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Emir Sader: A direita latino-americana está derrotada

Revista Fórum – 26/06/2022

As direitas latino-americanas se esgotaram. Surgiram os governos antineoliberais, que assumiram a luta contra as desigualdades como se objetivo central

A direita latino-americana teve dois momentos de auge nas ultimas décadas. Na primeira, implementou ditaduras militares em alguns dos países mais importantes do continente. Se enfrentou abertamente à democracia, apareceu identificada com a repressão, a violência, a exclusão social.

Foi derrotada com o esgotamento desses regimes, sucedidos pelos processos de transição democrática. A imagem da direita ficou identificada com a ditadura e a ruptura da democracia.

Se valeu das transições truncas, que apenas restabeleceram a democracia liberal, sem democratizar o conjunto da sociedade e sem diminuir as desigualdades sociais e regionais, para conseguir mudar a agenda. Introduziu o tema da inflação e do desequilibro das contas publicas como o central. E, a partir daí, de introduzir as politicas neoliberais.

A direita passou a se identificar com o neoliberalismo, com suas politicas de desqualificação do Estado, de privatizações, de desregulamentação das economias, de abertura do mercado interno, de globalização. Teve êxito na primeira década, enquanto a sociedades havia sido convencida que o problema principal dos países era a inflação.

Quando o pique maior da inflação foi contornado, esses governos se esgotaram, porque não implementaram politicas sociais, não combateram as desigualdades. A própria inflação retornou, porque suas raízes não tinham sido combatidas.

Nesse momento, as direitas latino-americanas se esgotaram. Surgiram os governos antineoliberais, que assumiram a luta contra as desigualdades como se objetivo central. Diante deles, as direitas ficaram desarmadas.

Trataram de concentrar sua luta no combate à corrupção, além da retomada dos ataques ao Estado. Os governos antineoliberais retomaram o crescimento da economia com distribuição de renda, sem com o aumento da inflação.

Para retomar o governo, a direita apelou para o golpe e uma nova ruptura da democracia no Brasil e na Bolívia. Ganhou eleição na Argentina, perdendo logo em seguida, ao demonstrar que não tinha outro projeto que não o já esgotado neoliberalismo.

Viu os governos neoliberais se estenderem para o México, Honduras, Chile, Colômbia, além das perspectiva da sua retomada no Brasil. Se complementa assim uma derrota global da direita praticamente em todo o continente. Nunca os Estados Unidos estiveram tão isolados na América Latina. Restam-lhe países de menos peso no continente, como o Uruguai, o Equador, o Paraguai.

O que restará à direita latino-americana, caso se confirme esse extenso bloco de governos de esquerda ao longo de todo o continente? Caso esses governos logrem retomar o crescimento econômico acompanhado de politicas de distribuição de renda, sem o retorno da inflação. que bandeiras restariam à direita?

Além de permanente tema da corrupção, retoma o tema da inflação – como no caso típico da Argentina -, mas em geral fica neutralizada e derrotada. Não tem politicas sociais no continente mais desigual do mundo. Não consegue mais desqualificar o Estado quando, na crise da pandemia e da guerra da Ucrânia, o Estado foi chamado a implementar medidas de urgência, de combate à recessão, de enfrentamento da fome e da miséria.

A grande derrotada nesta terceira década é a direita latino-americana, seja na sua modalidade de extrema direita – como no caso do Brasil- ou no da direita tradicional – como nos casos da Argentina, do Chile, da Colômbia, do Mexico, da Bolívia.

O futuro da América Latina, assim, está nas mãos da esquerda, dos governos antineoliberais. Da sua capacidade de, integrando os governos progressistas, fortalecer a democracia no continente e implementar politicas não apenas antineoliberais, mas também pós-neoliberais, de superação do neoliberais, depende seu sucesso e a consolidação da derrota das direitas latino-americanas.

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