“Do Amazonas ao Prata há um nome que parece irradiar por todo o círculo do horizonte num infinito de cintilações: o do filho do emancipador dos escravos, duplicando a glória paterna com a de reintegrador do território nacional” (Rui Barbosa)
José Maria da Silva Paranhos Júnior nasceu no Rio de Janeiro, então capital federal do Brasil. Filho de Visconde do Rio Branco, primeiro-ministro de Dom Pedro II. No dia 20 de abril celebrou-se 180 anos de seu nascimento. Uma data histórica para o país tendo-se em vista o legado profícuo transmitido pelo laureado patrono do Itamaraty.
Juca Paranhos, seu apelido, desfrutou-se demasiadamente da boemia na juventude. Casou-se com a belga Marie Philomène Stevens. Um matrimônio de cinco filhos e um tanto quanto conturbado por questões de toda ordem e que não caberiam expô-las neste momento.
Barão do Rio Branco, como se fez mais conhecido nos vieses oficiais, assim condecorado pela Princesa Isabel, assumiu o Ministério das Relações em 1902- convidado pelo quinto presidente da República, Rodrigues Alves- e solicitou a construção de uma biblioteca no Palácio do Itamaraty, dispondo de mais de 6 mil livros, em sua grande parte provindos de seu acervo particular e constituído majoritariamente de obras raras e de grande valor.
Paranhos debruçava-se em múltiplos papéis e nos livros de sua enorme coleção, geralmente acompanhado de muito tabaco e de latas de marmelada- seus vícios inegociáveis-, e tomava notas e apontamentos- que cabiam até mesmo galhofas e caricaturas de figuras da época- absolutamente extensos; e desorganizados, diga-se; e que demonstrava sua obsessão pelas minúcias e pormenores; perfeccionismo este, aliás, que corroborou decisivamente para sua erudição e conhecimento em torno das diligências acerca das demarcações e fronteiras brasileiras.
Por essas diligências, o chanceler fez-se prócere. Desses casos emblemáticos podemos citar a famigerada “Questão de Palmas”- que nada tem a ver com Tocantins que se criou pela Constituição Cidadã de 88. A Argentina pleiteava territórios que atualmente são parte do oeste do Paraná e Santa Catarina, alegando direito das terras por tratados do século XVIII que consolidavam pela divisão entre Portugal e Espanha. Barão coletou documentos na França e na Espanha e conseguiu reunir evidências e demonstrar por cálculos matemáticos e interpretações historiográficas que aqueles territórios eram brasileiros e que deveriam ser incorporados ao Brasil.
Outro caso imprescindível para as divisórias nacionais foi a “Questão do Amapá”. A França reivindicava a extensão de seus domínios por parte do território do Amapá e alegou que o limite deveria ser para além do rio Oiapoque, sendo este, por assim dizer, um marco da fronteira. José Paranhos elaborou um dossiê e encaminhou o substrato em memorandos para que se dirimisse o quiprocó pela arbitragem. O presidente da Confederação Suíça proferiu sentença favorável ao Brasil que teve a incorporação sacramentada.
Não nos olvidemos das insurreições e revoltas no caso do “Território do Acre” em que a Bolívia arrendou- as terras ocupadas por brasileiros que trabalhavam nos seringais- para uma companhia estadunidense. Desta feita, o patrono da diplomacia brasileira avocou imperiosamente o princípio “uti possidetis” do direito internacional em que os Estados devem manter as fronteiras da maneira que estavam postas antes da independência. Rio Branco tornou-se a capital do Acre não por menos. Substituíra Penápolis que tecia homenagens a Afonso Pena. Uma curiosidade é que o militar Getúlio Vargas se mobilizou para dividir trincheiras pela defesa do território acriano antes do feito diplomático. O gaúcho de São Borja não poderia imaginar sua sina tempos depois em que deixaria a vida para permanecer na história.
José Maria da Silva Paranhos Júnior também entrou para a história e tornou-se herói nacional sendo homenageado por vários estadistas. Incorporou 900 mil km ao território brasileiro. Sem conflitos hostis e sem tampouco derramar uma gota de sangue. Apenas com diplomacia e diálogo. Com astúcia e visão política. Juca Paranhos torna-se inspiração e referência para governantes que prezam pelo esforço do consenso dialético e por contornos democráticos. Barão do Rio Branco é um bálsamo para um mundo que diligencie incansavelmente pelo debate, senso de justiça e, sobretudo, sob o mantra da democracia.
Nada mais urgente para os tempos hodiernos.
Lucas Corrêa Fidelis é advogado e servidor público.