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Marília Campos e Dalmy Freitas: Fundo de Participação dos Municípios — quem perde e quem ganha

Prefeitos de várias cidades do país reclamam da queda na arrecadação do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Em agosto de 2023, centenas de prefeitos estiveram em Brasília em busca de ajuda da União para compensar a perda. No terceiro trimestre de 2023, a diminuição dos repasses ultrapassou as estimativas pessimistas. Os gestores buscam socorro do governo federal e argumentam que há possibilidade de colapso financeiro.

O FPM é composto pelo Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), e transfere parte das receitas para os municípios. Tem natureza redistributiva, ou seja, sem qualquer relação com o total de impostos arrecadados no próprio município. Por isso, é a principal fonte de receitas da maioria de pequenos municípios, que não conseguem sobreviver com sua própria arrecadação.

Informações na mídia dão conta de que a arrecadação do IRPJ caiu substancialmente em face da queda geral do lucro das empresas e do pagamento elevado de restituições a pessoas físicas. São citadas ainda as desonerações no IPI, como fatores que estariam impactando diretamente na arrecadação.

De fato, nos primeiros meses deste ano os repasses do FPM vinham mantendo alinhamento com 2022. Entretanto, após julho as quedas passaram a ser mais expressivas. Diante disso, o governo federal enviou ao Congresso o Projeto de Lei (PLP 136/2023), que foi aprovado e enviado para sanção, propondo compensar as perdas de arrecadação.

Fato relevante e ainda não divulgado é que uma decisão judicial pode ser a explicação, pelo menos em parte, da queda na arrecadação do IR e consequentemente, da redução dos repasses de FPM. Prolatado pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2021, o acórdão do Recurso Extraordinário com Repercussão Geral 1293453-RS firmou o entendimento de que o IRPJ devido em todos os bens e serviços adquiridos pelos Estados e municípios é passível de retenção e contabilização como receita própria.

Sem efeitos imediatos, a partir do fim de 2022 cada vez mais Estados e municípios passaram a regulamentar as retenções. Em 2023, os principais entes federados do país já se apropriam das receitas a que têm direito. Uma análise dos dados de arrecadação dos maiores municípios demonstra que, embora tenha ocorrido queda no repasse do FPM, houve aumento da arrecadação própria e, em vários casos, o incremento chegou a superar as perdas.

Tal situação certamente decorre das retenções de IRPJ. Considerando que ele representa 90% do FPM, os valores retidos não podem ser desconsiderados na diminuição do FPM, como também devem ser levados em conta na apuração do aumento da receita própria. A comparação da arrecadação de cada município deve ser feita somando FPM e IRPJ retido na fonte.

As retenções, provavelmente, impactaram negativamente a arrecadação da União, sendo responsáveis pela queda no repasse aos demais entes, que podem não possuir grandes valores de retenções ou ainda não se adaptaram ao novo entendimento. Assim, possivelmente os municípios com administrações mais profissionalizadas conseguiram uma receita adicional com as retenções do IRPJ que supera as perdas do FPM. Comparando o período entre julho e setembro de 2023 com o mesmo período de 2022, em Contagem, houve uma queda do FPM de R$ 1,5 milhão e um incremento do IRPJ de R$ 3,9 milhões.

Nesse contexto, entendemos que a compensação das perdas pelo governo federal deve ser feita apenas para os municípios que efetivamente tiveram queda de receitas. O entendimento de que o IRPJ sobre os valores pagos nas compras de bens e serviços pertencem aos municípios de destino está alinhado a importante alteração transitória inserida na reforma tributária, saindo de um sistema “robinhoodiano” para um modelo que promove a justiça fiscal.

Marília Campos é prefeita de Contagem.

Dalmy Freitas de Carvalho é secretário municipal de Fazenda de Contagem.

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