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Marco Antonio Silveira: Mortes no trânsito: o desafio da VISÃO ZERO (Parte 2)

Recentemente abordamos aqui neste espaço a questão do DESAFIO VISÃO ZERO: TRÂNSITO MAIS SEGURO NAS CIDADES BRASILEIRAS, mencionando que Contagem/MG foi uma das 12 cidades brasileiras selecionadas para receber a capacitação de sua equipe técnica para lidar com a questão dos sinistros de trânsito, dentro do programa patrocinado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Essa capacitação está chegando em sua fase final, mas já é possível utilizar os conhecimentos para começar a difundir o aprendizado e as reflexões para o maior número possível de pessoas.

Há muitos aspectos envolvidos para se avaliar as possíveis causas dos sinistros de trânsito, todos relevantes e que merecem ser estudados com detalhes para que possamos buscar soluções para eliminá-los ou pelo menos atenuar seus efeitos. Estudos realizados em diversas cidades do mundo, mostram que, de maneira geral, há três grupos de fatores que contribuem para a ocorrência de sinistros de trânsito:

Fator Humano

Fator Via / Meio Ambiente

Fator Veículo

Quando se analisa as causas de sinistros com vítimas fatais, percebe-se que o Fator Humano aparece como um dos fatores contribuintes em cerca de 95% dos sinistros. Vamos focar nesse artigo sobre os fatores humanos. O que vem a ser os fatores humanos?

Fatores humanos são ações arriscadas do indivíduo no trânsito, quer na condição de condutor do veículo que pode se envolver em um acidente, quer na de pedestre arriscando-se a ser atropelado. Estes comportamentos indevidos acabam, isolados ou juntamente com outros fatores, induzindo à ocorrência do acidente. Desrespeitar o sinal vermelho, dirigir com excesso de velocidade, não sinalizar intenção de manobra, dirigir alcoolizado, fazer uso do celular ao volante, não utilizar o cinto de segurança, atravessar a rua fora da faixa de pedestre, são exemplos de fatores humanos que contribuem para que o acidente aconteça. Normalmente, são erros cometidos pelos usuários da via e, em sua maioria, constituem infrações de trânsito.

Refletindo um pouco sobre o que são os fatores humanos, podemos nos perguntar se em algum momento da nossa vida, seja como pedestre ou condutor de veículo, agimos de forma inadequada no trânsito.
Será que já dirigimos um veículo sem usar o cinto de segurança?

Será que permitimos que passageiros dentro do nosso veículo, seja no banco dianteiro seja no banco traseiro, não usassem o cinto de segurança?

Será que na condição de condutor em algum momento chegamos a avançar o sinal vermelho?

Utilizamos celular quando estamos dirigindo ou quando atravessamos a pé uma rua?

Já infringimos os limites de velocidade regulamentados em algum deslocamento nas vias urbanas ou nas rodovias?
Será que em algum momento de nossa vida chegamos a dirigir um veículo, mesmo após ter ingerido bebida alcoólica ou sob efeito de alguma substância que afeta nossos reflexos?

Difícil encontrar alguém que não tenha se comportado de maneira inadequada no trânsito ou cometido alguma infração em situações como as mencionadas acima.

“Fatores humanos são ações arriscadas do indivíduo no trânsito”. Isso é verdade? Você concorda com essa afirmação? Parece-nos muito claro que essa é uma grande verdade, pois na prática, no dia a dia das nossas vidas, nos arriscamos muito em determinados situações no trânsito, acreditando que estamos imunes aos sinistros de trânsito e que temos pleno domínio de nossa capacidade e que nunca nos envolveremos em situações assim. Esse é um grande engano, que pode nos custar a vida ou a vida das pessoas que amamos.

Alguém já deixou de colocar o cinto de segurança pois “pegou o carro para andar somente dois ou três quarteirões perto de casa” e pensou que neste curto trajeto jamais ocorreria um acidente, pois conhecia bem a região?

Alguém já atravessou a rua desatento ou falando ao celular, ou digitando uma mensagem, pensando: “estou seguro pois estou na faixa de pedestre e a obrigação de parar para eu passar é dos veículos”?

Alguém já dirigiu um veículo ou entrou em um veículo onde o condutor, seguro de si, falou “estou bem, pois bebi somente uma cervejinha”?

Alguém já avançou o sinal vermelho do semáforo dizendo para si mesmo algo do tipo “hoje tá tranquilo, nesse horário o trânsito é pequeno e não tem radar ou agente de trânsito, portanto posso avançar o sinal sem perigo de ser multado”?

E por aí vai…. Poderíamos enumerar várias outras situações em que nos arriscamos no trânsito para demonstrar que nosso comportamento é sim inadequado em diversos momentos de nossa vida.

Dissemos e reafirmamos, como mencionamos em artigo anterior aqui mesmo neste Blog, que há uma crença aqui no Brasil e em quase todo o mundo que a imprudência do motorista e dos pedestres é responsável pela maioria esmagadora dos sinistros de trânsito, crença essa que vem servindo de certa forma para explicar e justificar o grande número de acidentes nas rodovias e vias urbanas em toda parte. Evidentemente que essa é uma crença equivocada, embora saibamos que pode haver sim um componente de imprudência nos sinistros de trânsito.

Pelo que relatamos até agora fica fácil perceber que existe sim um forte componente de imprudência dos motoristas e pedestres no trânsito, fruto dessa crença que “arriscar um pouco no trânsito não tem consequências mais graves”. Os estudos e as estatísticas mostram o contrário, ou seja, arriscar-se no trânsito é um dos fatores que mais contribuem para a ocorrência de sinistros e, portanto, ter um comportamento seguro e consciente certamente é algo imprescindível para reduzir a possibilidade de ocorrência de sinistros.

É claro que não basta um comportamento seguro dos motoristas e pedestres para evitar sinistros de trânsito, pois é preciso que as ações de engenharia e fiscalização sejam mais efetivas e adequadas às necessidades. É preciso que os profissionais que lidam com a mobilidade urbana sejam capacitados e preparados para enfrentar os desafios e propor soluções que tenham foco principal a preservação da vida, pois, relembrando um dos pilares do conceito Visão Zero, “Nenhuma morte no trânsito é aceitável; todas são preveníveis”.

Convido a cada um de vocês para refletir um pouco mais sobre o seu comportamento no trânsito. Como você tem agido? Como você se comporta? Caso você perceba que seu comportamento vem sendo inadequado, eu convido você a buscar uma mudança do seu comportamento e passar a ser um exemplo positivo para sua família, seus amigos e para todos com os quais você convive.

Atitudes simples podem ajudar a mudar a sua visão do trânsito e da sua percepção de que não vale a pena se arriscar!
Quem sabe da próxima vez que você sair com a família ou amigos para uma festa você decida, espontaneamente, a ser o “amigo da vez”, ou seja, aquela pessoa que naquele dia não vai beber aquela cervejinha pois será o motorista que levará todos de volta às suas casas são e salvos!

Quem sabe você não combina com seus familiares, seus colegas de trabalho e com os seus chefes, que não mais responderá mensagens de whatsapp ou vai falar ao celular enquanto estiver dirigindo! Peça a eles a compreensão para que entendam que talvez somente vá retornar suas chamadas ou mensagens alguns minutos depois, quando não mais estiver ao volante.

Há uma célebre frase que diz mais ou menos assim: “O exemplo não é a melhor forma de transformar alguém; é a única”! Seja você o exemplo. Seja você o agente transformador das pessoas, através do seu exemplo comportamental no trânsito. Seja você um “trabalhador sincero em favor da vida”!

Sigamos juntos nessa luta por um trânsito mais seguro e que caminhe na busca incessante de que um dia possamos “zerar as mortes e feridos graves” em nossas ruas, estradas e rodovias.

Marco Antônio Silveira é Engenheiro Civil e especialista em engenharia de tráfego e transportes

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