Tenho um enorme respeito pelos sindicatos; fui sindicalista nos grandes movimentos sociais nas décadas de 1970, 1980 e 1990. Fui um dos fundadores da Central Única dos Trabalhadores – CUT e do Partido dos Trabalhadores – PT. Sou contra o “fogo amigo” e também contra o “fogo inimigo”. Não gosto de política com lacração, com deboche, como “gesto de vingança”. Sou adepto da política afirmativa, o que muitos consideram uma postura ingênua. Não é. Quando defendo a ‘esperança de futuro’, um novo caminho a seguir, faço política afirmativa, mas, também, indico rupturas com as propostas e líderes de direita e de extrema direita que quero enfraquecer e derrotar. Por isso mesmo, sempre fui radicalmente, no passado e no presente, contra os “escrachos políticos” seja contra nossos adversários ou nossos aliados. As maiores vítimas dos “escrachos” são as crianças filhas de quem está sendo atacado, como é caso do meu filho mais novo quando criança e agora mais recentemente.
A esquerda não pode fazer coisas absurdas como os “escrachos” porque deixa de ser esquerda. Penso como André Singer, sociólogo e grande estudioso do petismo, quando a esquerda imita a extrema direita nas redes sociais, falando coisas absurdas, fazendo escracho, lacrando, ela deixa de ser esquerda. Confrontado com a afirmação de que “a direita radical se comunica muito bem”, ele respondeu: “Acho que há uma confusão nessa formulação. Não é que o Bolsonaro se comunica bem. É que a internet é muito favorável, como o rádio foi na época do fascismo histórico, para um tipo de comunicação muito direta e muito altissonante. Porque isso chama muito a atenção. Vou dar o exemplo de novo do Trump, que por ser distante é mais fácil. Ele fala coisas absurdas. E uma parte das coisas que ele fala tem só a função de chamar atenção. Porque chamar atenção é o próprio objetivo. Acontece que a esquerda não pode fazer isso. É contra, digamos, a missão da esquerda. A esquerda quer um passo além do capitalismo e da civilização capitalista. Se você começa a comunicar coisas absurdas, você está jogando tudo para trás, o que a extrema direita faz. É regressivo. Se a esquerda adotar esse tipo de conduta, ela se nega enquanto esquerda. Ela não pode fazer isso. É uma questão de para quê ela existe. Aí o problema não é de comunicação. A extrema direita encontrou um espaço neste mundo porque o capitalismo fez as condições regredirem a um tal ponto que propostas absurdas têm um lugar. Porque, de certa forma, o capitalismo contemporâneo transformou a realidade em uma situação absurda. Então, propostas absurdas têm lugar, mas se a esquerda cede a isso, ela deixa de existir enquanto esquerda”. (BBC Brasil, 18/01/2025). Tem formas de fazer sucesso na comunicação sem ódio, vingança, lacração e escracho; as redes sociais da prefeita Marília Campos são um exemplo disso.
Vou tratar neste artigo da história de forma invertida; do presente para o passado. No final conto um pouco de um dos maiores dramas de minha família que foi o “escracho político e pessoal”, feito pela direção sindical, que sofreu o nosso filho mais novo quando, no período em Marília foi prefeita no período de 2005 a 2012. Ele estudou inicialmente na Escola Vasco Pinto e depois na escola Eli Horta e foi duramente pressionado por ser o “filho da prefeita”.
Direções do SindUte Contagem tem uma tradição de “escrachos”. Pois bem, o SindUte Contagem (falo aqui de suas direções e principais militantes e não dos professores em geral) têm uma cultura política muito arraigada da “gozação” e do “escracho político”, sobretudo dos secretários de educação e da Marília. Escracham vinculando os nomes destas pessoas à maldades: MÁrília; LindoMAL, TelMá; adaptaram a música “Tá na hora do Jair já ir embora”, a música anti-bolsonarista, para a Marília com letra sobre o piso salarial; e frequentemente utilizam os familiares da Marília, sobretudo eu e meu filho mais novo, para atacar a prefeita. E claro: vinculam Marília, de forma completamente injusta e desrespeitosa, à direita como no caso de Romeu Zema. Marília, como divulgamos recentemente é o oposto de Zema na política para os servidores: com Marília, os gastos de pessoal, de 2021 a 2024, subiram 54%, mais que a receita municipal que subiu 51%. Os sectários dizem que Marília é igual a Romeu Zema. Taí os números de Zema em seis anos: a receita subiu 83,62% e as despesas de pessoal, totalmente arrochadas, subiram apenas 34,44%. Os sectários ao igualarem Marília a Zema, passam o pano, vergonhosamente, para o governador. Marília concedeu, no seu terceiro mandato, 52% de reajustes para os professores, o dobro do concedido nos oito anos dos dois governos anteriores. (…) Chegaram a escrever recentemente, depois retiraram o texto, sugerindo que a vitória da extrema direita em Contagem não seria diferente daquilo que Marília tem feito; até pelo contrário, a extrema direita daria um caráter de mais “naturalidade” às políticas implementadas pela Marília. É esta “neutralidade economicista” que explica que agora, no dia 25 de março, dia do julgamento de Bolsonaro, na porta da Câmara Municipal, o SindUte Contagem abrir o microfone para um vereador da extrema direita local fazer duríssimas acusações éticas à Marília. Não foi publicado nas mídias sociais do Sindicato, mas o vereador divulgou no instagram dele. Inacreditável!
No “escracho”, em 2023, SindUte denunciou Marília no Tribunal de Contas na questão do piso salarial, perdeu a ação e voltou a ira contra a família da Marília. Sofremos eu, José Prata, e meu filho mais novo, um outro “escracho político” da direção do SindUte, há dois anos atrás, em 2023. Escracho no meu perfil pessoal no Facebook, foram mais de 400 comentários dos nossos críticos e meu e do meu filho nos defendendo. O motivo da ira foi que dei publicidade, de forma serena e sem provocação, à decisão do Tribunal de Contas de Minas – TCE de que Contagem, com Marília, cumpria com sobra o piso salarial proporcional. Um militante nos criticou duramente: “Grande legado de um partido que resolveu se esconder nas interpretações jurídicas de um judiciário sempre a serviço do capital. Parece mesmo que a utopia, coragem e a luta de classes que deu origem ao PT ficou no passado”. Mas o “detalhe” é que não foi Marília que acionou o TCE, foi a direção do SindUte Contagem. No final de dezembro de 2021, o SindUte Contagem entrou com uma denúncia no Tribunal de Contas contra a prefeita Marília Campos, afirmando que “o município de Contagem não assegura o pagamento do Piso Salarial Nacional aos servidores do Magistério, descumprindo legislação federal”; o TCE, como dissemos, não acatou a denúncia e definiu pela legalidade do piso salarial de Contagem. O deputado Rogério Correia, à época, apoiou a posição de Marília, em um depoimento que divulgamos nas rede sociais: “Contagem a jornada é 22 horas se não me engano. E na legislação local não tem obrigatoriedade de pagamento de piso nesta jornada, diferente do Zema onde temos a jornada de 24 horas em lei e constituição. Além disto a Marília deu bons reajustes, diferente do Zema. Igualar não é justo e nem boa política”.
No final de 2021, sindicalistas quiseram criminalizar Marília pelo crime de improbidade administrativa com inelegibilidade de oito anos. Vale ressaltar ainda que, ainda no final de 2021, o SindUte Contagem denunciou a prefeita Marília Campos no TCE alegando o não cumprimento dos gastos de 25% com educação. Evidentemente, sem aulas em função da pandemia, não tinha forma dos municípios gastarem o mínimo constitucional naquele ano. Mas o Sindicato, ao exigir o cumprimento da norma constitucional, agiu politicamente para forçar a criminalização da prefeita, pelo crime de improbidade administrativa, que se fosse reconhecido pelo Tribunal poderia levar a inegibilidade da prefeita Marília Campos por oito anos, além de outras punições administrativas e criminais. Isto mesmo: o SindUte Contagem queria condenações da Marília porque a petista não conseguiu gastar, o que era uma impossibilidade, os recursos da educação no ano da pandemia. Felizmente, o Congresso Nacional, por unanimidade, frustrou o SindUte Contagem aprovando a Emenda Constitucional 119/2022 que tem uma clareza que deveria envergonhar nossos dirigentes sindicais: “Em decorrência do estado de calamidade pública provocado pela pandemia da Covid-19, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e os agentes públicos desses entes federados não poderão ser responsabilizados administrativa, civil ou criminalmente pelo descumprimento, exclusivamente nos exercícios financeiros de 2020 e 2021, do disposto no caput do art. 212 da Constituição Federal.(…) Para efeitos do disposto no caput deste artigo, o ente deverá complementar na aplicação da manutenção e desenvolvimento do ensino, até o exercício financeiro de 2023, a diferença a menor entre o valor aplicado, conforme informação registrada no sistema integrado de planejamento e orçamento, e o valor mínimo exigível constitucionalmente para os exercícios de 2020 e 2021.”(…) O disposto no caput do art. 119 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias impede a aplicação de quaisquer penalidades, sanções ou restrições aos entes subnacionais para fins cadastrais, de aprovação e de celebração de ajustes onerosos ou não, incluídas a contratação, a renovação ou a celebração de aditivos de quaisquer tipos, de ajustes e de convênios, entre outros, inclusive em relação à possibilidade de execução financeira desses ajustes e de recebimento de recursos do orçamento geral da União por meio de transferências voluntárias”. Um sindicato de esquerda defendendo cassar uma prefeita de esquerda, em uma posição à direita do Congresso Nacional. Inacreditável!
No “escracho” de 2023 equipararam a família da Marília à família Bolsonaro. No escracho que sofremos em 2023, minha família foi desrespeitada, de forma nojenta, por militantes do SindUte Contagem de ser a Famarília, uma família parecida com a Família Bolsonaro, ou Familícia, como é tratada por alguns internautas. Um militante escreveu: “Que jogo sujo! Pedrada em Zema e mão na cabeça da Marília. A verdade é uma só Zema não paga o piso, Marília também não. A Família Bolsonaro o defendia a qualquer custo. A Familia Marília Campos também. Não quer ser comparada? Então faça melhor! #pagueopisomarilia. Em breve a cidade toda vai saber disso! Amanhã grande mobilização dos professores mostrando a verdade para a população!”. Outro militante escreveu em polêmica com meu filho: “Fica só assumindo brigas aqui que nem são suas kkkkkkkkkkkkkkkk entendi. Cuidado para não ser comparado aos filhos do Bozo!”. Veja só como o escracho é despolitizado e inaceitável: “não quer ser comparado com Bolsonaro, então pague o piso”; ou seja, a comparação com Bolsonaro é puro oportunismo economicista.(…) Eu protestei contra a comparação da minha família com a família Bolsonaro: “”FaMarília, sua crítica é desrespeitosa e vergonhosa. Prezamos sim sermos uma família de esquerda; você quer o que? Que deixemos a Marília sozinha atacada pela direita e por sectários de esquerda como você? Você como historiador deveria antes de fazer críticas nojentas como esta saber o seguinte: FaMarília é uma sacanagem; com uma mulher que rompeu com todos os privilégios, que tem uma vida simples e austera; um marido e filhos que nunca trabalharam na Prefeitura; Marília nunca praticou nepotismo. Estude um pouco de nossa história antes de fazer críticas anti-históricas”.
Um militante, no “escracho” de 2023, afirmou que a vida simples e austera que pregamos na política é a “glamourização da miséria”. Disse ele: “José Prata esse tipo de originalidade cansa Prata. Isso é mais velho que cagar no mato. Esse papo de austeridade me lembra o Choque de Gestão, é papo de Neoliberal. O que espero de um futuro socialista é menos horas de trabalho e menos privilégios para os ricos. Não é humilhação nenhuma comer pão com salame. O problema é chegar na escola e precisar fazer uma vaquinha pra comprar café bom, porque a prefeitura cortou até o café ruim que ela mandava e colegas professores não terem condição de participar da vaquinha porque está faltando em casa. Não dá pra levar a sério esse papo de austeridade. A dureza da vida é o nosso dia a dia. Vocês realmente não entendem e se juntam a Globo na glamourização da pobreza. É lamentável”.(…) Outro militante escreveu em resposta ao meu filho: “O que você fala suja sua mãe sim, ao contrário do que você pensa, revela a mentalidade da família da prefeita. O que está por trás dessa postura austera, demagógica e ultralegalista. Você e seu pai não estão no time dos professores, nem dos trabalhadores”.(…) Sempre defendi ao longo de minha vida, como Pepe Mujica, de que “o socialismo, mais que um projeto de sociedade, é uma forma de vida”. Certa vez, Pepe Mujica, grande líder da esquerda latino americana e mundial, perguntado o “que faria diferente em sua vida”, afirmou: “Sou um líder socialista. Eu obrigaria todo o pessoal de confiança a colocar 5% a 10% para um fundo para fazer casas para os pobres. Eu colocava 80% do meu salário para fazer casas para os pobres. Eu colocava 80% do meu salário de presidente. Não fazia isso para me mostrar aos outros, mas para ter o direito moral de falar aos ricos que façam algo. Você tem de dar o primeiro passo”. Liderar pelo exemplo é lindo, mas os sectários e lacradores nunca irão entender. Viva Pepe Mujica!
Quem inventou o “escracho” da “Marília das Praças” não foi a extrema direita, foi a diretoria do SindUte Contagem. Mas foi nos dois primeiros governos da Marília, de 2005 a 2012, que os “escrachos” foram mais violentos. O escracho “Marília das Praças”, ainda utilizado pela extrema direita até hoje, para desmerecer a nossa maior liderança política foi criação da diretoria do SindUte Contagem nos anos de 2008 e 2009; quando foi editada uma cartilha pela entidade, pregando que a prioridade de Contagem era a dedução e não as praças, “única coisa que Marília fazia”. Marília transformou e humanizou Contagem enfrentando uma séria oposição da direita e também da esquerda, especialmente do PSOL e PSTU. A Contagem desenvolvimentista que Marília herdou focava na economia e pouco no bem estar da população, sem lazer, cultura e esportes. A esquerda de Contagem, historicamente, era muito economicista e via também tudo em função do desenvolvimentismo: educação “para o trabalho”; saúde “para recuperar as pessoas para o trabalho”. Na época protestei contra o SindUte Contagem, recomendando a leitura do livro “O direito à preguiça”, de Paul Lafargue. E não é que esta visão economista tem continuidade histórica ainda hoje com a extrema direita e até mesmo com militantes de esquerda. Veja o que escreveu um militante do SindUte no “escracho” que sofremos em 2023, “escracho” que tratei anteriormente: “Piso Integral! Piso não é teto! Menos do que piso anual é buraco. Quero também menos burocracia na escola. Quero mais direitos para quem estende jornada. Menos privatização e precarização na educação e serviços. Quero mais contratação de professores, pois a prefeitura tá deixando criança sem professoras. Menos show, marketing, propaganda, puxa saco e festa, discurso, etc. Quero valorização real”. Na época, eu respondi: “Você fez uma fala anti-cultura e anti-lazer; tudo pela “valorização real”, ou seja, tudo pelo salário? Vai entender…”.
“Marília das praças” reajustou, entre 2005 e 2012, os salários dos professores em 170% e 212%. A “Marília das praças”, dos dois primeiros governos, de 2005 a 2012, era uma baixaria inexplicável. Marília revolucionou a educação em Contagem. Marília construiu e inaugurou 14 novos Cemeis e deixou outros sete em construção; inaugurou seis escolas de ensino fundamental; reformou 67 escolas já existentes; Marília conseguiu com Lula um Cefet para Contagem; implantou o KIT Escolar; foram 3.948 servidores efetivos nomeados na educação; quase todo o mobiliário escolar foi trocado; diretores escolares tiveram grandes reajustes. Para se comparar o esforço do Governo Marília Campos pela valorização do magistério, basta comparar os salários praticados em Contagem antes e depois de seu governo. Em 2004, os professores PEB 1 habilitados (1ª a 4ª séries) ganhavam R$ 609,00 e passaram a receber R$ 1.902,01 em 2012, um reajuste nominal de 212% e real, acima da inflação, de 110%. Já os professores PEB II (5ª a 8ª séries) recebiam, R$ 704,00 e passaram para R$ 1.902,01, um reajuste nominal de 170% e real de 80%. Vale ressaltar também que em Contagem no Governo Marília Campos os professores da educação infantil (alunos de 4 e 5 anos) foram equiparados aos demais professores da educação e receberam R$ 1.902,01 de vencimento base. (…) Os avanços dos salários dos professores foi tão expressivo, que, em 2012, último ano do segundo governo, aconteceu uma fato inusitado. O SindUte aprovou uma pauta de reivindicação que era considerada “impossível” de ser atendida: reajuste dos salários pelo índices do DIEESE retroativo a 1996, ou seja, foi pedida uma reposição retroativa há 16 anos. Foi formulada a pauta de reivindicação, mas não foram feitos os cálculos de qual seria o reajuste a ser pleiteado. Marília deu um reajuste de 20% no último ano de governo, o acumulado nos dois governos foi, como vimos, de 170% a 212%, os salários chegaram a R$ 1.902,01. Já a reposição pelo DIEESE, pedida pelo Sindicato, depois de feitos os cálculos, ficou entre R$ 1.500,00 a R$ 1.700,00, muito abaixo da oferta do governo Marília. Foi a primeira vez que eu vi na vida onde o empregador fez uma oferta acima da pauta de reinvindicações do Sindicato. E ainda assim, o governo Marília foi “escrachado”. Inacreditável!
“Escracho” agora em 2025: Sindicato, com a expressão “não somos vagabundos e vagabundas” politizou questões familiares e vinculou o xingamento à Marília. Voltando agora para a atualidade falo do “escracho” que minha família sofreu novamente agora no mês de março de 2025, com o SindUte Contagem vinculando, em vídeos e cards, Marília ao protesto de que “não somos vagabundos e vagabundas”, deixando a entender que seria esta uma afirmação da prefeita. Neste ano me afastei do debate com a diretoria e militância do SindUte Contagem e recomendamos taxativamente ao nosso filho que fizesse o mesmo. Cheguei, duas vezes, a publicar comentários em defesa da Marília, sendo o principal deles de que a prefeita valorizava a educação sim quando, em seu terceiro governo, concedeu 52% aos professores para uma inflação de 27%. Publiquei e apaguei os comentários. Por que recuei? Era, como se diz, uma “bola cantada”. Se eu entrasse na polêmica, meu filho também entraria em defesa da Marília e a história se repetiria: seriámos chamados de “Família”, como no “escracho” de 2003, e comparados com a Família Bolsonaro. Meu filho, contrariando nossa orientação, entrou nas mídias sociais da Marília, defendeu as ideias dele, mas errou muito, com xingamentos. Pedimos desculpas à direção do SindUte Contagem por isso.(…) Mas o meu filho foi também profundamente desrespeitado.(…) Veja alguns dos comentários: “Força guerreiro, procura uma terapia”; “Nada pessoal contra o filho da prefeita, nem mesmo com ela. Mas o filho provavelmente reproduz o que os pais conversam em casa, vemos isso em sala de aula todos os dias”; “não compensa responder playboy, filho do governo, herdeiro do trono. Deixa que se queime sozinho, na luta a gente se vê”; “o filho da Marília está certo, errado é o médico que deu alta”; “Perturbado tá dando showzinho aqui. Totalmente desequilibrado. Procure terapia urgente e mantenha a sua medicação em dia”. Tenho certeza que os professores e professoras, em suas escolas, não usam expressões tão inadequadas como estas para enfrentar os enormes desafios de educar nossos jovens. Deixando claro: é uma minoria barulhenta que patrocina os escrachos contra nossa família, quer é utilizar nosso filho para atingir a Marília.
Meu filho mais novo, o Vinicius Campos Araújo, estudou em escola municipal nos dois primeiros mandatos da Marília e sofreu duro “escracho” por ser o “filho da Marília”. Eu, José Prata, sofro muito, meu coração fica dilacerado, com os “escrachos” que minha família sofreu, de 2005 a 2012, e agora, de 2021 a 2025, das direções e dos principais militantes do SindUte Contagem. Todo início de ano, quando a Marília está governando, é a mesma situação e o mesmo sofrimento. No livro que ajudei na redação, recentemente, “O Brasil olha para Contagem”, previ novas baixarias no início de 2025 e cobrei da direção estadual do PT e dos deputados petistas vinculados aos professores, que ajudassem a acabar com as baixarias contra a Marília e minha família em Contagem. Digo: baixarias de alguns poucos dirigentes e militantes, que nada tem a ver com a categoria que recebe muito bem a Marília nos locais de trabalho e, acredito, que reconhece os enormes avanços na educação nos seus governos. Os sectários são covardes: fazem baixarias não como um gesto individual, mas com o objetivo político de desgastar a Marília em toda a categoria. Veja os nomes nas redes sociais, são sempre cinco, dez ou quinze pessoas, que dizem representar toda a categoria.(…) Por que vivo um enorme drama familiar? Eu e Marília, nos inspiramos muito na forma de ser e viver com lideranças como Pepe Mujica, Olívio Dutra, e, sobretudo, nosso grande mestre que foi Fausto Drumond, já falecido, ex-presidente do Sindicato dos Bancários. Com eles aprendemos que “o socialismo, mais que um projeto de sociedade, deve ser uma forma de vida”. Prezamos por um “sentido de igualdade” em nossa militância política, “sem paixão pelo poder”, a política para nós só tem sentido se estiver a serviço do “bem comum”. Nas discussões familiares, sempre fui o mais intransigente na defesa de que nossos filhos deveriam estudar em escolas públicas, nossa aposentadoria deveria se dar pelo INSS sem os privilégios dos deputados; cultivamos hábitos simples de caminhar pela cidade; gostamos de cozinhar e fazer bolos e doces para a família; devolvemos privilégios que somarão R$ 5 milhões ao longo da nossa vida; gostamos de viajar para a Praia – Rio de Janeiro ou Guarapari – de ônibus; Marília presta contas mensalmente de seu contracheque nas redes sociais; o salário da prefeita, mesmo sendo uma cidade grande, é pouco mais da metade de um deputado federal e os reajustes são os mesmos dos servidores efetivos; estimulamos em nossa família o trabalho voluntário de ajuda à comunidade; na pandemia “repartimos o pão” e doamos R$ 18 mil para cestas básicas de quem passava fome. Muita gente não entende, mas é este “sentido de igualdade”, o poder “a serviço do bem comum” que explica, em grande medida, a longevidade da liderança da Marília, que depois de 45 anos de militância e 63 anos de idade recebeu a consagração popular, com vitória em primeiro turno nas oito regiões, depois de 40 anos vencemos no Ressaca e Nacional, vencemos em 64 dos 66 bairros e vencemos de lavada entre os nossos vizinhos do bairro Eldorado.
Acontece que nos primeiros dois governos da Marília, de 2005 a 2012, a situação de Contagem era infernal, com a cidade quebrada, com receitas inexpressivas, a quarta cidade mais endividada do Brasil, despesas descontroladas, e quase nenhuma capacidade de investimento. Nos dois primeiros anos, a desaprovação da Marília era ampla, e a frase que corria, de boca em boca na cidade, era “essa mulher não faz nada”. Vinicius estudava na Escola Municipal Vasco Pinto e esta situação pressionava a vida do “filho da prefeita”; situação que se agravou demais com a estratégia da direção sindical de priorizar sempre a escola onde estudava o “filho da prefeita”. Uma criança de 8 anos… Na Europa, da social democracia, político que não colocar seus filhos nas escolas públicas é motivo de grandes críticas; no Brasil filho de político que ocupa cargos públicos mais elevados sofre muito.(…) Por isso peço perdão ao Vinicius por não tê-lo protegido na escola da selvageria sindical com nome de sindicalismo; o correto seria tê-lo matriculado na Escola Helena Guerra, escola estadual, onde estudaram todo o ensino fundamental meus dois filhos mais velhos; lá ele não seria o “filho da governadora” a ser perseguido pelo sindicalismo sectário. E meu coração ficou partido nos últimos dias, quando Vinicius foi massacrado nas redes sociais e, eu para não ampliar as polêmicas, o deixei sozinho. Foram uns 20 contra um. Sozinho veja só: nas redes sociais da mãe prefeita. Muitos dizem que quando a pessoa se torna uma figura pública ela precisa estar aberta às críticas. Isto é verdade, mas não é o caso dos “lacradores”. Veja só as mídias sociais do SindUte Contagem, quase ninguém comenta, debate, são um, dois, três comentários no máximo. A preferência é pelos “escracho” na página da prefeita, utilizando o filho e o marido, quando eu apareço lá, como “buchas de canhão” para atingir a Marília. A preferência é também pelos perfis pessoais de nossa família, como aconteceu em 2023 com o “escracho” no meu perfil do Facebook.
Espero que o Vinicius compreenda que nunca defendi a matrícula dele em escola pública como uma forma de “experimentação”, como um “factoide” para melhorar a aprovação da mãe dele. É a forma de ser e viver em que acredito ser mais correta; mas que muita gente de esquerda despreza, como um militante que me acusou minha “postura austera, demagógica”. Viva Pepe Mujica! (…) Mas, por incrível que pareça, Vinicius, quando pode escolher, ele decidiu voltar a escola pública, desta vez a Escola Estadual Firmo de Mattos, onde se formou no ensino médio. Vinicius é um jovem muito talentoso; continuou na escola pública, na Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, onde está concluindo o curso de geografia. É um grande redator, no último mandato de deputada estadual da Marília publicou diversos artigos no Blog da deputada sobre temas polêmicos da Internet, que compartilhado e impulsionado no Facebook, era um dos mais lidos, com 1.000, 1.500, 2.000 curtidas de dezenas de comentários. Vinicius nos alegra com o trabalho voluntário em cursinhos para pessoas mais pobres, na Casa Viva, vinculada ao mandato da vereadora petista Adriana Souza, e no cursinho popular Dom Quixote, da UFMG, onde é adorado como professor; ele, nestes locais, não se apresenta como “filho da Marília”, mas quando os alunos descobrem cresce a admiração por ele, por voluntariamente ajudar as pessoas mais pobres. Vinicius, o que me impressiona, tem umas duas dezenas de amigos e amigas, com os quais mantem vinculações duradouras. Marília, não sendo agora a “mulher que não faz nada”, como nos inicios dos seus primeiros governos; agora temos a Contagem de “antes e depois de Marília”, nos 12 anos de trabalho intensos, o que garante ao Vinicius uma grande acolhida como o “filho da prefeita”. Vale registrar que Marília nunca foi “escrachada” nas ruas da nossa cidade nem em outras cidades vizinhas como Belo Horizonte. Certa vez, no auge do anti-petismo, a professora Regina Helena, da UFMG, esteve em Contagem, caminhou pelas ruas com a Marília e viu, para surpresa dela, a acolhida espetacular da população à nossa prefeita. Tenho com a professora muitas divergências, mas temos um ponto em comum precioso: somos radicalmente contra, temos nojo dos “escrachos políticos”, sejam de direita ou de esquerda.
Marília mudou para melhor a vida dos professores; ela “não fez tudo” o que tem os professores, ela fez “quase tudo”. Não é verdade que tudo o que os trabalhadores tem é fruto somente da luta sindical; as conquistas, quase sempre, avançam mais também nos governos de esquerda, como o de Marília Campos. No caso de Contagem, como explicar que em outros governos, mesmo com lutas, as conquistas foram mínimas? Então o mais correto é afirmar que o que os professores conquistaram é fruto da organização sindical, mas também da decisão política dos governos de esquerda que priorizam a educação, como Marília e Lula. Veja a seguir uma tabela impressionante da enorme concentração das conquistas dos professores nos governos Marília Campos. E só não melhorou mais porque Contagem perdeu R$ 70 milhões com o ICMS Educação; como até 60% desta receita é para despesas de pessoal significa que os servidores deixaram de receber R$ 42 milhões, com o inacreditável silêncio do sindicalismo dos professores.
Marília tem sofrido muitas críticas por ter supostamente negado suas origens sindicais; é muito difícil analisar com os olhares de hoje as grandes lutas sociais das décadas de 1970, 1980, 1990. Sou um dos fundadores da Central Única dos Trabalhadores – CUT e do Partido dos Trabalhadores. Iniciei minha militância em 1975, há 50 anos atrás. Fui militante da oposição bancária, a partir de 1977, que emergiu das bases nos bancos e nosso grito coletivo era: “Sindicato somos nós, nossa força e nossa voz”. Participei da reorganização do sindicalismo combativo, como no caso dos professores; éramos eu, José Prata, Luís Dulci, Rogério Correia, da organização de esquerda MEP – Movimento de Emancipação do Proletariado, que liderou sindicatos de professores de diversos estados, virou, nas nossa brincadeiras, Movimento de Emancipação dos Professores. Eu vi o nascimento da SindUte, liderado pelo Luiz Dulci. Dulci que é ainda hoje um grande admirador da Marília e do meu trabalho. Em inúmeras vezes, em plenárias e grandes reuniões, Dulci sempre dizia que meu livro, “Um retrato do Brasil” foi o melhor livro de análise do primeiro governo Lula. Na convenção que aprovou o nome da Marília para prefeita, em 2024, Dulci, para nossa alegria, marcou presença. Eu, na minha fala, disse que era “muito difícil” não gostar da Marília”. Dulci, na fala dele, me contrariou e disse: “Não é muito difícil gostar da Marília não, é impossível”. A velha guarda do sindicalismo mineiro nos respeita profundamente e isso nos conforta o coração. Algumas pessoas “desafiam as impossibilidades” e não gostam da Marília.
Pois bem, a CUT surgiu em oposição à pelegada; questionando fortemente a judicialização da luta sindical, os dissídios coletivos na Justiça do Trabalho, e nossa alternativa era a mobilização e luta sindical, a negociação e contratação coletiva do trabalho. Nossa maior inspiração era o sindicalismo combativo da Europa, vinculado à social democracia e aos partidos comunistas. Nossa paixão era o sindicalismo de base, sindicato não pode se resumir ao prédio e as diretorias liberadas, sindicalismo, na essência, é a organização de base dos trabalhadores nos locais de trabalho. Uma de nossas maiores referências teóricas era o combativo sindicalismo italiano, que nos influenciou desde o anarcosindicalismo no início do século 20, com a chegada dos imigrantes italianos.(…) Nossa grande referência na fundação da CUT foi o Estatuto dos Trabalhadores da Itália sobre a liberdade sindical, que previa: a) constituição de representação sindical na empresa; b) nulidade de qualquer ato ou pacto discriminatório; c) direito de controlar a aplicação de normas para prevenção de acidentes e doenças profissionais; d) proibição do empregador constituir ou sustentar sindicatos de acomodação ou fantoches; e) direito de realização de assembleias nos locais de trabalho, fora ou durante o horário de trabalho, dentro dos limites de até 10 horas anuais; f) direito de licenças remuneradas ou não para os dirigentes sindicais; g) direito de retenção voluntária das contribuições sindicais; h) disponibilidade de locais nas empresas para as representações sindicais de trabalhadores; i) proteção especial aos dirigentes sindicais no exercício do mandato.(…) Veja só: na Itália, como em grande parte da Europa, sindicalismo, na essência, é organização por local de trabalho, com direitos de locais para a representação de base e liberdade para reunião de assembleias; não se fala em dirigentes liberados permanentemente, mas de cotas de dias anuais nos períodos em que se tem necessidade, como nas campanhas salariais; sindicalismo com contribuição, mas sem imposto sindical; garantias contra demissão imotivada. E mais: no sindicalismo europeu greve é suspensão unilateral do contrato de trabalho, e, para sustentar os grevistas, os sindicatos europeus sempre mantiveram milionários fundos de greve.
O jurista Gino Giugni, que teve grande influência teórica na formação da CUT, afirmou que é a empresa privada é o maior empecilho à liberdade sindical e à contratação coletiva do trabalho. Os neoliberais, coerentes com sua concepção ideológica, consideram que não são as empresas, mas sim o Estado o principal empecilho à negociação coletiva. O que defendem, sinteticamente, é que os trabalhadores troquem a tutela do Estado, que limita a contratação coletiva, pela ditadura do mercado, que seria o espaço privado adequado para a definição das relações de trabalho. Gino Giugni, com base na importante experiência europeia, responsabiliza sobretudo a empresa pela ausência de liberdade sindical: “Do conceito de liberdade sindical, a doutrina tradicional fornece uma construção restritiva quando define como liberdade de construir ou não construir uma associação e como a liberdade de aderir, ou não aderir a ela. Nestes termos a liberdade sindical não é outra que uma especificação da liberdade de associação. Além do mais, tal liberdade é garantida somente em confronto com o Estado, assim, como é próprio de todos os direitos públicos subjetivos. (…) A evolução do direito constitucional, neste campo, conduziu a progressos muito importantes. Uma primeira linha de tendência é a que conduziu a afirmar a eficácia da liberdade sindical também no âmbito das relações entre particulares. O sentido desta doutrina é que o trabalhador, no exercício da liberdade sindical, deve ser tutelado não somente contra as prevaricações ou discriminações por parte do Poder Executivo, mas deve ser tutelado também, e talvez em primeiro lugar, perante o empregador. E de fato resultou evidente, nos países de democracia mais consolidada, que a ameaça real à liberdade sindical, depois do desenvolvimento que o movimento teve no século, provém, sobretudo, dos sujeitos privados, da autoridade privada da empresa. (…) É aqui que, não obstante o respeito formal da liberdade de organização, na prática é freqüentemente impedido o exercício da liberdade apesar de ser a empresa ou o local de trabalho justamente a área em que a intervenção do sindicato é mais natural e necessária” (Gino Guigni, 1988).
Nós, da CUT, fracassamos em nossos objetivos porque não conseguimos implantar o sindicalismo nos locais de trabalho. Como diz o jurista italiano “o local de trabalho é a área em que a intervenção do sindicato é mais natural e necessária”. Fizemos então um sindicalismo livre e autônomo “meia boca”, como se diz. Sem fundos de greves para bancar, de forma autônoma, nossos movimentos; sem contribuições espontâneas expressivas e muito dependente do imposto sindical. Sindicalismo cutista que, com o passar do tempo, virou o prédio e um enorme número de diretores sindicais liderados muito do agrado dos patrões que prefere pagá-los que tê-los organizando os trabalhadores nos locais de trabalho. Chegamos a tal ponto que a punição para dirigente sindical rebelde é o retorno dele o local de trabalho, quando estar no local de trabalho deveria ser uma opção de todos os dirigentes sindicais.(…) Eu voltei ao local de trabalho na agência do Bemge Eldorado, pedi demissão do banco em 1996; abri mão voluntariamente da indenização de um ano, porque eu considerava que aquilo “era a venda do mandato sindical” e seis meses depois da minha saída do banco, o Bemge lançou um PDV – programa de demissão voluntária e eu perdi mais 21 anos de indenização; ou seja, como era 1 salário por ano de serviço perdi R$ 100 mil em valores de hoje. Marília, de forma inusitada, renunciou à presidência do Sindicato em 1996 por discordar dos caminhos que estava tomando o sindicalismo no Brasil. Lutamos muito para resgatar a CUT com seus princípios históricos. Eu estudei mais de 100 livros sobre o sindicalismo no Brasil e no mundo, me tornei um dos maiores especialistas em sindicalismo no Brasil, escrevi o livro “A construção do sindicalismo livre no Brasil”, viajei o Brasil divulgando esta publicação, mas não tivemos êxito no resgate do sindicalismo em que acreditávamos, que gritávamos na década de 1970: “Sindicato somos nós, nossa força e nossa voz”.
Mas veja só: mesmo o sindicalismo “meia boca” que tínhamos era muito mais forte e combativo do que aquele que temos atualmente; claro que atualmente a situação é pior com as profundas mudanças no mercado de trabalho. Tínhamos muitos diretores liberados, mas todos e todas tinham funções com o trabalho de base o ano todo: o sindicato tinha um jornal, sem não me falha a memória, semanal e com 30 mil exemplares, distribuído, majoritariamente, em mutirões três vezes por semana; as filiações sindicais eram feitas sobretudo pela diretoria do sindicato, e havia uma “disputa positiva” para quem filiava mais; Marília, presidenta do Sindicato, sempre liderava com 500 a 600 filiações anuais. Era até uma covardia, enquanto muitos de nós fazia uma abordagem individualizada, Marília chegava em uma agência de banco fazia uma falação e filiava dezenas de pessoas. Quem não cumpria as tarefas era considerado por nós como “candidato a pelego”.(…) E sobre a organização das greves, que é uma polêmica atual com a Marília, é bom dizer que sempre consideramos a greve uma “suspensão unilateral do contrato de trabalho”. Não havia “greve consentida”, “greve negociada”, “greve remunerada” nem em bancos privados nem estatais; a greve era definida de forma autônoma em nossas assembleias e, deflagrada, como não tínhamos fundos de greve como na Europa, incluíamos na pauta de reivindicações o “abono dos dias parados”. Sem a garantia dos dias parados, a lógica era um cronograma bastante simplificado. Não fazíamos greve para realizar assembleias, mesmo os bancários sendo na maioria estudantes, fazíamos assembleias à noite e muitos e muitas falhavam de aulas. Não fazíamos greve setoriais e por banco para realizar assembleias, as assembleias eram noturnas. Não fazíamos greves para os nossos encontros nacionais de final de campanha, onde definíamos por greve ou não; os encontros eram nos finais de semana em geral no Rio ou São Paulo e nossas caravanas seguiam de ônibus na noite de sexta feira e voltavam, em geral no sábado à noite. Nossa data base era 1º de setembro, nosso comando nacional negociava até o último momento e, quando chegávamos a um acordo, o ambiente era de alívio; se tinha greve ela era realizada logo no início do mês de setembro para dar tempo para negociar o abono dos dias parados. E importante: considerávamos como conquistas do sindicatos tudo aquilo que conseguíamos, sendo resultado de greve ou de negociação coletiva sem greves. Uma coisa que não entendo no SindUte de Contagem e em outros sindicatos: por que parar o trabalho para realizar assembleia e prejudicar a vida da comunidade, porque prejudica sim e “a culpa é sempre da Marília”? Por que o Sindicato precisa de tantos diretores liberados, se não tem tarefas cotidianas o ano todo, sendo que o melhor são os diretores organizando os professores no chão das escolas e apenas com cotas de liberação em épocas de campanhas salariais, por exemplo. O companheiro Maurício, diretor do SindUte Contagem, foi nosso companheiro no Sindicato dos Bancários e pode confirmar muitas das informações que coloquei aqui e mesmo fazer correções em outras que eu possa ter falhado em minha memória ou nas minhas interpretações.
“Nada que é humano me é estranho”; esta frase preferida de Karl Marx salvou a minha vida. Este texto reflete muito do que sou e, por isso, peço aos amigos e amigas para falar um pouco de mim. Passei a minha juventude toda chorando “rios de lágrimas”, com a música “Pois é, pra que?”, de Sidney Miller, cantada, de forma dramática, pelo MPB4. É a música mais triste que conheço sobre a condição humana. Sidney Miller estudou economia como eu, mas não concluiu o curso e morreu muito cedo, aos 35 anos. Peço licença aos leitores para publicar todos os versos. Quem já os conhece poderá relembrá-los e quem não conhece poderá se emocionar pela primeira vez. Compôs e também cantou longamente Sidney Miller: “O automóvel corre a lembrança morre / O suor escorre e molha a calçada / A verdade na rua a verdade no povo / A mulher toda nua mas nada de novo / A revolta latente que ninguém vê / E nem sabe se sente pois é pra que(…)O imposto a conta o bazar barato / O relógio aponta o momento exato / Da morte incerta a gravata enforca / O sapato aperta o país exporta / E na minha porta ninguém quer ver / Uma sombra morta pois é pra que(…) Que rapaz é esse que estranho canto / Seu rosto é santo seu canto é tudo / Saiu do nada da dor fingida / Desceu a estrada subiu na vida / A menina aflita ele não quer ver / A guitarra excita pois é pra que(…) A fome a doença o esporte a gincana / A praia compensa o trabalho a semana / O chopp e o cinema o amor que atenua / O tiro no peito o sangue na rua / A fome a doença não sei mais porque / Que noite que lua meu bem pra que(…) O patrão sustenta o café o almoço / O jornal comenta o rapaz tão moço / O calor aumenta a família cresce / O cientista inventa uma flor que parece / Se a razão mais segura pra ninguém saber / De outra flor que tortura (…) No fim do mundo tem um tesouro / Quem foi primeiro carrega o ouro / A vida passa no meu cigarro / Quem tem mais pressa que arranje um carro / Pra andar ligeiro sem ter porque / Sem ter pra onde pois é pra que / Pois é, pra que?”.
“Nada que é humano me é estranho”. Esta frase preferida do filósofo Karl Marx salvou a minha vida. Tinha um enorme “estranhamento” com o mundo e esta frase me fez conhecer melhor o ser humano. Tenho um histórico familiar triste, meu irmão mais velho, Langlebert, tirou a própria vida. O conhecimento das ideias do filósofo Karl Marx, na PUC Minas, me salvou. Quem me trouxe para a vida política e provavelmente salvou minha vida, foi o professor de Sociologia, Carlos Magno, que era militante do PCdoB naquela época e foi mais tarde presidente do Sindicato dos Professores. Eu o contrariei porque, ao invés de entrar para o PCdoB, eu entrei para o PT, que me atraia por ser um partido que surgia de baixo para cima, amplo e de massas. “Nada que é humano me é estranho”. Este pensamento mudou o rumo de minha vida. Sua fonte original é de uma peça de Públio Terêncio, comediógrafo latino do século 2 a.C., mas foi reescrito e popularizado por Karl Marx, que o tinha como a máxima preferida.(…) Mario Sérgio Cortella, em artigo publicado na Folha de S.Paulo, certa vez, ousou contrariar a interpretação de Karl Marx, e afirmou que este pensamento para Marx remetia à sua convicção na ideia da fraternidade e humanidade coletiva. Mas na peça de Terêncio seu sentido era diverso: “muito menos honroso do que aquele propugnado por Marx”.(…) Ou seja, o ser humano com seus grandes defeitos e perversões. Na verdade acho que os dois entendimentos deste pensamento histórico estão corretos: o ser humano é “fraterno e humano”, mas também “defeituoso e perverso”. Bolsonaro, por exemplo, é completamente perverso. Não concordo com a divisão maniqueísta do ser humano, entre “bons e maus”. Ninguém é santo, todo mundo tem algum grau de perversidade, eu inclusive. Veja o caso de esquerda e direita: somos esquerda pelo “conjunto da obra”, mas tem gente muito perversa também na esquerda. Por isso mesmo pessoas trocam de posição ideológica; agora está na moda nas redes sociais a esquerda imitar a extrema direita nos absurdos e vice-versa. Tem “lacradores” e gente que gosta de “escrachos” na direita mas tem também na esquerda. Então é assim o ser humano; e, pensando bem, se fôssemos todos iguais a vida seria uma chatice.
Sou um socialista existencialista, se é que isso existe. Eu reconheço: sou um socialista existencialista e romântico, se é que isto existe. Considero inevitável, mas não gosto da luta de classes e da guerra política. A humanidade paga um preço demasiadamente alto para atingir um novo patamar de civilização. Durante um certo período arrumei uma boa explicação para a luta de classes. No livro “A Mãe”, de Máximo Gorki, um militante de esquerda matou um adversário e a mãe ficou chocada com a atitude do filho. Ele explicou à mãe os objetivos da luta de classes: “É preciso odiar alguns hoje, para que no futuro possamos admirar a todos sem reservas”. Mas isso não acalmou a minha alma existencialista. Como assim? Odiar para se chegar a uma sociedade amorosa? Ódio só vai gerar mais ódio. Por mais dura que seja a disputa política, a esquerda deve se projetar na utopia, na esperança, na tolerância política e na alegria. Por isso mesmo, tenho preferência política por líderes populares que são tolerantes e tenham capacidade de gerar consensos ou maiorias amplas na sociedade, como Lula, Fernando Haddad, Nelson Mandela, Pepe Mujica. Mais perto de nós, ressalto minha mulher Marília Campos e Patrus Ananias. (…) Sou um socialista defensor do Estado Social. Não acredito em soluções supostamente radicais, como as revoluções, porque a humanidade é uma construção histórica e não tem como “marcar uma data”, um dia para se fazer uma “revolução”. A revolução é permanente. Um processo de transformações mais profundas é possível e necessário, mas é fruto de construção de longo prazo, com avanços e retrocessos. Mas também não acho que o capitalismo seja um ponto de chegada da humanidade, como me parece ser a visão da social democracia, que atua muito nos limites do capitalismo reformado. Mas considero que o Estado Social é o que de melhor construiu-se na humanidade, até o momento, em termos de organização da sociedade. Neste sentido gosto da social democracia no que ela define que a melhor forma de avançar a sociedade é pela redução das diferenças, com uma maior inclusão social, e não com a radicalização dos extremos, que acaba, por falta de uma coesão mais ampla da sociedade, frustrando as mudanças, deixando, na maioria da vezes, heranças trágicas de autoritarismo e de atraso econômico e social. E, neste momento histórico, para traduzir uma ideologia socialista para a situação concreta em que estamos vivendo e para se contrapor ao ultraliberalismo, é preciso apresentar como alternativa o Estado Social: emprego e renda, saúde, educação, previdência social, assistência social, cultura, e outros direitos imprescindíveis à vida. É preciso defender, ainda, a democracia social e a soberania nacional.
Os três grandes objetivos de minha vida: amor, justiça social e democracia. Vivo um momento privilegiado nestas três áreas. No amor, sou desesperadamente apaixonado pela Marília. Fiz para ela meu primeiro e único poema:
Te amei no passado: Marília “moça”! / Te amo no presente: Marília “Coroa”! / Te amarei no futuro: Marília “velhinha”! / O que “acalmará minha alma” na velhice é você: Marília! Se tenho “menos medo da morte” é pelo seu amor: Marília! / Minhas “últimas palavras em vida” serão “eu te amo”: Marília! / Meu “último olhar” em vida quero que seja em seus olhos: Marília! / Meu “último suspiro” em vida será de amor por você: Marília! / Eternamente: Marília!!!!!!!!!!!!
Temos três filhos já bastante encaminhados na vida: Natália, que mora em Porto Alegre com o marido e minha neta, Marina; o Pedro, que está de volta para o Brasil, passou no concurso para professor na Universidade Federal de Pernambuco; o Vinicius, que está formando em Geografia na UFMG e por ele eu luto diariamente; a Silvia, minha sogra e grande inspiradora da Marília.(…) Na justiça social, tenho 50 anos de militância, publiquei 1 milhão de exemplares de minhas publicações sobre direitos sociais e me tornei um dos principais especialistas brasileiros na temática previdência social; estou atualizando para o Mandato petista de Miguel Ângelo o meu livreto popular e histórico: o Guia dos Direitos do Povo, que pretendemos lançar até agosto.(…) Na democracia dediquei 10 anos de militância pelo fim da ditadura militar, liderei greves, fui enquadrado na Lei de Segurança Nacional. Para meu espanto, no ano passado, precisei de um “atestado de bons antecedentes”, fui na internet e estava travado por constar lá o meu processo; tive que ir na Justiça Federal dar baixa no processo; o documento confirmou meus “bons antecedentes” na luta contra a ditadura militar. Na luta democrática, ainda, realizamos nosso sonho de unir Contagem em torno da liderança de Marília, construir a Frente Ampla e derrotar a extrema direita e fazer o Brasil olhar para Contagem. Lançamos o livro meu e do Ivanir, com uma ampla reunião com 1.200 pessoas. E cada dia temos uma emoção diferente. Na posse dos conselheiros de vilas, favelas e periferias, a musa de esquerda do urbanismo, Ermínia Maricato, chorou aos prantos e afirmou que Contagem resgata o sonho do petismo das origens, com políticas públicas e participação popular vibrantes e é a melhor experiência de esquerda do Brasil. E Contagem deverá sediar agora no início de abril o lançamento nacional da candidatura de Edinho Silva para a presidência nacional do PT e devemos receber, em breve também, a visita de José Dirceu, nosso líder histórico. E vem muito mais por aí!
Nas mídias sociais da Marília, muitas pessoas marcaram os deputados(as) Beatriz Cerqueira e Rogério Correia nas críticas à prefeita Marília Campos. Vamos remeter também este texto para os dois parlamentares petistas e para o SindUte/MG e PT Minas, não como donos da verdade, mas com a apresentação do contraditório do que está acontecendo em Contagem. Muito se fala no SindUte Contagem na luta da “civilização contra a barbárie”. Quem está sendo civilizado ou bárbaro em Contagem? Esta pergunta precisa ser respondida coletivamente para que possamos enfraquecer e derrotar o nojento e desumano “escracho político”.
José Prata Araújo é economista