC Brasil, 18/01/2025).Tem formas de fazer sucesso na comunicação sem ódio, vingança e lacração; as redes sociais do presidente Lula e da prefeita Marília Campos são exemplos disso.
h)O PT será sempre de esquerda, mas deve se abrir para um diálogo social, como propõe o companheiro Edinho Silva. “Não existe a menor chance do PT ir para o Centro. Isso é um falso debate. Como é que um partido que está umbilicalmente ligado aos excluídos, aos pobres, àqueles que não têm vez e voz. É um dos partidos dos movimentos sociais, dos trabalhadores. Eu penso, inclusive, que além de ser o partido dos empregados organizados em sindicatos, que sejamos o partido dos trabalhadores que não estão hoje representados. É o partido das pautas identitárias, do conceito de democracia ampla. Como esse partido vai para o Centro?. O que nós temos é que representar os setores que representamos, mas conseguirmos dialogar com setores sociais que estão se distanciando de nós. Esse é o grande desafio do PT. Não é se afastar dos seus. É manter o pé firme no nosso campo, mas entender que precisamos dialogar com uma parcela da sociedade importante que está se distanciando de nós”.
i)Nossos eixos programáticos são a defesa da democracia, do Estado Social e da soberania nacional.(..) Na democracia, a maior conquista da humanidade, como define meu amigo Ivanir Corgosinho, deve ser defendida de forma estadista e grandiosa, deve ser defendida com indignação contra o autoritarismo, e com emoção por vivermos em um regime de liberdades. A democracia não se confunde com atitudes rebaixadas e individualistas, que se explicitam no “sentimento de vingança”; e na base do “deboche” e da “gozação”. A democracia não pode ser transformada em um “caso de polícia” como temos feito atualmente (o “Toc, Toc, Toc, aqui é a Polícia Federal”), esta peça foi criada por uma dissidente do bolsonarismo, como vingança, e não serve à esquerda.(…) Precisamos defender o nosso Estado Social, o mais amplo e robusto dos países em desenvolvimento; só nos, brasileiros, temos SUS, INSS e previdência dos servidores; CLT; educação pública desde a creche até o doutorado; assistência social como política pública; cultura lazer e esportes de graça e outras políticas públicas.(…) Devemos lutar também pela soberania nacional, de forma correta como reconhecimento da autodeterminação dos povos, e sem o isolacionismo, queremos uma integração justa e mais igualitária do Brasil no mundo.
j)Sair da defensiva no debate dos “valores” e defender o “Brasil da diversidade”. Em todo o Brasil marqueteiros e outros “especialistas” em comunicação defenderam que os candidatos do PT nas eleições municipais fugissem do debate dos “valores” que seria a pauta preferida da extrema direita. Marília, em Contagem, não aceitou estas recomendações e enfrentou o debate que é uma prioridade para uma parcela da população. Mas Marília venceu a disputa no debate dos valores porque adotou uma concepção universal de defesa da pluralidade e dos direitos humanos, não adotou um discurso identitarista voltado apenas para as bolhas. Para nós, da esquerda, os direitos humanos são universais e todos os cidadãos e cidadãs devem ser respeitados(as): raça, gênero, orientação sexual, religião, classe social, idade, pcd. Queremos a diversidade política, diversidade religiosa, diversidade de orientação sexual, diversidade de raça, diversidade de gênero, diversidade no futebol, queremos diversidade…
l)Precisamos assumir, sem medo, nossa defesa da cultura e do lazer da população. Em Contagem, para quem não sabe, a oposição centralizou a disputa no combate “aos shows e reforma de praças” defendendo, de forma demagógica, que a prioridade única seria “melhorar a saúde”. Nossa ofensiva nasceu da observação que fizemos da vida cotidiana dos candidatos da oposição. Vimos nas mídias sociais de um dos principais oposicionistas, que ele e sua família, nas férias e feriados prolongados, sempre viajavam para as melhores praias e lugares do Brasil e da América do Sul. Ou seja, a oposição tinha restrição ao direito da cultura e do lazer para os pobres, mantendo como um direito somente dos mais ricos. Marília assumiu então a “defesa da cultura, do lazer e dos esportes de graça para a população” e as pesquisas indicaram grande apoio a esta política democratizadora.
m)Precisamos colocar mais poesia na luta política. Alguns dirão que isto é uma ingenuidade. Tenho 50 anos de militância política e social. Militei 10 anos sob a ditadura militar; fui processado na Lei de Segurança Nacional – LSN, pela greve de 1979 dos bancários de BH e Região. Se tem uma coisa que marcou minha vida foi a poesia em nossos movimentos. Éramos entristecidos e enrijecidos com a dureza da luta em condições tão difíceis. Mas a poesia marcou minha e a vida de toda a militância que lutou contra a ditadura militar. Na campanha das diretas já, Coração de Estudante, de Milton Nascimento, marcou nossas vidas. Na campanha de Lula, em 1989, a emoção foi ainda maior. Fomos surpreendidos pelos poetas com o jingle “Sem medo de ser feliz”. Lembro-me da surpresa nas primeiras audiências desta canção. Fiquei perplexo com a poesia. Mais tarde entendi meus sentimentos: Sem medo de ser feliz foi a poesia que expressou a nossa esperança, foi a “descompressão” psicológica e existencial depois de mais de vinte anos de ditadura militar. Inesquecível,” “Sem medo de ser, sem medo de ser, sem medo de ser feliz”. Veja os grandes movimentos de massa no Chile, na Alemanha, na França onde milhares de pessoas se reúnem nas ruas e praças ao som de canções marcantes em seus países.
n)Contagem, com Marília vive uma “explosão” de participação popular. Temos um amplo sistema de participação popular, que, além dos conselhos de participação social tradicionais, implantamos conselhos regionais nas oito regiões da cidade e mais recentemente foi eleito e empossado o Conselho de vilas, favelas e periferias. Contagem tem uma política de massas de cultura, lazer e esportes, que funciona articulada com a economia solidária, que dá suporte às atividades e, ao mesmo tempo, garante a vida de dezenas de famílias. Contagem tem festa e lazer o ano inteiro; são 15 grandes atividades no calendário da cidade, atividades sempre lotadas. Um grande destaque é o Luzes de Natal, que leva às praças todo ano em torno de 400 mil pessoas, numa cidade que tem 650 mil pessoas. No momento que redijo este texto está para acontecer a corrida “Contagem por Todas”, em homenagem ao mês da mulher. Impressionante: as inscrições para a corrida e para o kit da corrida são abertas no site da Prefeitura, fica tudo congestionado e em menos de 1 hora são cinco mil mulheres inscritas, que comparecem em massa na avenida João César de Oliveira. Difícil explicar esta “explosão popular” em Contagem”. Recentemente formulei uma tese. Nosso companheiro Etevaldo Brito Dias, professor aposentado, fez uma descrição monumental ao escrever certa vez: “Marília não brilha sozinha, ela é uma estrela no meio da constelação”. Eu agora acrescento: “Marília mobiliza a cidade porque ela é uma liderança do protagonismo coletivo”.
o) Sugerimos ao PT uma nova forma de organização partidária, a partir dos territórios, a partir de nossos municípios, sem abandonar a organização em outros segmentos como o sindicalismo e outros setores sociais. Ou o PT se reconstrói a partir das cidades, de baixo para cima, no “chão do Brasil”, ou nosso partido não terá futuro. Antes das eleições municipais, travei um diálogo pelo ZAP com um grande interlocutor político meu. Eu disse para ele: “A derrota do extremismo, em minha opinião, deve ser de baixo para cima, no chão do Brasil, em nossas cidades. Contagem pode virar um exemplo para o Brasil. Marília está inspiradíssima e pode liderar este grande combate democrático”. Meu interlocutor me respondeu: “Não há outra opção. É na base que se muda a história. As vitórias nacionais acabaram encastelando lideranças, que se afastam do povo. Um perigo! Sorte a nossa de ter a Marília”. Diálogo maravilhoso! Repetindo a frase que explica a nossa história e que define o nosso futuro: É na base que se muda a história!
p) Contagem, na comunicação, aponta caminhos para a esquerda brasileira; não tem como fazer trabalho de base, dialogar com a população, fazer a política “olho no olho” sem resgatar as mídias tradicionais; trazendo para as mídias sociais o calor e a emoção das ruas. Não tenho dúvidas que a experiência de Contagem na comunicação deveria ser uma referência para a esquerda brasileira. Somos herdeiros da comunicação de rua, presencial das décadas de 1970, 1980 e 1990, com as mídias tradicionais, como carros de som, megafones, jornais, folhetos, bandeiras, adesivos, etc. Mas quando chegou o tempo das mídias sociais, ao invés de migrarmos para a comunicação virtual, unimos as duas formas de comunicação: continuamos nas ruas e trouxemos as emoções das ruas para as redes sociais. É assim que fazemos nas campanhas eleitorais e no governo Marília Campos e vamos fazer também no PT Contagem. Na campanha de 2024, tivemos 20 carros de som; jornal distribuído de casa em casa nas 150 mil residências de nossa Cidade; estimo que 14 milhões de santões e colinhas eleitorais; centenas de bandeiras grandes; Windbanners nas ruas; Citru; adesivos de blusa e para carros; e dois materiais lúdicos de sucesso: 100 mil bandeirinhas de plástico tamanho A4, distribuídas nas saídas das aulas para crianças e adolescentes de todas as escolas da cidade e uma máscara da Marília que caiu no gosto das pessoas. Toda esta campanha de rua foi trazida para as redes sociais, com a “mensagem quente” do povo nas ruas que nos renderam a espetacular marca de 76 milhões de visualizações de vídeo e 5 milhões de engajamento com as publicações. É este modelo de comunicação, combinando as mídias sociais com as mídias tradicionais que sustenta a comunicação de Marília Campos em Contagem, e que explica, em boa parte, a aprovação de 81% da prefeita.(…) E um dado incrível: a campanha vitoriosa da Marília, com vitória expressiva no primeiro turno, foi feita pela equipe local de comunicação do PT Contagem, um feito impressionante e provavelmente inédito nas grandes cidades brasileiras.
q)Como é bom viver em uma cidade governada e liderada pelas mulheres. Marília faz história em Contagem: ela é a primeira mulher que governou Contagem nos mais de 100 anos de nossa cidade; foi a primeira mulher que conseguiu a reeleição depois que este instituto foi implantado no Brasil. Agora, em 2024, com Marília Campos, que teve 60,68% dos votos, Contagem volta a decidir eleição em primeiro turno depois de 28 anos (a última eleição em primeiro turno foi decidida por Newton Cardoso, em 1996, quando teve 51,78% dos votos); Marília é tetra: ela venceu quatro eleições para a Prefeitura de Contagem: 2004, 2008, 2020 e agora em 2024, o que nunca aconteceu antes em nossa cidade; Marília, segundo dados divulgados pela Folha S.Paulo, é a Prefeita com maior votação nominal no Brasil no primeiro turno: 188.229 votos.(…) As mulheres lideraram nossa chapa de vereadores(as) e nossa maior dificuldade foi a “cota de homens”. Pelo PT foram 11 candidatas a vereadoras e apenas 5 candidatos a vereador. (…) A Federação elegeu cinco vereadores(as), três do PT e dois do PV, e faltaram apenas 100 votos para eleger o sexto vereador(a) porque não conseguimos ampliar a participação dos homens, faltaram dois candidatos do sexo masculino. O PT Contagem elegeu Adriana Souza, a vereadora mulher mais votada da história de nossa cidade; e elegeu Moara Saboia também com grande votação. As duas primeiras suplentes da Federação são também mulheres: Renata Lima, do PCdoB e Camila Marques do PT. E em Contagem não temos apenas cota de 30% mulheres nas eleições, temos oito vereadoras, 32% das 25 cadeiras da Câmara Municipal. E um dado impressionante: no recadastramento biométrico o eleitorado de Contagem ficou assim dividido: 54% de mulheres e 46% de homens; as mulheres se destacaram também no comparecimento eleitoral com 61% de todos os(as) votantes contra 39% dos homens. Ou seja, se as mulheres são as maiores protagonistas nas disputas eleitorais em Contagem é muito correto que que governem e liderem a nossa cidade, com Marília, oito vereadoras e muitas ocupando secretarias, regionais da Prefeitura e cargos expressivos na administração municipal.
r)Precisamos partidarizar os mandatos parlamentares e construir direções mais representativas; este é um dos maiores desafios que vai definir o futuro do PT. O Brasil é um dos poucos países grandes do mundo que adota a lista aberta, onde os eleitores “votam na pessoa” e não na “lista partidária”. Mas a lista aberta e o predomínio quase absoluto dos parlamentares sobre a vida partidária precisa ser modificado profundamente. Os parlamentares monopolizam tudo: a representação nos nossos governos; os cargos nos legislativos; os cargos nas instâncias partidárias; as finanças partidárias e para as eleições. E mais ainda: a lista aberta é autofágica porque como o adversário de um parlamentar do partido é outro parlamentar do próprio partido se reparte a máquina partidária entre todos, mas ninguém lidera quase nada. Cada um cuida da “sua própria vida”. Não tem um planejamento coletivo; é cada um para si e muitos vezes os cargos exercidos por parlamentares se misturam com seus mandatos. Este tipo de partido verticalizado, sem a presença forte de segmentos representativos da sociedade (militantes sociais, intelectuais, técnicos respeitados) não dá conta das enormes tarefas de reconstrução partidária. Em Contagem temos uma ótima experiência: o ponto central de nossa reorganização foi a constituição de uma direção muito representativa de nosso acúmulo na Cidade, com membros da Executiva do Partido, três de nossos principais formuladores, nomes representativos do governo Marília, vereadores e vereadoras.
s)PED 2025. As novas direções do PT devem emergir de um plano de reconstrução político e organizativo para o futuro e, por isso, deve ser um processo construído de forma plural e a muitas mãos. O PT vive, em minha opinião, um momento dramático. As novas direções que serão eleitas em 2025 não podem falhar na reconstrução partidária, porque senão o futuro do PT poderá ficar comprometido. Os desafios do PT são enormes e não serão enfrentados com sucesso com a direção de uma tendência, mas com um trabalho compartilhado de todos e todas. Um trabalho executado a muitas mãos. Não podemos fazer uma disputa sectária pelo espólio de nosso Partido, mas devemos chegar a um “consenso progressivo”, o mais ampliado possível, sobre um plano de reconstrução de nosso partido para manter o PT como protagonista na vida nacional nos próximos anos e décadas. Em Contagem, como já vimos, nossa reconstrução vitoriosa está baseada em cinco eixos: trabalho de base, comunicação, formação, partido como espaço do encontro e da confraternização e finanças e infraestrutura organizadas.
t)Fundação Perseu Abramo está sumida e precisa a voltar a investir novamente na formação da militância petista. Sou de uma época em que nos encontros do PT não faltavam a venda de dezenas de livros editados pela Função Perseu Abramo do PT Nacional. Eu mesmo, José Prata, editei dois livros pela Fundação, dois dos melhores livros que fiz até hoje. O primeiro, em 2005, “Um retrato do Brasil”, onde nas primeiras linhas da apresentação acertei a agenda política da eleição de 2006: “A concepção de Estado – estatais e serviços públicos – é a questão mais importante que estará em disputa nas eleições de 2006”. Quem não se lembra no segundo turno, Geraldo Alkmin vestindo camisetas das estatais para negar que iria privatizá-las? Este livro, o companheiro Luís Dulci diz ser “o melhor produzido sobre o primeiro governo Lula”. O segundo livro, de 2011, “Guia dos Direitos Sociais” foi onde sintetizei os meus conhecimentos sobre o Estado Social e, me lembro, que um funcionário da Fundação Perseu Abramo me ligou dizendo que os operários da gráfica, onde eram impressos os livros, diziam que “era o melhor livro que imprimiram no local”. Fantástico! Sugiro que a Fundação Perseu Abramo retome agora não os livros, mas publicações populares para a militância em defesa do governo Lula em quantidade suficiente para a militância em todo o Brasil. Falo por mim: não consigo fazer leitura de textos mais longos no celular ou no computador e pelo que vejo é esta também a situação da maioria da militância. Então tem que voltar as publicações impressas populares.
u)O PT precisa rever sua vinculação com os movimentos sociais; incorporar o debate no dia a dia do Partido; empoderar os setoriais como direção política nos movimentos e trabalhar por movimentos sociais mais amplos e unificados. O PT foi fruto da confluência de segmentos sociais e ideológicos bastante diversos: sindicalismo combativo que construiu a CUT; setores progressistas da Igreja Católica, como os adeptos da Teoria da Libertação; partidos de esquerda clandestinos mais à esquerda; setores importantes da intelectualidade, dentre outros segmentos sociais. Depois de muitos desencontros, uma resolução partidária exigiu corretamente a “diluição” das organizações políticas autônomas no partido e, para garantir a pluralidade, formalizou a existência de tendências. Mas isto resultou em um modelo de organização muito problemático: a verticalização por tendências, onde quem não pertence a uma tendência não tem identidade partidária, e é considerado “independente”. Eu, como “independente”, sempre brinco com meus amigos: “Se eu sou independente, então o PT é uma federação de partidos e eu sou um filiado avulso na federação”.(…) Na verdade a a implantação das tendências foi somente no plano institucional, nos movimentos sociais as tendências são autônomas e atuam diretamente sem qualquer mediação partidária. As composições partidárias se deram somente no plano institucional, nos diretórios, porque ali se encontra decisões fundamentais, como a definição de candidaturas, finanças, participação nos governos, dentre ouras atribuições; mas nos movimentos sociais, que não tem a atratividade institucional, o PT nunca chegou a se compor como partido; as correntes são autônomas e atuam sem mediação partidária. E mais: sem mediação partidária, nossa atuação nos movimentos sociais se tornou cada vez mais fragmentada, cada corrente, parlamentar, cria o “seu” movimento social, muitas vezes, com cinco, dez militantes, apenas para dar argumento e marca de vinculação aos movimentos sociais. Não são movimentos nem “cartoriais”, porque nem em cartórios são registrados.(…) Com isso, as lutas sociais deixaram de ser “assunto de partido” e raramente, ou quase nunca, foram pautadas nos encontros e congressos partidários; assuntos “partidários” pautados nos congressos e encontros são: discussão de estatuto; definições do perfil ideológico do partido; táticas eleitorais; resoluções sobre conjuntura. As secretarias setoriais foram completamente esvaziadas por não terem o que coordenar, já que não existe partido organizado e unificado nos movimentos sociais. Esta organização partidária “meio Frankenstein” não impediu o forte avanço do PT nos momentos de ascenso das lutas sociais, mas nos últimos anos vem impedindo a renovação e revitalização da vida partidária.(…) O Partido precisa discutir isto urgentemente, passando a ser uma referência organizada nos movimentos sociais (onde as tendências atuam atualmente como partidos autônomos), com a “diluição” ainda que tardiamente, das tendências nas secretarias partidárias e núcleos de base. E veja que coisa potente: se adotamos o território como a nova âncora fundamental da reconstrução partidária, podemos liderar a criação de grandes movimentos sociais nos municípios unificando não somente os petistas mas também todos os segmentos progressistas. Movimentos unificados de mulheres, de jovens, de pessoas LGBT+, de defesa da igualdade racial, de meio ambiente, de proteção dos animais, de moradia. Quem sabe esta proposta não pode levar a uma reorganização de base sem precedentes da esquerda brasileira, sendo o instrumento que nos falta para capitalizar politicamente para o Partido os enormes avanços de nossos governos nas cidades, no “chão do Brasil”.
Repetindo, mais uma vez, a frase que explica a nossa história e que define o nosso futuro: É na base que se muda a história!
v)Partidos de esquerda e governos progressistas, nestes tempos de guerra contra a extrema direita, precisam de maior unidade e planejamento comuns. Os partidos de esquerda tem uma dialética profundamente contraditória: eles representam as reivindicações da sociedade de baixo para cima, mas conquistam também governos que tem compromissos programáticos, mas também tem limitações de toda ordem políticas e econômicas para atender as demandas da sociedade. Os casos de Lula e Marília, grandes lideranças sindicais, que ocupam cargos importantes no Poder Executivo espelham bem esta contradição. Certa vez, escrevi sobre a trajetória de Marília explicando estas contradições: “Quase nada que fizemos em Contagem aconteceu por acaso. Veja só a construção impressionante que fizemos em nossa cidade. Luís Felipe Alencastro, historiador, fez certa vez uma síntese que se tornou uma referência para nós: “O objetivo de toda esquerda democrática é transformar a maioria social em maioria política”. Foi isto que aconteceu em Contagem com a nossa companheira Marília Campos que, como prefeita, se vinculou à maioria social, fez uma aliança histórica da classe média e da população mais pobre, que fizeram dela Treta, quatro vezes prefeita de Contagem e três vezes deputada eleita com os votos de nossa Cidade. (…) É bom destacar que Marília fez uma transição muito interessante de sindicalista para prefeita, uma trajetória muito parecida com a do nosso presidente Lula. Marília foi sindicalista e presidenta do Sindicato dos Bancários e depois ocupou por três vezes o mandato executivo, como prefeita de Contagem e, agora, foi eleita para um quarto mandato. Um balanço indica claramente que os movimentos sociais, em geral, são mais radicais, mas também, por representarem interesses concretos de segmentos da sociedade, são mais corporativos. Já no Poder Executivo, os administradores de esquerda, em geral, são mais moderados, mas, tendo que atender demandas de toda a sociedade, são também mais universais. Marília se dedicou com muita garra à luta dos bancários por melhorias salariais, emprego e por planos de saúde e de Previdência, auxílio-alimentação e creche; mas, na Prefeitura, teve que avançar para uma visão mais universal, para atender demandas de saúde, educação, urbanização de toda a população. Ou seja, Marília, como Lula, era mais radical como sindicalista. Como prefeita, ela é mais moderada, mas também é uma líder política mais universal”.(…) A militância de esquerda precisa compreender isto para não tratarem as contradições de movimentos sociais e de governos de esquerda como “traição”. Partindo deste pressuposto, considero que neste tempo histórico, de guerra contra a extrema direita, devemos aproximar o PT de nossos governos, buscando o maior consenso possível para evitar conflitos. Foi um erro, na minha opinião, as críticas, muitas vezes até duras do PT ao ministro Fernando Haddad, até porque não existe política econômica do ministro, a política econômica é de Lula. Erro ainda maior foi deputados do PT votarem contra mudanças no arcabouço fiscal no Congresso Nacional. Em Contagem é esta aproximação do PT Contagem e do governo Marília Campos que explica, em grande medida, a força e a popularidade enorme de nossa prefeita.
x)A reorganização do PT Contagem pode ser uma inspiração para o Brasil. A reconstrução do PT Contagem está baseado em cinco eixos: trabalho de base; formação, comunicação, finanças organização e confraternização partidária. Veja algumas das políticas que adotamos.(…) Fortalecimento da direção partidária, com a incorporação no trabalho de direção junto com as instâncias partidárias das principais lideranças sociais e intelectuais do petismo de Contagem; incorporação dos simpatizantes na vida partidária como forma de aproximação do partido; partidarização dos mandatos parlamentares e aproximação do PT Contagem da prefeita Marília Campos; b) Contagem é um caso provavelmente único no Brasil onde o PT tem uma ampla ascendência sobre a militância, os vereadores(as) e o próprio governo. (…) Marília comparece regularmente nas atividades partidárias, como filiada do Partido, e empoderou o Partido neste quarto governo deixando para a direção partidária o debate e definição da representação partidária de todos os cargos reservados ao PT Contagem, como secretários e administradores regionais. Impressionante!. (…) A participação popular grandiosa com Marília em Contagem “transbordou” para dentro do partido: reunimos, em 2003, 3.400 pessoas nas reuniões dos setoriais e nas oito regionais do partido que criamos e impressionante: reuniões de duas horas sem nenhuma dispersão, que iniciaram e terminaram cheias e com mimos como lanche para todos os participantes e, em breve, teremos também creches para os filhos pequenos. Recentemente reunimos 1.200 pessoas no lançamento do livro meu, José Prata, e do Ivanir Corgosinho, no dia 10 de fevereiro, com as presenças da prefeita Marília Campos e do Edinho Silva; é o mesmo número de pessoas que tinha no ato em Brasília no dia 8 de janeiro.(…) Na formação política editamos duas revistas, dois livros e uma cartilha do governo Marília Campos, que estabeleceu um grande prestígio do PT Contagem junto à prefeita Marília Campos e junto até mesmo aos partidos da Frente Ampla. Outra proposta pioneira de Contagem é o Blog do Zé Prata e do Ivanir, que publica, semanalmente, todo sábado, uma edição com sete a nove artigos de militantes da cidade com reflexões sobre política, economia, políticas públicas e outros assuntos de nossa cidade. Ainda na formação estamos gestando duas propostas maravilhosas: a constituição de grupos de estudos, uma forma de auto-organização para a formação política, e de uma biblioteca partidária com centenas de livros.(…) Na comunicação, já realizamos três campanhas em defesa do governo Marília Campos nas redes sociais; somos nós do PT que sistematizamos as informações do governo para as campanhas publicitárias do governo nas grandes mídias; foi a equipe de comunicação do PT Contagem que conduziu a campanha vitoriosa de Marília agora em 2024, um caso provavelmente inédito no Brasil em grandes cidades, com gasto de 5% do valor de mercado de uma campanha em Contagem; e estamos gestando o lançamento de um jornal de massas do PT Contagem, de nome “Nossa Voz”, com edição, se tudo der certo, de 50 mil exemplares.(…) Nas finanças avançamos muito e agora, então, que todos os representantes do PT no governo Marília Campos foram todos indicados pela direção local, as finanças são condição para a presença representando o partido no governo.(…) E na confraternização lançamos o Boteco do PT Contagem com enorme sucesso com jogos de sinuca e totó, com música ao vivo com artistas cantando voluntariamente; para favorecer a presença de pessoas mais pobres ofertamos gratuitamente uma porção de feijão tropeiro e refrigerante, sendo a cerveja paga pelas pessoas. E estamos gestando a regionalização do Boteco do PT Contagem para quatro regiões que ficam distantes de nossa sede. E o incrível: com música, jogos, dança, quase ninguém fica “despachando” sobre o governo no Boteco; o Boteco é diversão pura.
z-Uma cena ontológica define a liderança de Marília Campos; ela representa a primeira grande saga da população contagense. Uma cena de arrepiar, que aconteceu na região de Nova Contagem na campanha de 2020, no dia 09/11/2020. Participei de uma carreata na cabine de uma camionete já que a carroceria estava ocupada por Marília e outras pessoas. Foi na entrada do bairro Icaivera, que aconteceu uma cena emocionante: um cidadão, com bandeirinha e adesivo bolota nas mãos, se ajoelhou à frente do carro de som. Eu fiquei imóvel diante daquela cena inusitada. Não sabia que a cena tinha sido captada pela nossa equipe de vídeo que estava em cima da camionete. Um ou dois dias se passaram e num miniclipe feito por nossa equipe de vídeo, aparecia a cena do cidadão ajoelhado e a reação da Marília, na minha opinião revelou a grande líder popular que ela é. O que impressiona é que a cena dura poucos segundos; sem tempo para pensar, Marília reage de forma instintiva. Ela cruza os dois braços e os encosta no peito; se curva diante do cidadão e ,emocionada, diz: “Obrigada gente”. Fantástico e revelador! Naquele momento, o que vimos não foi um gesto submisso de um cidadão diante de uma líder populista e autoritária. O gesto de reverência do povo – se ajoelhar diante da liderança – foi respondido pela Marília com um gesto igualmente de reverência ao povo – mãos cruzadas no peito para expressar o amor e a emoção, a liderança se curva em gesto de encontro e humildade.
Marília não se assemelha a uma liderança carismática, nas palavras de Max Weber “uma personalidade individual, em virtude da qual o dotado é separado dos homens comuns e tratado como possuidor de poderes ou qualidades excepcionais sobrenaturais, sobre-humanos”. As qualidades de Marília estão mais associadas na “identificação” da população com ela, que a considera ela “gente como a gente”. Muitas pessoas consideram Marília uma liderança personalista, quando dizemos que ela tem se mostrado “indestrutível”.(…) Wanderley Guilherme dos Santos, cientista político, fez, em 2016, uma análise e um prognóstico impressionante sobre Lula e a falsos moralistas da Operação Lava Jato: “O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é indestrutível. A direita e a esquerda de nariz torcido evitam reconhecer que a indestrutibilidade de Lula não é propaganda partidária, mas fenômeno sociológico. Lula, o intérprete dos desassistidos, entrará para a história; já os reacionários não terão memória, não terão registro; serão abolidos”. (…) Cândido Mendes, em 2006, disse que Lula representa a primeira grande saga de nossa população: “A grande realidade política hoje do país é o que se chamaria esta ‘subversiva’ popularidade do presidente. É um laço de identidade absolutamente inovador que liga a liderança do presidente a seu apoio, hoje, a saltar inclusive da nucleação do país destituído que chegou com ele ao Planalto. Enganam-se também os que querem atribuir este sucesso a um carisma do presidente. O impacto de Lula nada tem a ver com uma adesão irracional ou, com a delegação irrestrita de mando a um Messias ou a um enviado, como protagonizou o país, por exemplo, na eleição de Collor”. O sociólogo completa: “Trata-se de um fenômeno de um inconsciente coletivo que alguns tolos confundem com um irracional. O segredo de Lula está nesse olho no olho da sua gente e na capacidade sempre de se o reconhecer tal como chegou ao Planalto na primeira grande – e talvez única – saga da nossa população”.
O certo é que grandes lideranças marcantes na vida de um povo, como Marília Campos, fenômenos sociológicos na expressão de Wanderley Guilherme, surgem de tempos em tempos, a cada 100 anos alguns afirmam, e quando surgem estas lideranças, as pessoas querem ficar perto, querem abraçar, não querem se desgrudar delas. Milhares de pessoas amam a Contagem “governada pela Marília”, porque ela interpreta, de forma rara, “os sentimentos, desejos, emoções e expectativas de sua gente”. Daí porque muita gente brinca querendo ela como “prefeita vitalícia” ou, de forma ainda mais exagerada, a qualificam de “prefeita perfeita”. Me lembro muito bem: Marília, quando deputada estadual, ia aos bairros falar para o povo, e ninguém queria ouvir a deputada, todos clamavam pelo “volta Marília”. “Não queremos você como deputada, queremos você como prefeita novamente”, diziam as pessoas. Brinco com Marília que, enquanto ela viver, provavelmente, ouviremos na cidade o apelo de “volta Marília”. Não será fácil a população cedê-la, no início de um quarto mandato, para disputar uma eleição para senadora ou governadora. Não vai ser fácil também suceder Marília: na cabeça da população o(a) ocupante será apenas para “esquentar a cadeira” de prefeito, até a volta dela, como permite a legislação. Impressionante!
Eu gosto muito desta caracterização de grandes lideranças do povo como “intérpretes” dos sonhos e sentimentos da população. Não significa que tais líderes não tenham também grandiosas tarefas como dirigentes para não somente “interpretar” sonhos, mas também para “realizar” sonhos. Veja o caso de Marília. Ela precisou fazer uma complexa transição de sindicalista para prefeita. Precisou lutar muito para se projetar como liderança na cidade. Enfrentou desafios gigantescos para conquistar os quatro mandatos em tensas disputas eleitorais. Eleita teve que enfrentar uma situação caótica de uma cidade falida e reorganizar as finanças municipais. Eleita também precisou constituir base de apoio para seus governos e conseguir apoios de governos para implementar políticas públicas e investimentos em nossa cidade. Com as finanças bem arrumadas teve que se dedicar fortemente à gestão para fazer as coisas acontecerem. Bem avaliada pela população ainda teve que enfrentar nos últimos anos a política de destruição do PT e da esquerda, que buscou reduzir a aprovação popular com um discurso ideológico do ódio e do ressentimento. E Marília foi vitoriosa quatro vezes. Ela é tetra!
Marília representa provavelmente a primeira grande saga da população de Contagem. Como já dissemos: Marília não brilha sozinha, ela é uma estrela no meio da constelação. Marília é uma líder do protagonismo coletivo. Em Contagem com Marília ninguém se considera coadjuvante, todo mundo se considera protagonista. Em Contagem, somente nos meios políticos a chamam de “prefeita”; o povo, com total intimidade, a chamam de Marília. Pedi ao meu amigo e sociólogo Ivanir Corgosinho que me explicasse o que é saga e ele me escreveu: “Nesse sentido, a saga envolve uma continuidade temporal; múltiplos personagens recorrentes e conhecidos; uma liderança central sincera e profundamente comprometida com os ideais históricos coletivos; sucessos; revezes e a transmissão de tradições, crenças e valores às gerações seguintes”.
José Prata Araújo é economista