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José Prata: não é a polarização, mas a esperança que derrota a extrema direita

Quando erramos os diagnósticos erramos também nas propostas de ação política. Na campanha político eleitoral de Contagem, Minas Gerais, de forma impressionante, acertamos 100% nos diagnósticos e adotamos as posições políticas que nos tornaram vitoriosos, com a eleição de Marília Campos no primeiro turno; vitória nas oito regiões e em 64 dos 66 bairros de nossa cidade. Contagem mostrou algo promissor: um caminho para enfraquecer e derrotar a extrema direita é com uma frente ampla combativa e vibrante, com política afirmativa e com o resgate da esperança de futuro. Iniciamos, a partir da experiência de Contagem, o debate sobre diagnósticos da situação estadual e nacional e propostas de reorganização da esquerda para o grande combate político de 2026.

Uma vitória de Lula na eleição de 2026 é “possível”, mas ainda não é “provável”. Conversando recentemente com o cientista político e militante histórico do PT, Juarez Guimarães, ele me fez esta avaliação que eu concordo: uma vitória de Lula em 2026 é possível porque o presidente ainda tem uma aprovação que faz dele uma candidatura competitiva, mas ainda precisamos construir um ambiente político em que a vitória de Lula se torne “provável” com o aumento da aprovação popular e da intenção de votos.(…) Para que tenhamos uma previsão mais acertada sobre as eleições de 2026, temos que levar em conta quatro aspectos:

a)José Luís Fiori afirma que a melhor explicação para o extremismo de direita é que o final dos ciclos de globalização multiplicam as revoltas sociais e as reações nacionalistas: “A história contemporânea sugere que Karl Polanyi tenha razão: os grandes avanços da internacionalização capitalista promovem grandes saltos econômicos e tecnológicos, mas, ao mesmo tempo, aumentam geometricamente as desigualdades na repartição da riqueza entre as nações e as classes sociais. E como consequência, no final dos grandes ‘ciclos de globalização’, aumenta e generaliza-se a insatisfação das grandes massas, e multiplicam-se as revoltas sociais e reações nacionalistas, ao redor do mundo”. O que acontece no Brasil não é um fato isolado, é o mesmo que ocorre no mundo.

b) nenhuma corrente de opinião (socialistas, socialdemocratas, centro, direita, extrema direita) tem apontado saídas para a crise. Vivemos, portanto, uma época histórica marcada pela avaliação negativa da maioria dos governantes pelo mundo (presidentes e primeiro ministros); governos bem avaliados, dentre as grandes nações, tem-se somente no México e India; na maioria dos países os governos estão muito mal avaliados, com a desaprovação superando a aprovação: Estados Unidos, Itália, Espanha, Canadá, Japão, Alemanha, França, Coreia do Sul; e, na América Latina, a maioria dos governos de esquerda e de direita estão mal avaliados.

c) fruto desta situação, o sociólogo e ex-vice-presidente da Bolívia, Álvaro Linera, prevê hegemonias curtas. A análise foi feita para a América Latina, mas vale para o mundo: “Minha hipótese é que, nesses tempos liminares, teremos um progressismo de curta duração e um direitismo de curta duração. Hegemonias curtas, tanto à esquerda quanto à direita. Até que, em algum momento, o destino se realinhe para um lado ou para o outro e se inicie um longo ciclo de 20 ou 30 anos”. As previsões de Linera vem se confirmando, como recentemente nos Estados Unidos, e poucos governos tem conseguido a reeleição. Portanto, os riscos que corremos no Brasil da volta da extrema direita não podem ser subestimados.

d)veja só: numa conjuntura que vivemos no mundo o diagnóstico de que a vitória de Lula é “possível” já representa algum alento, porque eleição, quase sempre, depende da avaliação dos governos: governos bem aprovados inspiram a continuidade; governos mal avaliados levam à mudanças. Não são poucos os países do mundo que a vitória de presidentes e primeiros ministros, por terem avaliação de 18%, 20%, 25% 30% 35%, é “impossível”. O que faz da vitória de Lula não ser algo impossível, mas possível é que o nosso presidente, mesmo com alguma desaprovação, é um dos mais aprovados dentre os mal aprovados. Pesquisa recente, no cenário da América do Sul, da empresa argentina CB Consultora, feita pela Internet como da Atlas, dá a Lula aprovação de 46,5% e desaprovação de 50,6%, o que coloca o petista como o terceiro presidente mais popular da América do Sul e um dos mais aprovados do mundo. Nas pesquisas feitas no Brasil no critério binário – aprova ou desaprova – Lula tem índices parecidos e, na intenção de votos, o presidente continua em primeiro lugar ou em empate técnico.

É possível que o governo Lula tenha uma melhoria da avaliação nos próximos meses; como apontam alguns analistas. Lula, é bom ressaltar, tem enormes desafios em seu governo mas mantém ainda como uma liderança expressiva no Brasil e no mundo e faz um terceiro governo com grandes realizações. Lula tem bons resultados na economia e na área social: crescimento econômico de 2,9%, em 2023, e de 3,4%, em 2024; forte geração de empregos, com o mercado de trabalho aquecido: foram gerados com Lula 3,146 milhões de empregos em dois anos; a renda da população vem crescendo de forma expressiva; aprovação do novo arcabouço fiscal, um avanço grande em relação ao teto de gastos que congelava em termos reais os gastos públicos; aprovação da reforma tributária, retorno dos programas sociais – Bolsa Família, Mais Médicos, reajuste real do salário mínimo, programa Pé-de-meia, continuidade e melhoria da política de cotas, aumento da faixa de isenção do IR para dois salários mínimos; ampliação forte da inserção do Brasil no cenário internacional. O maior problema, de fato, é que na economia, a “principal marca” do governo Lula, a alta da inflação, sobretudo da inflação de alimentos, impacta muito negativamente o governo, pois corrói muito os ganhos reais da renda das famílias.

Diversos analistas importantes preveem alguma recuperação da aprovação do governo Lula nos próximos meses. O sociólogo Marcos Coimbra, o único dos grandes analistas políticos, que previu a ascensão de Bolsonaro em 2018, afirma: “Lula segue favorito para a reeleição, desde que não se distancie de sua base. As mesmas pessoas que votaram nele vão continuar votando. O que ele não pode é ficar se afastando desse eleitorado. A direita não contará na próxima eleição com a mesma “montanha de dinheiro” despejada pelo governo Bolsonaro em 2022. O que fez Bolsonaro crescer na reta final da última eleição não foi o antipetismo ou um movimento ideológico, mas a liberação de entre R$500 e R$700 bilhões em benefícios. Desde a divulgação dessa pesquisa, toda a grande imprensa se empenha em dizer o que Lula deveria fazer. Mas quem são essas pessoas para dar aula ao presidente? O Lula tem experiência, vivência e sabe melhor do que qualquer um desses analistas como governar e se comunicar com seu povo. No final das contas, o que importa é que sua base segue firme, e quem votou nele, votará de novo”. (Brasil 247, fevereiro de 2024).

Nílson Teixeira, economista, em matéria no Valor Econômico, prevê que a “a aprovação do governo deve melhorar”. Disse ele: “Ao perceber essa dinâmica desfavorável para sua gestão, o presidente promoveu mudanças na sua Secretaria de Comunicação com a incorporação, como ministro, de Sidônio Palmeira, responsável pelo marketing da sua última campanha eleitoral. Para reverter o quadro, o atual ministro aumentou o número de viagens do presidente para participação nos eventos com anúncios de realizações do governo e em reuniões com grupos que historicamente dão suporte para sua gestão. Essa atuação e uma eventual surpresa positiva no PIB em 2025 e 2026 tendem a reverberar positivamente na sociedade, com reversão, mesmo que parcial, do declínio na popularidade do presidente. Esse cenário estaria provavelmente associado a uma elevação da safra de 2025 acima do previsto. Uma colheita ainda maior e um repasse mais disseminado para o restante da economia gerariam um fluxo de notícias boas para o governo, contribuindo para a melhora da sua avaliação, mesmo com parte expressiva do setor agrícola preferindo candidatos da direita. A esperança é de que a maior safra contribua para uma expressiva redução dos preços de alimentos e, em consequência, uma significativa diminuição da inflação ao consumidor. Mesmo com a esquerda perdendo parte de seus votos cativos – eleitores do Nordeste, de renda mais baixa ou beneficiados por transferências governamentais -, outra contribuição para a reversão em alguma medida do declínio da confiança no governo virá do direcionamento de mais recursos em 2026 para ampliação dos programas Pé de Meia, Vale Gás e Farmácia Popular, bem como para o Programa Mais Acesso a Especialistas. Do mesmo modo, a eliminação do IRPF para contribuintes com renda de até R$ 5 mil também atrairá maior apoio para o governo se aprovada ainda neste ano.(…) As ações do governo e a mudança na sua comunicação devem melhorar a percepção da sociedade sobre a atividade e sobre os diversos programas em benefício da população. Se não houver nenhuma surpresa negativa, essa dinâmica garantirá alguma recuperação na aprovação do governo Lula. Não obstante, a dificuldade de antecipar a magnitude dessa reversão, mesmo sem um candidato suficientemente conhecido e popular para representar a direita, torna pouco previsível o resultado da eleição presidencial de 2026”. (Valor Econômico, 12/03/2026). (…) O economista não citou ainda o programa de crédito consignado para os trabalhadores celetistas e o debate muito favorável à esquerda do fim da escala 6X1; e, além disso existe uma possibilidade de desgaste da extrema direita com o tarifaço de Donald Trump, que atropela até a extrema direita pelo mundo. Nilson Teixeira ressalta além da possível melhoria na economia, o “banho de povo” que Lula está tomando, como recentemente em visita à duas fábricas em Minas Gerais.

A polarização é um risco para o governo Lula; não dá certo atropelar politicamente quem pensa diferente e querer convencer as pessoas pela economia. Veja o quadro complexo que vivemos. Como disse Nilson Teixeira, que prevê uma melhora da avaliação do governo Lula, mas afirma que é preciso esperar “o tamanho dessa reversão”, o que torna “pouco previsível o resultado da eleição presidencial de 2026”. Cabe ressaltar também que a política econômica adotada pelo governo Lula vai contra o calendário eleitoral, ou seja, a economia cresceu muito na média mundial nos dois primeiros anos e, tudo indica, vai desacelerar nos dois anos finais de governo. Isso é um problema político enorme. (…) O economista Christopher Garman considera que é melhor para Lula um crescimento menor nos próximos dois anos com inflação mais controlada do que o inverso: “De todo modo, está muito claro que a inflação é o calcanhar de Aquiles do governo. Uma análise da Eurasia Group identificou que governantes perderam eleições em 2024 não por conta de uma onda ideológica da direita, mas porque os eleitores estavam insatisfeitos com o aumento do custo de vida. Foi isso que levou Trump de volta à Casa Branca e a direita ao poder na Alemanha. Logo, o maior risco para Lula é “entrar em pânico” com a queda de sua aprovação, gastar mais do que deve e acabar com um PIB maior e com inflação mais alta nas mãos. Em termos eleitorais, é melhor deixar a economia esfriar e trazer a inflação para baixo que tentar aumentar o PIB e gerar mais aumento no custo de vida- o grande algoz de todos os governantes em 2024”. (Valor Econômico, 25/02/2025). Veja só o dilema que vivemos: maior crescimento e maior inflação ou crescimento menor e inflação mais controlada. O ideal seria crescimento robusto com inflação baixa; tudo indica que não teremos a realização desta possibilidade, o que deixa a disputa de 2026 num cenário incerto.

A economia vai continuar sendo muito importante na decisão dos eleitores, mas com a polarização, mais do que nunca, economia e a política precisam andar de mãos dadas. A estratégia atual do governo e, sobretudo de parte expressiva do PT, de apostar na polarização, atropelar politicamente quem pensa diferente de nós e querer ganhar as pessoas pelos resultados da economia não funciona. Eu, José Prata, como economista, considero estratégia um grave erro. Três argumentos contra a polarização: a) a polarização, o nós contra eles, trata os eleitores de Bolsonaro como um “bloco único”, como “gado”, como se diz, o que impede de abrir diálogo com segmentos mais moderados que votaram em Bolsonaro mas que podem ser ganhos para o voto em uma Frente Democrática; ou seja a polarização empurra eleitores de centro para a extrema direita; b) a polarização praticamente congela a correlação de forças; veja o caso do governo Lula, o presidente foi eleito com 51% dos votos e manteve, por quase dois anos, a avaliação estagnada no mesmo percentual de votos que teve na eleição. E pior: não ganhou eleitores de Bolsonaro para o nosso lado e, mais recentemente, perdeu parte dos eleitores que votaram em Lula, com a aprovação sendo reduzida para próximo de 45%; c) a polarização somente interessa a oposição, que, não sendo governo, não tendo nada a mostrar, age como uma “metralhadora giratória”; governo é avaliado, majoritariamente, pela gestão, pelas entregas que faz em termos de políticas públicas e investimentos em obras; d) a polarização é perigosa mesmo que o governo volte à situação anterior de 51% de aprovação; a situação de empate é muito perigosa para quem é governo, que, sendo responsável pela gestão do país, fica exposto às variações conjunturais (repiques de inflação, câmbio, emprego, preços dos alimentos) que podem levar à derrota.

O companheiro Edinho Silva está correto quando afirma que a polarização dificulta o reconhecimento destes avanços: “A polarização impede que as pessoas enxerguem o governo, inclusive seus êxitos. O maior desafio do PT e da esquerda é romper a polarização, porque a polarização cega e impede que governos exitosos sejam enxergados. Se não saímos disso, a avaliação de governo será sempre secundarizada. Precisamos romper com um ambiente de polarização que a gente não domina, começar a criar um discurso de unidade no país, é a única coisa que vai furar a bolha da polarização. Não é uma estratégia simples”.(O Globo, 08/10/2024). O que Edinho cobra do PT e do governo Lula é a sintonia com o slogan do próprio governo Lula: “União e reconstrução”.

É preciso prestar a atenção nas palavras sábias do analista político Alon Feuerwerker: “Sem subestimar a economia, tampouco é demais olhar para aspectos mais subjetivos dos mecanismos de produção de opiniões políticas. O capital político dos governos sempre se beneficia de dois pês: propósito e pertencimento. Quando está claro a que veio o governo, e quando ele passa a sensação de querer o bem de todo mundo, e não só de sua turma. Acirrar as contradições e estimular a guerra de todos contra todos pode ser útil para reforçar o poder momentâneo, mas um efeito colateral é produzir sensação de exclusão em áreas que o andamento da economia pode até, eventualmente, estar beneficiando. Por isso se diz que a política tem de andar de mãos dadas com a economia, para que a safra eleitoral não decepcione”. (Poder 360, 17/3/2024).

Tudo indica que o Processo de Eleições Direitas – PED do PT será polarizado pelo debate da polarização; dobrar a aposta nesta polêmica é um atraso. É um falso debate qualificar quem defende a despolarização da sociedade como sendo o caminho do PT romper com sua trajetória de esquerda e ir para o centro. Veja um longo depoimento de Edinho Silva, provável candidato a presidente do PT: “Não existe a menor chance do PT ir para o Centro. Isso é um falso debate. Como é que um partido que está umbilicalmente ligado aos excluídos, aos pobres, àqueles que não têm vez e voz. É um dos partidos dos movimentos sociais, dos trabalhadores. Eu penso, inclusive, que além de ser o partido dos empregados organizados em sindicatos, que sejamos o partido dos trabalhadores que não estão hoje representados. É o partido das pautas identitárias, do conceito de democracia ampla. Como esse partido vai para o Centro?. O que nós temos é que representar os setores que representamos, mas conseguirmos dialogar com setores sociais que estão se distanciando de nós. Esse é o grande desafio do PT. Não é se afastar dos seus. É manter o pé firme no nosso campo, mas entender que precisamos dialogar com uma parcela da sociedade importante que está se distanciando de nós. A classe média operária, que gerou a massa crítica que pariu o PT, a CUT, os partidos de esquerda e a redemocratização do Brasil. Essa classe média operária está diminuindo e tem uma outra classe trabalhadora se formando que estamos com muita dificuldade de dialogar com ela. Quando a gente não dialoga com essa classe trabalhadora com a realidade dela, ela vai para o antissistema. E o que a gente tem que ter claro? O voto antissistema é da Direita, não é nosso. A esquerda sempre defendeu o Estado – “diferentemente do marxismo que defende o fim do Estado” – e que hoje é preciso debater uma “reforma” desse Estado. Outra questão que temos que colocar na agenda é a reforma do Estado. É evidente que existe um distanciamento entre representante e representado, entre Estado e sociedade civil. E este distanciamento está virando um abismo. Você vai para a periferia e conversa, especialmente com a juventude, que entende que a política é ascensão social, que quem está na política está para ficar rico. Aquele encantamento com a política como instrumento de mudança da realidade, de transformação, esse encantamento se perdeu. E nós precisamos recuperar esse encantamento e não é com discurso. É com ações concretas. Primeiramente de diminuir esse distanciamento. As pessoas precisam entender que nós somos instrumentos da luta para transformação da vida delas, é preciso que haja um reencantamento pela política como instrumento de transformação e representatividade”. (Fórum, 18/11/2024).

Marília Campos, em Contagem, adotou uma linha política de esquerda, propôs e conseguiu trazer a centro direita mais para o centro e formou uma Frente Ampla de centro esquerda combativa e vibrante. Somos contra a polarização nos termos atuais, que dificulta o protagonismo dos partidos de centro no plano nacional (nos municípios são grandes protagonistas). Mas é preciso dizer que a polarização não é disputa entre dois extremos, temos atualmente apenas a extrema direita e a extrema esquerda é completamente irrelevante; o PT é um partido de esquerda que forma governos mais amplos junto com os partidos de centro, governos de centro-esquerda. Veja só: tínhamos no passado a disputa entre dois polos representados pelo PT e PSDB, mas eram dois polos com compromisso democrático. Portanto, o problema atual mais grave não é polarização genericamente, mas a existência de uma extrema direita sem compromissos democráticos e cuja estratégia é a implantação no Brasil de um governo autocrático. Será bom para a democracia brasileira, que os partidos de centro retomem o protagonismo nacionalmente, mas aí o empecilho não é a esquerda mas a extrema direita que capturou grande parte dos eleitores de centro. Os partidos de centro só irão recuperar o protagonismo, se além da defesa da democracia, distanciarem da extrema direita na economia, assumindo bandeiras como a defesa de uma nova política industrial; a defesa do fortalecimento do Estado, a defesa da soberania nacional, mudanças que já são visíveis em partidos de centro dos países desenvolvidos.

Conseguimos muitos avanços programáticos e políticos em Contagem e nossa Frente Ampla é combativa e vibrante. Marília, com o amplo apoio dos partidos de centro, conseguiu aprovar na Câmara Municipal enormes avanços num programa de centro esquerda: a) a aprovação de um novo plano diretor, com o retorno da área rural (28% de nosso território) e preservação de Vargem das Flores; b) a aprovação de um avançado Sistema de Participação Popular, com orçamento para dezenas de obras; c) a desprivatização dos serviços públicos da saúde (Hospital, Maternidade, e cinco UPAS), e criação do SSA- Serviço Social Autônomo; d) aprovação pelos vereadores e vereadoras de empréstimos de R$ 550 milhões vinculado a um projeto desenvolvimentista para Contagem; e) a defesa do desenvolvimento com proteção do meio ambiente com uma oposição pública e forte de nosso governo contra o traçado do Rodoanel, que rasga Vargem das Flores; f) Marília realizou um diálogo forte com a Câmara Municipal, que aprovou dobrar o valor das emendas impositivas; Marília vetou a medida e conseguiu que o veto fosse mantido com os votos de todos os 20 vereadores da base de governo e também da oposição.(…) Em Contagem nossa campanha da Frente Ampla de 16 partidos foi vibrante: a) não abrimos mão da identidade avermelhada do PT, combinado com o verde amarelo, ao contrário de candidatos até radicais do PT que adotaram cores insossas para não assustar os eleitores; b) fizemos uma forte campanha de rua com 53 caminhadas, carreatas e bandeiraços; c) nossa campanha de rua “explodiu” nas redes sociais, com 76 milhões de visualizações de vídeos e 5 mil de engajamentos nas publicações; d) não fugimos do debate dos valores, defendemos a “Cidade da diversidade” e “cultura, lazer e esportes de graça para a população”; e) e chegamos até aqui atuando com ousadia nos períodos mais duros do anti-petismo, na luta contra o golpe político parlamentar, nas duas campanhas de Marília deputada, em 2014 e 2018, o reflão do jingle dizia “Viva a alegria e a esperança com a Marília do PT” e os dois carros que, eu e Marília tivemos até hoje, foram vermelhos, um risco enorme no auge do anti-petismo.

Por tudo isso nos sentimos injustiçados por polarizações falsas que qualificam quem defende a despolarização da sociedade de “capitulação ao centro”. Fica claro para estes setores que não devemos ampliar alianças para uma frente ampla e que as transformações são de responsabilidade apenas dos que consideram esquerda do PT. Lideranças como Edinho Silva, Fernando Haddad, Marília, dentre outras, para os polarizadores, “se renderam” aos interesses da Faria Lima. Significa também que o PT, em vez de se aproximar e sustentar nossos governos deve adotar publicamente uma linha crítica às posições especialmente da política econômica, que já foi chamada de forma indireta por segmentos do PT de “austericídio fiscal”. (…) Veja a carta do deputado Rui Falcão publicada recentemente no site do PT, tudo indica marcando o lançamento da candidatura para presidente nacional do PT: “Nosso partido deve rechaçar os apelos à despolarização, palavra da moda que significa levar-nos a uma transição efetiva para o centro, com um forte rebaixamento ideológico, programático e organizacional. A construção de coalizões para vencer as eleições e governar não pode ser vista como contraditória com a disputa pública de hegemonia pelos partidos do campo popular. O partido não pode ser reduzido a um braço institucional do governo de frente ampla”.

José Luís Fiori: É a “esperança de futuro” que abrirá portas e janelas de novos tempos. José Luís Fiori iluminou a nossa militância política quando fez uma diagnóstico do “tempo histórico” da extrema direita, que é o fim das épocas da globalização neoliberal, que deixam um rastro de desigualdade, desesperança, guerras, conflitos políticos e religiosos, ódio e ressentimentos. A extrema direita, na proporção que adquiriu, “não veio para ficar”, ela vai se enfraquecer e se isolar, ainda que este seja um processo demorado, que deve demorar mais uns 20 a 30 anos na previsão de Fiori. E o mais importante: será a esperança de futuro que vai abrir as portas e janelas de novos tempos. No artigo que citamos, denominado “Revolta e esperança”, José Luís Fiori conclui: “Vivemos uma verdadeira guerra entre duas visões da humanidade, absolutamente antagônicas e, ao mesmo tempo, no caso brasileiro, entre duas concepções opostas – de estado, de sociedade, de economia, de sustentabilidade, de cultura, de civilização e de futuro. Neste momento é fundamental que os progressistas apresentem à sociedade brasileira um projeto de futuro que seja inovador e que seja diferenciado, combinando uma verdadeira estratégia de guerra contra a desigualdade, com um projeto simultâneo de construção de uma nação, popular e democrática, e de uma grande potência pacificadora capaz de influenciar as gigantescas transformações mundiais que estão em pleno curso. É fundamental neste momento conscientizar e conquistar o apoio de todos os brasileiros para um novo projeto de futuro solidário e compartilhado por todos, capaz de vencer a distopia teológica e ultraliberal da salvação de cada um por si, mesmo que seja contra todos os demais, com a benção de Deus e a mão invisível do mercado. Nesta hora, mais do que nunca, é preciso inovar e apresentar com coragem e absoluta clareza, ideias e projetos, mas sobretudo, um “sonho de futuro” capaz de sintonizar com a imaginação e a esperança de todos os brasileiros”. Marília representa um pouco do conteúdo destas belas palavras; ela é “uma guerreira da esperança”.

Interessante notar que toda a esquerda brasileira publicou e se emocionou com um vídeo de Pepe Mujica, na campanha eleitoral do Uruguai, agora em novembro de 2024, quando o grande estadista, em discurso quase de despedida, defendeu uma visão muito parecida com a nossa de Contagem. Ou seja, muitos que defendem a polarização publicaram o vídeo, mas não escutaram as palavras emocionantes do velho militante da esquerda latino-americana. Disse Mujica: “Porque é preciso um governo que abra o coração e a cabeça com todo o país. Não é poético o que eu digo. Alguém tem que dizer. Um velho. Não ao ódio! Não à confrontação! É preciso trabalhar pela esperança! Até sempre…lhes dou meu coração. Tenho que agradecer à vida! Porque quando esses braços se forem haverá milhares de braços. Obrigado por existir. Até sempre!”. Viva Pepe Mujica! Viva Lula! Viva Marília!

Parte expressiva das lideranças e da militância de esquerda amesquinha a democracia e trata as disputas atuais com “sentimento de vingança”; e na base do “deboche” e da “gozação”. Vamos pagar um preço alto por esta despolitização. Pesquisas recentes indicam uma ampla condenação da população, da ordem de 86%, dos atos de 8 de janeiro. Isto significa que a narrativa da oposição não colou; trata-se de uma questão que, para além da militância e população progressista, furou amplamente a “bolha bolsonarista” e tem o repúdio de grande parte dos eleitores de Bolsonaro. O que fazemos diante disto? Grande parte das lideranças e da militância de esquerda, em especial do PT, ao invés de politizar a condenação popular às tentativas de golpe, embarca numa baixaria, numa “molecagem política”. O que mais se vê nas redes sociais é o completo amesquinhamento da luta democrática, transformada em um momento de “vingança” contra as lideranças da extrema direita. Em vez da defesa politizada da democracia, o que vemos são as insuportáveis musiquinhas e dancinhas de comemoração da provável condenação e prisão dos golpistas. Ao invés da defesa da democracia, o que vemos é a apresentação da situação atual como uma “questão policial”, como na cena: “Toc, toc, toc; aqui é a Polícia Federal”. Em vez da defesa da democracia o que vemos são ironias e o deboche como método de combate político. Grandes intervenções em defesa da democracia estão sendo feitas, por incrível que pareça, por personalidades que não são vinculadas ao PT, como Alexandre de Moraes, senador Rodrigo Pacheco, o melhor vídeo sobre a tentativa de golpe e os processos contra os golpistas Se queremos politizar temos munição de sobra: as cenas chocantes do quebra quebra de Brasília e os planos de assassinato de Lula, Geraldo Alkmin e Alexandre de Moraes. São estas imagens e fatos que levaram a que 86% da população condenarem a tentativa de golpe de 8 de janeiro. A defesa da democracia passa pela divulgação de vídeos contundentes das imagens dos golpistas.

A provável condenação e prisão de Bolsonaro é tratada como sendo o “fim da linha” para a extrema direita no Brasil. Só falta “combinar” com os 58 milhões de eleitores de Bolsonaro. A pergunta que faço é a seguinte: quantos votos este amesquinhamento da democracia ganha para uma candidatura progressista, provavelmente de Lula, em 2026? E para as candidaturas majoritárias para governadores e senadores? Veja que situação complexa: Lula venceu, em 2022, com 60.345.999 votos (50,90%) contra 58.206.354 votos (49,10%). Durante dois anos, com bons resultados na economia, a avaliação de Lula ficou, de forma impressionante, estagnada em 51% e, mais recentemente, caiu para cerca de 45%. Veja que tarefa hercúlea: é preciso recuperar parte do eleitorado perdido e furar a bolha do bolsonarismo para se ter uma aprovação mais confortável, entre 55% e 60% da população. A estratégia negativa, de vingança e de deboche não ajuda em nenhuma das duas metas: recuperar eleitores progressistas e furar a bolha da extrema direita. A estratégia negativa, implementada sobretudo por lideranças parlamentares (deputados federais, deputados estaduais e vereadores) pode render muitos votos nas bolhas progressistas, mas estreita politicamente, de forma muito séria, as nossas candidaturas majoritárias a presidente, governadores, senadores, em especial no Sudeste, Sul, norte, Centro-Oeste, que para se elegerem precisam de votos para além da bolha progressita.(…) A extrema direita tem dois objetivos mais importantes: vencer a eleição presidencial, onde continuará muito competitiva, e / ou a eleição para as duas vagas por Estado para o Senado (onde possa por exemplo destituir ministros do STF, principalmente Alexandre de Moraes). O Senado tem duas vagas por Estado, independentemente do tamanho, e situação da esquerda não é favorável nem no Sul e Sudeste, nem nos Estados pequenos, sobretudo do Norte e Centro-Oeste. Além da adoção de uma política mais afirmativa, para barrar a extrema direita no Senado, onde ela vai apoiar apenas dois candidatos, temos que repetir no Brasil o que aconteceu no segundo turno da eleição na França: todos os partidos e setores da Frente Ampla precisarão chegar um acordo em apenas dois candidatos; esta não será uma eleição para marcação de posição e quem tem pouco voto precisa deixar a disputa. Sem isso a extrema direita vai dominar o Senado.

André Singer é contundente: quando a esquerda imita a extrema direita nas redes sociais, falando coisas absurdas, ela deixa de ser esquerda. Confrontado com a afirmação de que “a direita radical se comunica muito bem”, ele respondeu: “Acho que há uma confusão nessa formulação. Não é que o Bolsonaro se comunica bem. É que a internet é muito favorável, como o rádio foi na época do fascismo histórico, para um tipo de comunicação muito direta e muito altissonante. Porque isso chama muito a atenção. Vou dar o exemplo de novo do Trump, que por ser distante é mais fácil. Ele fala coisas absurdas. E uma parte das coisas que ele fala tem só a função de chamar atenção. Porque chamar atenção é o próprio objetivo. Acontece que a esquerda não pode fazer isso. É contra, digamos, a missão da esquerda. A esquerda quer um passo além do capitalismo e da civilização capitalista. Se você começa a comunicar coisas absurdas, você está jogando tudo para trás, o que a extrema direita faz. É regressivo. Se a esquerda adotar esse tipo de conduta, ela se nega enquanto esquerda. Ela não pode fazer isso. É uma questão de para quê ela existe. Aí o problema não é de comunicação. A extrema direita encontrou um espaço neste mundo porque o capitalismo fez as condições regredirem a um tal ponto que propostas absurdas têm um lugar. Porque, de certa forma, o capitalismo contemporâneo transformou a realidade em uma situação absurda. Então, propostas absurdas têm lugar, mas se a esquerda cede a isso, ela deixa de existir enquanto esquerda”. (BBC Brasil, 18/01/2025). Tem formas de fazer sucesso na comunicação sem ódio, vingança e lacração; as redes sociais da prefeita Marília Campos são um exemplo disso.

A democracia é a mais valiosa das conquistas civilizatórias da humanidade; precisamos estar à altura deste combate histórico. O companheiro Ivanir Corgosinho redigiu para a campanha de Marília Campos um texto importante que mostra a relação estreita entre democracia e a luta pela igualdade social. Ele afirma: “As desigualdades sociais são tão antigas quanto as sociedades humanas. Desde tempos imemoriais, as pessoas estão divididas entre os que têm menos e os que têm mais; entre os que têm tudo e os que têm muito pouco: homens livres e escravos; reis e vassalos, ricos e pobres. Da mesma forma, tem sido eterna a luta por igualdade e por sociedades mais justas. Direitos políticos, econômicos e sociais hoje amplamente desfrutados, e que as gerações mais novas consideram óbvios, não existiriam não fosse a indignação e a revolta de nossos antepassados. E, com frequência, custaram o sacrifício de vidas. Apenas com a conquista das democracias, essa luta passou a ser reconhecida como um direito. Por essa razão, a democracia é a mais valiosa das conquistas civilizatórias da humanidade. É a única forma de governo onde as leis e o Estado protegem a liberdade de divergir, de protestar, de reivindicar e de lutar por uma existência mais digna, mais segura e mais feliz. A proteção da dignidade humana e a melhoria da vida são incompatíveis com ditaduras e com regimes autoritários. Pressupõem, ao contrário, a igualdade diante da lei, a igualdade da participação política e a igualdade de condições socioeconômicas básicas, primando especialmente pela inclusão dos que mais precisam, conforme determina a Constituição brasileira”.

Para vencer a extrema direita precisamos politizar a luta em defesa da democracia, romper com o ódio político, com o sentimento de vingança, com a ironia e o deboche. Precisamos resgatar a indignação contra toda forma de regimes autoritários, autocráticos e ditatoriais. Precisamos resgatar o sentimento de esperança do povo brasileiro como fala Fiori: ”Nesta hora, mais do que nunca, é preciso inovar e apresentar com coragem e absoluta clareza, ideias e projetos, mas sobretudo, um “sonho de futuro” capaz de sintonizar com a imaginação e a esperança de todos os brasileiros”. Precisamos colocar mais poesia na luta política. Alguns dirão que isto é uma ingenuidade. Tenho 50 anos de militância política. Militei 10 anos sob a ditadura militar; fui processado na Lei de Segurança Nacional – LSN, pela greve de 1979 dos bancários de BH e Região. Há pouco mais de um ano precisei de um “atestado de bons antecedentes”, fui na internet tirar o documento e me foi negado porque constava lá meu enquadramento na LSN; tive que ir até a Justiça Federal dar baixa no processo. Se tem uma coisa que marcou minha vida foi a poesia em nossos movimentos. Éramos entristecidos e enrijecidos com a dureza da luta em condições tão difíceis. Mas a poesia marcou minha e a vida de toda a militância que lutou contra a ditadura militar. Na campanha das diretas já, Coração de Estudante, de Milton Nascimento, marcou nossas vidas: “Já podaram seus momentos / Desviaram seu destino / Seu sorriso de menino / Quantas vezes se escondeu / Mas renova-se a esperança / Nova aurora a cada dia / E há que se cuidar do broto / Pra que a vida nos dê / Flor, flor e fruto(…) Coração de estudante / Há que se cuidar da vida / Há que se cuidar do mundo / Tomar conta da amizade / Alegria e muito sonho / Espalhados no caminho / Verdes, planta e sentimento / Folhas, coração / Juventude e fé”.(…) Na campanha de Lula, em 1989, a emoção foi ainda maior. Fomos surpreendidos pelos poetas com o jingle “Sem medo de ser feliz”: “Passa o tempo e tanta gente a trabalhar / De repente, essa clareza pra votar / Quem sempre foi sincero em confiar / Sem medo de ser feliz, quero ver chegar / Lula lá, brilha uma estrela / Lula lá, cresce a esperança / Lula lá, o Brasil criança / Na alegria de se abraçar / Lula lá, com sinceridade / Lula lá, com toda a certeza pra você / Meu primeiro voto / Pra fazer brilhar nossa estrela / Lula lá, é a gente junto / Lula lá, valeu a espera / Lula lá, meu primeiro voto / Pra fazer brilhar nossa estrela”. Lembro-me da surpresa nas primeiras audiências desta canção. Fiquei perplexo com a poesia. Mais tarde entendi meus sentimentos: Sem medo de ser feliz foi a poesia que expressou a nossa esperança, foi a “descompressão” psicológica e existencial depois de mais de vinte anos de ditadura militar. Inesquecível, e lembro como hoje: Eu, Natália, Marília com o Pedro no colo, no final de um comício de milhares na praça da Estação, em 1989, começamos a dispersão com uma chuva fininha e todos vindo em caminhada em direção à praça Sete e cantávamos “Sem medo de ser feliz”. Repito: chega de baixaria da esquerda, de ódio, de deboche, de sentimento de vingança. Precisamos estar à altura do combate histórico em defesa da democracia! Veja os grandes movimentos de massa no Chile, na Alemanha, na França onde milhares de pessoas se reúnem ao som de canções marcantes em seus países.

Para continuar mudando o Brasil, o PT precisa mudar radicalmente; nosso Partido não pode continuar como uma frente de parlamentares, mas deve ser a principal âncora e referência da politização e da organização popular. Precisamos partidarizar os mandatos parlamentares e construir direções mais representativas; este é um dos maiores desafios que vai definir o futuro do PT. O Brasil é um dos poucos países grandes do mundo que adota a lista aberta, onde os eleitores “votam na pessoa” e não na “lista partidária”. Até mesmo nos países onde se tem o voto distrital a representação é mais politizada porque o voto é partidário no candidato do partido, sendo o principal defeito neste caso que o voto não é proporcional. Em outros países se adota o regime misto, que combina o voto em lista com o distrital. O modelo brasileiro tem uma grande vantagem, como sempre apontou o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos, que ele possibilita uma renovação partidária em um país com uma cultura política frágil. Mas a lista aberta e o predomínio quase absoluto dos parlamentares sobre a vida partidária precisa ser modificado profundamente. Os parlamentares monopolizam tudo: a representação nos nossos governos; os cargos nos legislativos; os cargos nas instâncias partidárias; as finanças partidárias e para as eleições. E mais ainda: a lista aberta é autofágica porque como o adversário de um parlamentar do partido é outro parlamentar do próprio partido se reparte a máquina partidária entre todos, mas ninguém lidera quase nada. Cada um cuida da “sua própria vida”. Não tem um planejamento coletivo; é cada um para si e muitos vezes os cargos exercidos por parlamentares se misturam com seus mandatos. Este tipo de partido verticalizado, sem a presença forte de segmentos representativos da sociedade (militantes sociais, intelectuais, técnicos respeitados) não dá conta das enormes tarefas de reconstrução partidária. José Dirceu, em discurso recente, afirmou ser imprescindível uma reforma política. Mudar o sistema político não é fácil porque o povo gosta de votar na pessoa e não no partido e os deputados que se elegem na lista aberta não concordam em mudar o nosso modelo político eleitoral.

Então o melhor é, por dentro do atual modelo político, realizar modificações que fortaleçam o PT e suas direções. Em Contagem temos uma ótima experiência: o ponto central de nossa reorganização foi a constituição de uma direção muito representativa de nosso acúmulo na Cidade, com membros da Executiva do Partido, três de nossos principais formuladores, nomes representativos do governo Marília, vereadores e vereadoras. Este time ganhou uma enorme ascendência e credibilidade política na cidade, junto à militância petista, junto aos nossos vereadores e vereadoras e também junto ao governo Marília Campos e foi quem coordenou nossa vitoriosa campanha para a prefeitura. Marília retribuiu a este bom desempenho da direção partidária e, na formação de seu novo governo, empoderou o PT Contagem e demais partidos que coordenaram as indicações para o governo de todos os cargos, inclusive da maioria do secretariado. Se depender de mim, no processo PED teremos uma chapa unificada e as escalação de nossos melhores quadros para a direção partidária. O PT Contagem é provavelmente o melhor PT do Brasil, com reconstrução baseada em cinco eixos: trabalho de base, formação política, comunicação virtual e presencial, finanças expressivas e organizadas e partido como o espaço do encontro, com o boteco do PT Contagem.

Os possíveis candidatos e coligações para as eleições presidenciais de 2026. Comecemos primeiro pelos caminhos que serão seguidos pelos partidos de centro direita e de direita, que não tem projetos nacionais; são partidos mais próximos de Federações Estaduais. Fizemos uma pesquisa das últimas nove eleições presidenciais, que mostram o seguinte: a) quando a polarização era entre PT, centro esquerda, e PSDB, centro direita, não tínhamos no Brasil a divisão regional que temos hoje, PT e PSDB eram fortes em todas as regiões, e, com isso, os partidos de centro se uniam nas eleições e nos governos a quem governava: FHC, Lula, Dilma. Ou seja, sem uma polarização nacional mais aguda, as “federações estaduais” tinham mais facilidade de compor projetos mais à esquerda e mais à direita; b) quando surgiu a polarização mais radical, a partir de 2015, a política no País ganhou uma clivagem regional muito clara, com o PT liderando o Nordeste e a direita, o Sudeste e Sul; nestas condições ficou difícil compor uma estratégia das “Federações estaduais”, que são os partidos de centro. Ou seja, se o candidato é do PT tem muitos apoios nos partidos de centro no Nordeste, no Norte e em parte do Sudeste (Minas e Rio de Janeiro); e, inversamente se o candidato é de direita ou de extrema direita, os partidos de centro conseguem apoios no Sudeste e Sul, mas racham no Nordeste, Norte e parte do Sudeste.

Veja resumidamente como isto se deu até 2010, quando tínhamos quatro partidos que ancoravam os governos de coalização: PSDB e PFL (DEM), PT e MDB.(…) Na eleição de 1994, FHC venceu com o apoio do PSDB e PFL; o PT disputou com Lula com apoio somente de partidos de esquerda e de centro esquerda; o PMDB lançou Orestes Quércia.(…) Na eleição de 1998, FHC foi reeleito, com numa coligação, mais uma vez, encabeçada pelo PSDB e PFL (DEM); Lula disputou pelo PT e com pequena coligação.(…) Na eleição de 2002, Lula disputou e venceu pela força popular de sua candidatura, mas com pequena coligação do PT com o PL, de Valdemar da Costa Neto (que indicou Zé Alencar para a vice de Lula) e outros pequenos partidos; o adversário foi José Serra pela coligação PSDB e PMDB.(…) Na eleição de 2006, Lula, depois de enfrentar uma enorme crise política, disputou com uma pequena coligação de PT, PRB, PCdoB; o adversário foi Geraldo Alckmin, da coligação liderada pelo PSDB e PFL.(…) Na eleição de 2010, Dilma disputou e venceu com uma coligação mais ampla, ancorada pelo PT e PMDB; o adversário foi José Serra, pelo PSDB e DEM e outros pequenos partidos.(…) Em 2014, Dilma disputou novamente e venceu com uma ampla coligação, liderada pelo PT, PMDB, PSD, PP e mais cinco partidos de esquerda e de centro.(…) Como se vê, no período de 1994 a 2014, tendo o Brasil uma polarização mais moderada e sem clivagem regional muito forte, os partidos de centro e de direita, especialmente o DEM e MDB, se posicionaram formalmente nas disputas eleitorais, não abalando a forma de “federações estaduais” destes partidos.

A partir das eleições presidenciais de 2018 e em 2022, sendo a polarização mais acentuada, com uma forte clivagem regional do voto, ficou difícil para os partidos de centro, como federações estaduais que são, se posicionarem formalmente e de forma unificada nas eleições devido às divergências regionais. Ou seja, os partidos de centro nas regiões Nordeste e em parte do Norte e Sudeste são mais próximos do Lulismo; nas regiões Sudeste e Sul são mais próximos ao Bolsonarismo. Daí porque nas duas eleições buscaram evitar a polarização e apostaram numa estratégia de terceira via, que não teve resultados positivos.(…) Na eleição de 2018, Bolsonaro venceu com uma coligação de dois pequenos partidos: PSL e PRTB; o adversário principal foi Fernando Haddad, também com uma coligação pequena do PT, PCdoB e PROS. Os partidos de centro, como terceira via, fracassaram. Geraldo Alckmin, numa coligação de nove partidos, dentre eles, o PSDB, PP, PR, DEM, PSD, teve uma votação pífia de apenas 4,76% dos votos. (…) Em 2022, Lula candidatou e venceu numa coligação do PT com o apoio de oito pequenos partidos, mas sem nenhum grande partido de centro. Bolsonaro disputou numa coligação do PL, PP Republicanos. A terceira via, mais uma vez, fracassou em 2022. Simone Tebet disputou na coligação liderada pelo MDB e PSDB, com votação muito baixa de apenas 4,16% dos votos; Soraya Thronicke, do DEM, ficou com apenas 0,51% dos votos.

Como se vê, os partidos de centro, grandes protagonistas nos Estados, nos municípios, e no Congresso Nacional tem grandes dificuldades de posicionamento nas eleições presidenciais, especialmente o MDB, PSD e União Brasil. As tentativas de construção de uma terceira via, neste momento histórico estão fadadas ao fracasso; as articulações para “herdar os eleitores de Bolsonaro”, que está inelegível e deverá ser preso, tem poucas chances de prosperar porque Bolsonaro, tudo indica, não vai “emprestar o capital político” para lideranças que não sejam de sua família, e isto dificulta candidaturas como de Tarcísio Freitas, Ronaldo Caiado, Romeu Zema, Gustavo Lima, Ratinho, e outros.

O mais provável, em minha opinião, e que está acontecendo, é que Bolsonaro repita a estratégia de Lula de 2018, mantenha a candidatura até o limite possível para fechar espaço para outras alternativas de direita e, quando isto não for mais possível, vai indicar um de seus familiares, possivelmente o senador Flávio Bolsonaro (PL/RJ) para candidato a presidência. Tudo indica que coligação será ancorada pelos mesmos partidos de 2022: PL, PP e Republicanos; Ciro Nogueira, do PP, pleiteia a candidatura a vice-presidente. E claro que Bolsonaro articula uma frente ampla de direita no segundo turno para tentar vencer a eleição e joga pesado numa aliança do PL e bolsonaristas dos partidos de centro em duas candidaturas por Estado apenas para o Senado, numa espécie de “chapa para o Senado” buscando constituir uma maioria bolsonarista no Senado.(…) A candidatura de Lula, tudo indica, vai fazer uma coligação muito parecida com aquela de 2022, liderada pelo PT, PSB, mais sete partidos menores de esquerda e centro esquerda; uma possibilidade é a incorporação do PDT na coligação. No Senado, como dissemos, a esquerda deve adotar uma estratégia parecida com o segundo turno na França, apresentando apenas dois candidatos com força nas urnas, sendo que não tem nenhum espaço para marcação de posição, candidaturas com poucos votos precisam ser retiradas. Portanto, realisticamente, a Frente Ampla é necessária, mas não terá a adesão formal e unificada de grandes e médios partidos de centro; o que acontecer é uma maior articulação com o centro naquelas regiões e Estados onde o centro é mais lulista, como no Nordeste, no Norte e em dois Estados chaves do Sudeste (Rio de Janeiro e Minas Gerais).

José Prata Araújo é economista.

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